Por trás

Não, leitor desatento, ainda que você ache que este seu cronista só pensa besteira, e errado você não está de todo, o significado deste título não é o que parece. O significado é outro, quer dizer apenas por dentro. Piorou? Pois é, começa por trás e acaba por dentro. Na verdade, quero lhe contar sobre os bastidores do debate entre os prefeitáveis do Rio de Janeiro na Band. Foi infinitamente mais engraçado do que o que as câmaras mostraram e muito mais revelador da alma dos candidatos. Como vocês sabem, dos 11 candidatos cariocas, somente sete foram convidados para o debate, por critérios que combinavam número de deputados federais eleitos pelos partidos e acertos entre os assessores.

Como tudo que se refere a eleições, nada é muito claro. Para se ter uma ideia, até agora não se chegou à conclusão das obrigatoriedades e proibições das mensagens dos candidatos na TV, o que inclui falta de clareza entre a necessidade de se ter legenda, libras, ou legenda e libras, ou se uma substitui a outra. Também não se sabe se é permitido filmar em prédios de propriedade pública ou não e se nesse critério se incluem praças públicas. Por via das dúvidas, ou melhor, sabendo das dúvidas, alguns candidatos fizeram a propaganda diretamente de dentro de hospitais públicos, já que, se é para correr riscos, que se corra de uma vez. A legislação eleitoral neste quesito é uma pequena amostra de como funciona a maioria das leis no Brasil: tudo é tão confuso que depende da interpretação pontual dos encarregados de vigiar sua obediência. Voltemos ao debate.

A Band alugou o Teatro Casa Grande, no Leblon. A localização obrigou os candidatos mais abastados a gastarem uma boa grana alugando ônibus para transportar as torcidas organizadas, além de fornecer material de zoeira. Além, claro, de lanchinho. De novo, a lei tem de ser driblada nessa hora, pois não se pode dar preguinhas nem oferecer camisetas, consideradas brinde. Mas ninguém pode proibir que alguém pinte por conta própria e por amor uma camiseta branca com o nome do candidato. Daí é uma manifestação espontânea. Deu para entender?

E também apareceram alguns músicos com seus bumbos, pandeiros e cornetas que, tocados furiosa, mas desordenadamente, davam ao local um som delicioso. Daí os chefes de torcida fazem a claque repetir bordões que vão do “não vai ter golpe” ao sensacional “não vai ter jeito, Pedro Paulo é o prefeito”, passando por “ela, ela, ela, prefeito é o Crivella”, e ainda o lamentoso “índioooooooooo” em homenagem ao candidato Índio da Costa. Isso na rua. No debate, foi anunciada a proibição total por parte da plateia de qualquer manifestação, como aplausos e vaias, ao que foi aplaudido, só de sacanagem. Iniciados os trabalhos, depois dos movimentos iniciais, em que o aliado do atual prefeito comparou o Rio a Amsterdã, com alguma coisa de Oslo e a situação econômica de Doha, três candidatos, que participaram do governo, explicaram que se afastaram dele porque tudo isso era mentira, já que daqui a pouco chegaria a conta da Olimpíada e o RJ teria inveja de Porto Príncipe, capital do Haiti.

Em seguida vieram as promessas, que se baseavam em acabar com o monopólio das empresas de ônibus, responsáveis diretos pelo caos urbano. Em mais ou menos meia hora estavam resolvidos todos os problemas da cidade. Sem contar um incremento às artes. Menos Jandira Feghali, que se limitou a dizer que mais uma vez os homens brancos e da elite estavam estuprando uma mulher, a presidenta Dilma. E junto com ela duas outras representantes do gênero feminino: a democracia e a Constituição. Foi a dica para, respeitando o regulamento, o auditório vir abaixo com vivas, morras, foras e não vão ter golpes.

Pouco depois alguém perguntou a Bolsonaro algo sobre um bairro qualquer. Ele olhou para as câmaras, revirou os olhos e disse: “estou tendo uma queda de pressão!” E só não caiu duro porque foi amparado por Osório e Jandira, que é médica. Neste momento sai da plateia o pai dele, Jair Bolsonaro, e expulsa Jandira de perto do filho “sai daí, médica de araque…” e se dirige ao filho: “e aí zero-um, paga uma flexão!” Como se vê, coisa fina.

Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira@grupomesa.com.br)