Pior que Riquelmes em profusão é a pandemia de siglas

Uma das maneiras mais fáceis de descobrir a idade de uma pessoa é pelo nome. Muito especialmente desde que sejam daqueles nomes diferentes que pontificam em determinados momentos, em função de algum acontecimento onde prevaleçam ou destaquem-se personalidades e celebridades, ainda que, repetindo, momentâneas. Dentre as fontes inspiradoras de nomes para gerações e gerações de brasileiros nos últimos 50 anos, novelas da Globo são imbatíveis. Calcula-se que hoje, 20% dos brasileiros, que nasceram nas últimas décadas, tenham nomes de heróis e até vilões das novelas da Globo. No dia 14 de abril de 1974, estreou a novela Gabriela. No dia 31 de dezembro daquele ano Gabriela era o nome de milhares de meninas escolhido por pais e padrinhos. Só perdendo para Maria…

Nomes jamais considerados pelas famílias brasileiras, do dia para a noite, como que por milagre, passaram a batizar milhares de meninos e meninas em todo o país. Claro que tinham a ver com o nome de um personagem marcante da novela das 6, 7 ou 9. O mesmo ocorre com outras atividades que inspiram mães e pais. Na Copinha São Paulo de 2020, que reuniu times de todo o Brasil, uma profusão de Riquelmes. Doze jogadores de times de diferentes cidades com jogadores homenageando o craque argentino em seus nomes. Riquelmes procedentes de Minas, Ceará, São Paulo, Acre, Rio, Goiás, Amapá… Até o craque argentino, jamais, qualquer brasileiro fora batizado com esse nome. Um dos 12 Riquelmes, entrevistado pela Folha, disse sobre a razão da escolha de seu nome: “Quando eu nasci, 2001, o Riquelme estava no auge da carreira dele. E foi o carrasco do Palmeiras. E como meu pai é corintiano…”. Definitivamente “naming” é uma ciência das mais desafiadoras. Pode facilitar tudo na vida de uma pessoa, ou converter-se num tremendo empecilho. Lembro a vocês uma história que já contei de um taxista do ponto em frente ao MadiaMundoMarketing. Tinha um irmão gêmeo. Ao irmão deram o nome de Douglas, e a ele, Orofoncio. O irmão, o Douglas, estudou medicina e hoje é um médico de sucesso. Já o Orofoncio não era chamado pelo nome; e como lembrava fisicamente e muito o negociador de Fernando Collor, que teve um fim trágico, só era chamado de… PC. Morreu dias atrás na penúria. E o que vale para pessoas vale, rigorosamente, e talvez mais, mesmo, para empresas, produtos e serviços. Assim, naming, o primeiro, quando tudo começa, é um dos maiores desafios do branding. Portanto, pelas chagas de Cristo, jamais entregue a alguém da família que tem jeito para a coisa, ou a qualquer engraçadinho, a semente original da única propriedade de sua empresa e produto. Sua denominação. A semente a partir da qual começa a brotar, ou, origina-se a marca.

Desgraçadamente, nos últimos 10 anos, vivemos a mais trágica das pandemias deletérias no território do branding. A Pandemia das Siglas. Marcas legendárias, espetaculares, foram trocadas estúpida e burramente por siglas. A beatificada Beneficência Portuguesa virou BP. A inovadora e legendária Procter & Gamble virou P&G. A Bovespa, mais que consagrada, foi submetida a uma redução patética e virou B3. E a empresa parte da história dos negócios em nosso país, Votorantim, foi diminuída para BV… Mais que socorro, prendam os irresponsáveis… É das missões mais desafiadoras criar-se uma denominação. Poucos conseguem. E, dentre os que conseguiram e se notabilizaram, alguns deles decidiram, em momento de descontrole e loucura, ou entregar seus tesouros a ineptos, ou caíram, desgraçadamente, em tentação. Se existir inferno todos eles têm um encontro marcado mais adiante.

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing
(famadia@madiamm.com.br
)