Pense em ideias fortes e bem bacanas, como A Despedida da Kombi. Pois é, ele está por trás delas. Com mais de 60 Leões em Cannes e mais um monte de outros prêmios, o diretor de criação Marcelo Nogueira, desde 2010 na AlmapBBDO, representa o Brasil no júri de Film Advertising do D&AD 2019, entre 21 e 23 de maio, em Londres. Por e-mail, ele conversou com o PROPMARK sobre mídia e criatividade. Leia a seguir os principais trechos desta entrevista.

BRASIL É FORTE
A publicidade brasileira é de altíssima qualidade, reconhecida no mundo inteiro. E os profissionais brasileiros, mais ainda. Se você parar pra pensar que no meio da América Latina, com todos os seus problemas e limitações financeiras, existe um país com agências que se destacam nas premiações internacionais, é inacreditável. Nosso ponto forte é a criatividade. Temos alguma dificuldade na briga dos filmes, não por falta de talentos, mas porque é duro competir com a grandiosidade das produções americanas e inglesas. Também sinto que às vezes tentamos imitar o que vem sendo feito lá fora, em vez de gerarmos ideias e formatos realmente originais, como fazemos de vez em quando. Talvez seja um bom caminho. Afinal, ninguém consegue ser brasileiro melhor do que a gente.

SUCESSOS INTERNACIONAIS
Vou ser previsível e citar a campanha de Tide. Acho especialmente criativa por partir dos elementos clássicos para criar algo novo e brilhante. Pelo motivo oposto, sou fã da campanha de Skittles, que contratou o David Schwimmer para fazer um filme que só um consumidor viu. Captaram a zoeira da internet e a transformaram numa campanha memorável. Outra vez sendo óbvio, The Talk, da P&G, é espetacular. A produção é cinematográfica, mas você nem percebe, parece que está presenciando a vida real daquelas pessoas. É para citar só três, né? Senão ia falar também do filme dos palhaços, de Audi e o Gene Project, de Marmite.

MADE IN BRAZIL
A campanha das TVs zicadas do Magazine Luiza é uma ideia bem bacana. Divertida, completa em formatos e, além de tudo, diretamente conectada com a venda. Stranger Broadcast, para Netflix, é uma campanha muito legal também, com formato bem diferente e filmes divertidos. Gostei de um comercial que vi outro dia, para a Vivo, em que a mãe com o bebê no colo não atende o celular. Simples e inusitado para uma marca de telefonia.

D&AD
Eu encaro o D&AD como um festival mais “raiz”, com forte DNA criativo e critério extremamente rigoroso. É muito difícil ganhar um Lápis no D&AD, o que acaba valorizando as peças que conseguem passar por essa peneira tão fina. Estar no júri é sentar com um monte de gente talentosa e criativa do mundo inteiro para ver as melhores produções do ano e ainda ter direito a opinião. Como pode não ser bom?

TENDÊNCIAS
Se eu soubesse as tendências do mercado, estaria rico. Mas vejo espaço para peças com qualidade de entretenimento, com histórias envolventes, em vez de apenas vender produtos “a frio”. As pessoas não têm paciência para seis segundos de propaganda na internet, mas gastam o fim de semana inteiro fazendo maratona de séries. Pra mim, tem uma mensagem clara do consumidor aí, que muitos anunciantes já estão entendendo.

TECNOLOGIA
Paradoxalmente, a tecnologia criou muito mais ferramentas para se atingir o consumidor e ao mesmo tempo contribuiu para que isso se tornasse cada vez mais difícil. É muita opção, a gente sabe. Brigamos por uma atenção cada vez mais dispersa. Mas quando você trabalha com clientes que entendem os desafios e apostam nas boas ideias, a mágica é realizada. Aí a interação com o consumidor é muito feliz.

FORMATOS DE FILME
Alguns quadros da Frida Kahlo medem apenas alguns centímetros, enquanto outros do Picasso são gigantescos. Para mim, o tamanho ou duração de uma peça não pode ser desculpa para não se colocar uma grande ideia ali. Sempre cabe. Parafraseando sei lá quem (não lembro, mas não é minha autoria), “nenhum filme ruim é suficientemente curto e nenhum filme bom é suficientemente longo”. Qualquer formato pode ser eficiente, desde que seja bem feito.

PERFIL
Gordo e careca. Fora isso, ainda estou descobrindo… Eu tento respeitar as pessoas, ajudá-las a se desenvolver como profissionais e criar um ambiente em que as ideias possam ir para a frente. Eu me policio para não repetir o que não gostava quando estava do outro lado da mesa e tento reproduzir alguns dos muitos exemplos positivos que vivi. É mais fácil na teoria do que na prática, é claro. De outro ponto de vista, a proximidade com os clientes é um grande aprendizado. O criativo, no dia a dia, tem a tendência de se sentir do lado oposto ao cliente. Quando você vira diretor de criação, logo entende que é muito melhor ter o cliente como parceiro, alguém que realmente pode dar vida a grandes ideias. É como ver Matrix.