Promoções crescem com cashback e experiências guiadas por dados

Coca-Cola Fan Feat, ação da Bullet feita pelo chatbot do Messenger (Divulgação)

As promoções mais emblemáticas da história de muitas empresas foram realizadas neste ano. A Bauducco fez Família do seu jeito Bauducco, em ação criada pela CP+B Brasil e Bullet com a expectativa de criar o segundo Natal da marca no ano e impactar aproximadamente 115 milhões de pessoas. Já a Nestlé celebrou o seu centenário no Brasil com a distribuição de R$ 100 mil diariamente, no período entre 5 de janeiro e 24 de março, em campanha da DPZ&T considerada a maior iniciativa promocional já realizada pela marca no país.

Mas não é só o prêmio que conta. Tecnologia e experiência também geram engajamento, fidelidade e dados para ações futuras. É o que foi feito pela Batux na Casa Brastemp, mostra virtual montada para apresentar de forma interativa os produtos promocionais da marca. Os usuários que compraram ofertas durante o tour receberam até R$ 1 mil de cashback.

Na era da experiência, awareness com conversão é a meta do marketing promocional, que movimentou R$ 702 milhões em prêmios em 2019, quando foram realizadas mais de 6,3 mil promoções, recorde puxado por uma série de dez anos de expansão. Um ano depois, a pandemia da Covid-19 afetou em cheio o setor, reduzindo o volume para quatro mil ações.

Fernando Figueiredo, da Bullet: experiências únicas (Divulgação)

Pela primeira vez, prêmios em dinheiro (68%) tomaram a dianteira em detrimento de casas (28%) e carros (4%), tendência que explica o avanço do cashback, alavanca para experimentação, desconto sem depender da rede de varejo, prêmios em dinheiro ou valor para recompra. Essa modalidade de premiação ainda impulsiona o formato simplificado “compre e ganhe” sem precisar de autorização, além de facilitar a participação e o recebimento do prêmio digitalmente, evitando consequências logísticas e restrições de praça ou tipo de varejo.

Mesmo assim, os sorteios (76%) ainda são preponderantes, com 87% de influência na escolha da marca. Já o cashback fica com 24% da preferência, interferindo na decisão de compra de 59% das pessoas entrevistadas pela agência de live marketing Casa 96, que um mês antes da pandemia lançou um infográfico analisando os últimos anos promocionais no Brasil e as principais sinalizações. O estudo puxou outro levantamento realizado com mais de dois mil consumidores.

Recompensa em dados
“As tendências foram afetadas, e fomos entender o relacionamento do consumidor com as promoções durante esse período”, explica Denise de Cassia, sócia da Casa 96. “Os processos se tornaram mais digitais, facilitando a aplicação de mecânicas complexas e evitando o gasto exagerado com impressão de cupons”, aponta Alexis Pagliarini, presidente-executivo da Associação de Marketing Promocional/Live Marketing (Ampro).

Tem boa na tampinha usou QR Code para Antarctica em campanha promocional da BFerraz (Divulgação)

Hoje, o interessado pode adquirir o produto e se inscrever na promoção online informando número da nota fiscal, QR code do produto e outros mecanismos digitais empenhados em criar relacionamento, diferencial competitivo, antecipar compras e provocar decisão em frente às prateleiras. “As promos hoje têm visão de captação de dados em first-party data com atuação mais integrada ao digital trade e ao new commerce, que inclui o live commerce e novas jornadas de compra”, confirma Enricco Benetti, CCO & partner da BFerraz, empresa da B&Partners.co, que neste ano completa 21 anos de história.

Tecnologia e praticidade ancoraram a campanha Tem boa na tampinha, realizada pela BFerraz entre julho e novembro de 2021 para a cerveja Antarctica, da Ambev. Bastava abrir a Mini Retornável Antarctica e escanear o QR code na tampinha para ganhar uma “boa” gelada. Na estratégia, impulsionada por captação de first-party data, o usuário precisava cadastrar os seus dados para receber o voucher digital, ver a lista de bares e fazer a troca. A cada dez novas tampinhas escaneadas, era possível liberar outra “boa”.

Promoção também ajuda a vender causas. O insight para a data promo Ajuda Guaraná, feita pela BFerraz em parceria com Just a Little Data e ABlab em 2020, veio da hashtag Ajuda Luciano. As agências convocaram o apresentador Luciano Huck para distribuir milhares de “ajudinhas” em forma de dinheiro.

Equipe da Akm Performma, que nasce da necessidade de experiências potencializadas por dados e performance (Divulgação)

Merchandising na Globo, digital trade e hipersegmentação do target divulgaram a ação, que usou mídia de performance para criar mais de 500 peças digitais com diferentes narrativas. Em Colgate sorrir faz sorrir, a cada produto adquirido, outro era doado para uma das cinco cidades com menor índice de desenvolvimento humano do Brasil. “Colgate voltou a figurar no ranking das dez marcas mais lembradas da Ipsos e muita gente voltou a sorrir com a distribuição dos produtos e das caravanas de tratamento bucal que rodaram o país”, conta Benetti.

