Profissionalização de blocos de rua atrai investimentos de anunciantes

O movimento é recente. Bastaram cinco anos para que um dos principais polos econômicos da América Latina transformasse seu Carnaval de rua em uma das festas mais representativas do Brasil. Mais profissional, organizado e com 100% de seus investimentos feitos por iniciativa privada, a folia em São Paulo chega em 2018 com tamanho recorde. 

Serão 493 blocos que desfilarão pela capital paulista, aumento de 27% em relação a 2017. O número supera os 473 blocos previstos para a capital fluminense, tornando São Paulo o segundo maior Carnaval do país. O patamar tem elevado padrões de toda a cadeia envolvida com o evento, a começar pelos blocos de rua. Nos últimos anos eles se profissionalizaram, criaram áreas de captação de receita, passaram a vender formatos de ativação para a folia e, mais recentemente, criaram projetos que não se esgotam na Quarta-Feira de Cinzas, estendendo o investimento das marcas ao longo do ano.

“As ativações que estão previstas no nosso desfile são tradicionais, como a exposição das marcas nos quatro trios elétricos, sites e redes sociais. Mas temos a vantagem da presença da marca do parceiro ao longo do ano todo, dentro da casa. Isso faz com que a gente transforme uma ativação que seria pontual e momentânea de um desfile, em uma ativação perene”, destaca Alessandra Pereira, cofundadora do bloco Acadêmicos do Baixo Augusta. Fundada em 2009, a Associação Cultural é uma entidade sem fins lucrativos que apoia iniciativas de ocupação gratuita das ruas. Segundo a criativa, a ideia é tornar a cidade um espaço mais humano e democrático. Com essas bandeiras, o bloco leva para a Rua da Consolação o mote É proibido proibir. Entre os patrocinadores estão Amstel, Doritos e Uber.

A estratégia de estender as ativações do Carnaval ao longo do ano também é seguida pelo Casa Comigo. O bloco desfilou pela primeira vez em 2013 e, de lá para cá, se profissionalizou, contratou uma agência para cuidar da comercialização de publicidade e novos negócios, ao mesmo tempo em que viu seu público chegar a 700 mil foliões no ano passado. O bloco tem patrocínio de Amstel, Engov e da marca de vestuário Enfim, e, para atuar na prospecção de patrocínios, a agência Suba foi convocada. O bloco desfilou pela Avenida Faria Lima neste sábado (3) com a presença do humorista Marco Luque, com seu personagem Mustafary, e Ellen Jabour como musa.

Divulgação

Bloco Casa Comigo desfila pela capital paulista desde 2013, e, neste ano, trará como tema central o mote Haters, eu te amo

Segundo Raphael Guedes, fundador do Casa Comigo, eles se tornaram mais profissionais a partir de 2016. Para o produtor cultural, patrocinar um bloco é uma maneira de se relacionar com seu público de forma mais autêntica e verdadeira. “O Carnaval faz sucesso porque há um protagonismo muito grande das pessoas. A galera que vai para rua tem participação ativa, não é passiva como quem vai para o Sambódromo. Na rua a pessoa é o desfile. Isso faz a marca se relacionar de uma forma mais próxima e a interação é maior se comparado a um ambiente em que pessoas são simplesmente expectadoras”.

Alberto Pereira Jr., um dos idealizadores do bloco Domingo Ela Não Vai, concorda com o colega. Criado em novembro de 2015, o bloco que traz sucessos do axé dos anos 1990 triplicou seu público em apenas um ano. Em 2017 levou 150 mil foliões para as ruas. Segundo o jornalista, as pessoas estão tomando consciência de que a cidade é delas e vale a pena ocupá-la. A adesão das marcas vem como consequência. “A profissionalização dos blocos é exigência do público. Com o sucesso e o crescimento dos blocos, precisamos oferecer mais infraestrutura e segurança para nossos foliões. A festa é para eles. A Prefeitura e as marcas também exigem mais profissionalismo e isso é importante”.

Divulgação

Bloco Domingo Ela Não Vai desfilará pela Avenida 23 de Maio no próximo dia 11 de fevereiro; atração levou 150 mil no ano passado

Folia Organizada

Com expectativa de receber quatro milhões de pessoas nos dias 3, 4, 10, 11, 12, 13, 17 e 18 de fevereiro, São Paulo terá seu Carnaval de rua organizado pela Dream Factory, vencedora do chamamento público realizado pela Prefeitura em outubro passado. Estão previstos quase R$ 20 milhões de investimentos, pagos pela Ambev, patrocinadora oficial da folia. Segundo Duda Magalhães, diretor da empresa de eventos, além de cuidar da estrutura da festa, a Dream Factory mantém contato próximo com os representantes dos blocos a fim de garantir segurança aos foliões e apoio para que os próprios blocos se desenvolvam. Pensando nisso, criou este ano o Fundo de Apoio e Fomento aos desfiles, que foi apresentado e discutido com os blocos e associações. A partir de critérios como idade do bloco (tradição), número de foliões e infraestrutura de desfile), e região da cidade onde ocorrem os desfiles foi criada uma “equação” para calcular um percentual de participação para os interessados. “Aprovamos, via Lei Rounet, cerca de R$ 10 milhões para as cidades de Rio e São Paulo, e isso pode beneficiar muitos blocos e bandas a partir de 2019. É uma iniciativa inédita”, ressalta.

Observando uma oportunidade de negócio em ajudar blocos menores a financeirem seus custos, um grupo de entusiastas do Carnaval criou o coletivo Pipoca, em 2013, em São Paulo. A plataforma representa mais de 30 blocos em todo o Brasil. Com patrocínios de Skol (Ambev), Uber, Engov, Governo de Pernambuco e Heineken, a plataforma de ativismo cultural teve receita de R$ 3 milhões em 2017, valor distribuído aos blocos associados. Para este ano, o Pipoca também está à frente da vinda dos blocos cariocas Monobloco e Orquestra Voadora; do pernambucano Bicho Maluco Beleza, de Alceu Valença; além das estreias de Frevo Mulher, da paraibana Elba Ramalho; e Baiana System, da Bahia. “Os blocos recebem mais foliões a cada ano e com isso querem fazer uma entrega cada vez melhor. E as marcas acabam elevando o grau de exigência na entrega. Querem estar associados a uma produção organizada e que agregue positivamente”, avalia Catherini Nakiri, gestora de marcas do coletivo.

Ainda na seara de projetos que viabilizam financeiramente os blocos, a Dimona, no Rio de Janeiro, traz proposta de pagamento de royalties para a comercialização de camisetas oficiais dos blocos. A empresa é fornecedora oficial de camisetas do Cordão do Bola Preta, Sargento Pimenta e Carmelitas, entre outros. Dependendo da negociação e porte de cada bloco, ele recebe de 10% a 15% do valor total (R$ 29,90). “Quando começamos, em 2009, percebemos que várias lojas exploravam produtos de Carnaval com a imagem dos blocos sem nenhum tipo de controle. Não havia retorno pelo recolhimento de royalty. Foi quando procuramos o Bola Preta e desenhamos um projeto de licenciamento. Hoje temos contrato de exclusvidade e lançamos camisetas oficiais deles”, explica Leonardo Zoneschein, diretor comercial da Dimona.

Leia mais 

Jovem morre em poste com câmeras instaladas por empresa de Carnaval de SP

Cinemark faz doação de espaço publicitário para Prefeitura de São Paulo

Pacotes de Carnaval unem diversas plataformas, mas a estrela é a TV