Eco Moliterno é chief creative officer da Accenture Interactive para a América Latina e representante brasileiro no júri de Innovation Lions do Festival de Cannes. A própria carreira do profissional segue a lógica da categoria, já que ele protagonizou um fato novo no mercado quando decidiu trocar um cargo de liderança em agência, a Africa, por uma função nova em consultoria. Isso após uma carreira na publicidade com passagens também pela antiga Agência Click (hoje Isobar), Wunderman e Y&R. A inovação de Moliterno também se reflete no trabalho com ilustração, que lhe rendeu até uma capa de Veja. No júri de Innovation, ele espera garimpar o melhor da mistura entre alta tecnologia, simplicidade das boas ideias, olhar vendedor e propósito de marca. A categoria, espera, tem o poder de representar tudo o que Cannes espera ser daqui a alguns anos. Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

Marçal Neto/Divulgação

Inovação
A categoria Innovation, pelo que já deu para ver nos trabalhos de avaliação do júri, tem demonstrado diversas iniciativas amparadas em mobile, realidade virtual e realidade aumentada. Mas, muitas vezes, os melhores cases têm a inovação como solução para algo mais surpreendente, com um viés de simplicidade. Particularmente, gostei de uma ação da Colômbia em que o Google ofereceu número para um lugar onde não há internet, com uso de reconhecimento de voz, e transformação de dados em voz, e vice-versa (campanha é shortlist na categoria, se chama My line powered by Google e foi criada pela MullenLowe SSP3 de Bogotá para o Ministério das Comunicações e Tecnologia da Colômbia).

Simplicidade
Esse case, por exemplo, é uma iniciativa muito inovadora, mas aplicada a um meio de massificação dos mais antigos, que é o telefone. A inovação, às vezes, é um jeito novo de adaptar uma tecnologia em um meio antigo. Não precisa ser tudo inovador, mas algo que reinterprete uma determinada mídia também pode servir muito bem aos propósitos dessa categoria, que é fundamental para o futuro do festival.

Futuro
O Cannes Lions passou por grandes mudanças já, e fica cada vez mais claro que ele precisa ser um lugar em que você vai descobrir os próximos passos da indústria da comunicação. Ter uma premiação com foco em Innovation já é dar um novo passo nesse sentido. Arrisco dizer que, no futuro, o festival tende a virar um evento de inovação, na linha do SXSW. Claro que celebrar o passado e as grandes campanhas é interessante, mas a ideia de poder ir ao evento para mirar o futuro soa muito bem. Como antes não havia internet, Cannes era uma forma de entender o que estava acontecendo no mundo. Era um pouco do papel que os anuários, como a Archive, faziam e fazem. Hoje, no entanto, a internet já permite você ter essa compreensão muito antes, já que os trabalhos estão disponíveis em todos os lugares.

Causas
As marcas estão buscando um propósito, porque há uma nova geração de pessoas que querem entender a razão de existir das marcas. O Airbnb, por exemplo, tem uma razão de existir expressa no Belong Anywhere, e isso se reflete em todo ponto de contato com os consumidores e funcionários. Na nova economia é fundamental as marcas encontrarem seu propósito. O Airbnb e várias marcas novas já nascem com esse sentido e muitas empresas mais tradicionais estão se adaptando a essa realidade. Para um criativo, é muito mais fácil fazer algo em cima de uma verdade genuína da marca, do que focar apenas no comércio.

Meio-termo
O perigo da publicidade é que ela seja focada apenas na venda, um tipo de comunicação que está perdendo a relevância se estiver desconectada de uma causa. Por outro lado, há o perigo de você comunicar apenas uma causa, o que se assemelha mais a um trabalho social, que existe e é importante de ser feito, mas que não pode ser qualificado como publicidade. As marcas e criativos precisam encontrar o meio-termo, porque quando se unem as duas coisas, o trabalho se torna imbatível. A publicidade que, sem esquecer o lado de vendas e de trabalhar o diferencial comercial da marca, explora algo maior relacionado ao DNA e forma de pensar daquela marca, é o que estamos buscando.

Leia mais
“Dizem que Deus está nos detalhes, isso é craft”, diz Alessandra Sadock
“A publicidade no Brasil não é só uma profissão. É uma paixão”, diz Rafael Rizuto