Petrobras perde valor de sua marca

Uma das marcas mais valiosas do mundo, a Petrobras enfrenta mais um grande desafio, talvez o maior de todos em 60 anos de história: uma torrente de acusações de corrupção envolvendo contratos da empresa, no rastro da compra da refinaria no Texas, nos Estados Unidos. Ainda que envolvida no passado em outros imbróglios ligados a má administração e acidentes ecológicos, a Petrobras manteve forte sua marca. Nos últimos cinco anos, a empresa caiu da 12ª para a 120ª posição entre as maiores do mundo. A dívida aumentou e o valor da marca caiu pela metade entre 2010 e 2014.

Em fevereiro deste ano, a empresa aparece na 230ª posição no ranking das 500 mais valiosas do mundo, segundo ranking da Brand Finance, com valor de marca estimado em US$ 5,570 bilhões. Ano passado, ocupava a 150ª posição. Em 2013, a marca de cerveja Corona (AB InBev) ultrapassou a Petrobras no ranking das 50 empresas mais valiosas da América Latina da BrandAnalytics. Antes líder, a Petrobras desceu para a quarta posição e seu valor teve queda de 45%: de US$ 10,6 bilhões na edição anterior para US$ 5,8 bilhões. Na ocasião, a companhia divulgou que a queda estaria ligada à redução do preço das commodities do mercado internacional, mas que a marca permaneceria forte. No mesmo levantamento, no Brasil, a marca Skol (Ambev) ultrapassou a Petrobras entre as mais valiosas.

Em 2013, a Petrobras foi premiada pela Interbrand como uma das cinco marcas mais valiosas do Brasil: ficou na quinta colocação, com valor de marca que ultrapassava R$ 8,7 bilhões. A empresa completou no ano passado 60 anos e mantém-se entre os dez maiores anunciantes brasileiros. Wilson Santarosa, gerente de comunicação institucional da empresa, recebeu em 2013 o Prêmio de Executivo de Anunciante do Ano da ABP (Associação Brasileira de Propaganda).

Dano

Há quem aposte que o dano à marca é pequeno em relação ao tamanho dos problemas que a empresa enfrenta. A professora Kátia Valente, da pós-graduação da ESPM, diz que todas as empresas têm problemas e onde há pessoas sempre há falhas, mas no caso da Petrobras há um distanciamento grande do consumidor final, que – em sua grande maioria – não tem a dimensão e repertório de conhecimento suficientes para desqualificar a marca, mesmo diante dos atuais problemas.

“Difícil prever o que ocorrerá no longo prazo com a marca Petrobras, mas sua vantagem é ter negócios em inúmeros segmentos a ponto das pessoas muitas vezes nem saberem o que ela faz. Seu negócio certamente não preocupa a maioria dos brasileiros”, comenta.

Flávio Ribeiro de Castro, sócio-diretor da FSB, afirma que é prematuro falar de desgaste e queda do valor da marca, pois trata-se de um ícone do Brasil, o que explica o fato raro de uma empresa de petróleo ser considerada a marca mais forte e de maior reputação no país. “A empresa passa por um momento delicado, de grande exposição negativa. Olhando de fora, acredito que o desafio seja demonstrar para a sociedade que está levando as denúncias a sério e tomando as medidas necessárias para investigá-las e corrigir eventuais irregularidades. Agir com transparência e fazer com que a sociedade perceba isso podem fazer a diferença”, afirma Castro.

A Petrobras foi fundada em 1953 por meio de um decreto-lei assinado pelo então presidente Getúlio Vargas. A campanha de 60 anos da empresa, criada pela Heads no ano passado, teve como slogan “Gente. É o que inspira a gente”. Em sua fase inicial, foi estrelada pelos próprios funcionários. Depois, as peças enfocavam histórias inspiradoras de pessoas que fizeram ou fazem parte da trajetória da companhia.

Construção

O designer Bruno Bertani destaca que a construção da marca Petrobras foi incomum e peculiar porque ultrapassou tempos diferentes da sociedade e da política brasileira, e dividiu sua cultura entre uma estatal e uma empresa com papéis na Bolsa de Valores. “É um brand complexo, que ora tem sua imagem em lojas de conveniência, ora nas profundezas do mar, nos combustíveis, nas manchetes políticas e nos últimos tempos nas disputas políticas e em alguns escândalos financeiros. Um único brand com muitas percepções. Para os consumidores, a perda de valor terá uma velocidade menor, mas como em um efeito cascata poderemos ter no médio prazo uma crise de confiança também em seus produtos finais”, acredita.

Para Bertani, ferramentas de comunicação, design, tecnologias e redes sociais podem ajudar a construir marcas, podem até retardar ou minimizar crises por algum tempo, mas não conseguem deixar vivas por muito tempo empresas incapazes de manter ou gerar bons resultados e lucros. “Empresas e marcas se constroem ou perdem valor no dia a dia com sua performance em entregar o prometido, na sua capacidade de encantar sua cadeia de relacionamento: de investidores a consumidores”, conclui.

O publicitário e escritor Adilson Xavier acredita que, embora os brasileiros “tenham um caso de amor com a Petrobras, quando se descobre falhas de caráter em alguém a quem dedicamos nosso afeto, o encanto construído ao longo de 60 anos pode se quebrar”.

“Não se trata de ruptura, mas de ferimento que precisa ser cuidado. Quanto mais persistir a impressão de que a empresa é usada para fins meramente políticos e seu monumental patrimônio está sendo dilapidado, mais difícil será preservar o carinho e o respeito que a marca sempre nos inspirou.”

Odesigner Ricardo Saint Clair lembra que as revelações recentes acerca da Petrobras têm impacto para duas marcas ao mesmo tempo: a da Petrobras e a do país. Mas acredita que há, ainda, mais pontos positivos que negativos no cenário. “Depois de períodos da história brasileira onde se falava inclusive em privatização, a Petrobras conseguiu se firmar no aspiracional de cada brasileiro como uma empresa complexa, com muitos desafios e defeitos, mas acima de tudo fundamental para o futuro estratégico do país, ainda mais depois do pré-sal. A disputa internacional nesse setor é pesada, esse nacionalismo intangível é fundamental para períodos de incertezas como agora, onde deve prevalecer uma visão positiva de que estamos caminhando pra frente, aumentando, ainda que incrementalmente, a transparência, o compromisso e a competência, inspirando funcionários, stakeholders e consumidores a apostar cada vez mais na marca”, conclui.