Margens roídas
Apesar de sua eficácia e poder de persuasão no ato da compra, a redução de preço custa caro. Oferecer um prêmio atrativo, como um carro, mediante concurso ou sorteio, pode ser mais viável do que praticar um desconto de 20%. “A redução continuada de preços tem o efeito colateral de depreciar a percepção de qualidade do produto”, adverte Pagliarini.

Confundir liquidação com promoção também atrapalha. “Promoção de preço, popularmente conhecida como liquidação, não é comunicação, mas sim um mecanismo comercial de vendas”, diferencia Celio Ashcar Jr., sócio da Aktuellmix, que acaba de adquirir a empresa digital Performma e passa a se chamar Akm Performma.

Enricco Benetti, da BFerraz: first-party data (Divulgação)

Os sócios da antiga operação detêm 80% da nova companhia. O restante está dividido entre os sócios remanescentes da Performma. O comando é dos co-CEOS Eduardo Andrade e Rafael Tadashi, líderes executivos de cada uma das empresas envolvidas na negociação. Eles respondem ao conselho executivo formado por Rodrigo Rivellino, Celio Ashcar Jr. e Mario Medina.

“Comprar o meu produto pagando para o consumidor fazer isso é desespero de causa, e é distorção de estratégia. Pode resolver o momento e estragar o futuro”, sublinha Fernando Figueiredo, CEO da Bullet, que fez 24 ações promocionais em 2019, 16 em 2020 e deve fechar 2021 com quase 30, figurando como uma das maiores autorizadoras do mercado. Entre os trabalhos mais marcantes da agência, estão Tazos, da Elma Chips; iPod no Palito, para Fruttare, da Kibon, que inseriu o prêmio dentro do produto; Coca-Cola Fan Feat, realizado pelo chatbot do Messenger; Conta com a Unilever, em 2020; e Conexão Gatorade, que colocou pin code nas embalagens, aposentando o “envie para caixa postal e concorra”.

Benetti lembra, porém, que o direcionamento por preço, visto como oferta, não deixa de exercer um papel na engrenagem do setor com a criação de combos, fidelização e até a oportunidade de atrair consumidores. “Oferta para estratégia de aquisição digital é matador no mundo dos super apps e serviços de delivery”, contrapõe. A diferença é que a promoção gera argumentos. “Experiências que o dinheiro não pode comprar são catalizadores promocionais”, admite o executivo.

Acampamento da cerveja Beck’s ativou patrocínio ao festival de música eletrônica Tomorrowland, em julho de 2021 (Divulgação)

Em algum lugar do passado
Cupons físicos enviados pelos Correios e sorteados em urnas ficaram mesmo no passado. Da estratégia à execução, a meta é ser “data live marketing”, frisa Ashcar Jr. Um dos exemplos é Hershey Abra a Boca e coma o site, primeira promoção brasileira a ganhar Leão de Prata em Cannes em 2017. Com mecânica digital, a campanha da então Aktuellmix convidava o consumidor a “morder” uma parte do site, que poderia estar premiada. “Hoje, vivemos em um mundo ágil, e temos de estar plugados no desejo e comportamento dos consumidores”, compara Ashcar Jr.

Da BFerraz, vem o exemplo da cerveja Beck’s, da Ambev. Para ativar o patrocínio ao festival de música eletrônica Tomorrowland, em julho de 2021, a agência criou um acampamento para os vencedores de uma promoção, que assistiram à transmissão do festival e DJ sets ao vivo. Influenciadores e conteúdo em real time ainda garantiram uma aura menos promocional e mais orientada a destravar experiências entregues como uma premiação relevante para a audiência da marca.

Concursos, sorteios e vales-brindes também precisam de criatividade. “Promoção que agrega é aquela que educa o consumidor a comprar dando e não tirando. Criatividade, inovação e ineditismo são fundamentais”, crava Figueiredo, da Bullet. Usar creators e influenciadores para reforçar a cultura de uma marca que trabalha promoção como pauta de conversas é outra alternativa. Até a chegada do comando de voz traz possibilidades de engajamento. “Mas a força de uma ação promocional no centro de uma estratégia integrada seguindo a lógica o2o – online to offline – não mudará. É imbatível”, assegura Enricco Benetti, da BFerraz.

Denise de Cassia, da Casa 96: tendências afetadas (Divulgação)

Sorte lançada
Como saber o prêmio que o consumidor almeja ganhar? Alexis Pagliarini admite que não é fácil e depende de se “conhecer os hábitos e interesses do consumidor e estar antenado às tendências para oferecer algo que seja objeto de desejo”, frisa o presidente da Ampro. Cada categoria de produto e grupo de potenciais consumidores têm características próprias. “Deve-se contar com agências especializadas para a criação de tema, mecânica e sugestão de prêmios eficazes”, recomenda.

De acordo com Celio Ashcar Jr., é preciso conversar olho no olho com o consumidor para ir além de desejos que apenas reproduzem as mazelas do Brasil. “Cabe a nós, agências, embalar tudo isso na forma de experiência. Qualquer marca pode dar dinheiro, mas nem todas podem oferecer uma experiência transformadora”, alerta.

Figueiredo lembra que “nem sempre a pessoa verbaliza o que realmente quer”, situação que dá margem para “simplesmente dizer que o consumidor quer dinheiro”, critica ele. Daí tantas ações sem construção de valor. Para ler corretamente os anseios sinalizados pelos consumidores, a Bullet utiliza a ferramenta de planejamento Winnin, que capta dados e insights por meio de vídeos postados nas redes sociais.

Hershey Abra a Boca e coma o site, idealizada pela então Aktuellmix, foi a primeira promoção brasileira a ganhar Leão de Prata em Cannes em 2017 (Divulgação)

“Isso é rico porque nos mostra as entrelinhas”, defende Figueiredo. Estratégias concentradas em prêmios são “o principal erro cometido pela indústria, que usa a promoção como pretexto para veicular”, reclama o CEO da Bullet. A premissa é gerar impacto em diferentes momentos da jornada de compra, mas “não se faz isso sorteando dinheiro”, avisa o executivo. Desejos devem ser transformados em experiências únicas. “Promoções engajam, criam awareness e marcam território. Mas não são o fim e sim o meio”, pontua.

A leitura do contexto é determinante para ir além do trivial, casa, carro e dinheiro. “Depois de tudo o que passamos como humanidade, viagens para lugares próximos e paradisíacos ganham força”, indica Benetti. Peças de ponto de venda mais imersivos e interativos, logística de distribuição coordenada e a migração dos tradicionais brindes para “brand product” se consolidam ao lado de mecânicas, premiações e meios de participação guiados pelos digital rewards, além da força de plataformas de cadastro whitelabel, chats e bots como ferramentas de adesão.

Esse aparato ajuda a formar a percepção de que é fácil ganhar e não depende tanto de sorte. Mas os argumentos de comunicação que envolvem a mecânica e premiações ainda são decisivos. “Sempre faça pesquisa e busque nos dados os itens de maior desejo de sua audiência. Por vezes, uma air fryer pode ter maior valor afetivo que uma Ferrari”, revela Benetti.

Alexis Pagliarini, da Ampro: efeito depreciativo de preços (Divulgação)

Prioridades foram ressignificadas e o conceito de varejo omnichannel também ganhou destaque. “Promoções e shopper marketing são disciplinas que se retroalimentam. Marcas que utilizam a tecnologia e o comportamento do consumidor como drives seguem evoluindo e entregando mais valor, e não apenas produtos e serviços”, destaca Cássio Motta Mello, CEO do Grupo TV1.

A agência criou a promoção Na Boca, Grana na Mão, para Halls, da Mondelēz, que em apenas dois meses conseguiu atingir mais de 60 mil participantes e distribuiu R$ 300 mil em prêmios. Mas já fez também Ilha de Páscoa, para Jeep; e Estar juntos faz bem, da Nestlé. Comemorou ainda os 17 anos da Gol com uma promoção na aba de eventos do Facebook, que rendeu 170 destinos para Miami ou Orlando, nos Estados Unidos com direito a um acompanhante.

Futuro premiado
A evolução dita o otimismo com a retomada. O aumento estimado em volume de prêmios foi de 73% no primeiro semestre de 2021 em comparação ao mesmo período do ano anterior, segundo dados da Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria do Ministério da Economia (Secap). Com mais de 2,2 mil iniciativas autorizadas no período, a expectativa é de encerrar o ano com mais de cinco mil campanhas.

As promoções representam algo em torno de 30% do bolo do live marketing, com um montante de investimento da ordem de R$ 12 bilhões no total. Estima-se que o setor, incluindo eventos, incentivo e trade marketing, além de promoções, movimente mais de R$ 40 bilhões ao ano.

Cássio Motta Mello, do Grupo TV1: promoções e shopper (Divulgação)

Na Bullet, o incentivo ganha força com o Pode Live Shop, que nasce de uma sociedade com Otaviano Costa e RocketBank, e aporte de R$ 800 mil. O projeto une a expertise da Bullet em ativação de marca nos últimos 30 anos com a vivência de Costa na TV e a tecnologia da RocketBank, especializada em agregar conteúdo à logística de vendas.

Produção, entretenimento e engajamento são as promessas da nova plataforma de SaaS (Software as a Service), que tem infraestrutura modular. Pode ser customizada de acordo com o budget do cliente, que paga de acordo com o que o Pode Live Shop for capaz de vender. A Bullet tem ainda o Pode Promo, plataforma que é capaz de criar e executar uma promoção em cinco minutos, passando por mecânica, prêmios, key visual, plano, operação e BI.

A implementação acontece em seis dias. Já o Grupo TV1 firmou uma parceria com o Portal da Promo, que disponibiliza relatórios mensais sobre as promoções mais engajadoras, pesquisas e formulários online em todo o país, permitindo testar conceitos, mecânicas promocionais e prêmios embasados em dados.

Shopper marketing e customer experience guiam um mercado promocional orientado a dados. Mas não adianta levar só conveniência e oportunidade. Storytelling também conta, e vem com o poder de coloca as marcas em um contexto sócio-cultural que extrapola o consumo.