Quais são os desafios que as mulheres ainda enfrentam no mercado de comunicação?

Mulheres da publicidade analisam os desafios da liderança feminina e apontam caminhos para inclusão

A presença feminina no mercado de comunicação tem avançado ao longo dos anos, mas os desafios que as mulheres enfrentam para conquistar e se manter em posições de destaque ainda são muitos. Diferença salarial, barreiras invisíveis para a ascensão na liderança e a sobrecarga de responsabilidades não reconhecidas são apenas alguns dos obstáculos que fazem parte da rotina das profissionais da área.

O último censo realizado pelo Observatório de Diversidade na Propaganda revelou que as mulheres representam 57% do quadro de funcionários das agências. No entanto, apenas 24% ocupam a posição de CEO, enquanto os homens representam 76% nesse posto.

Para entender melhor esse cenário e jogar luz sobre as principais dificuldades que persistem no dia a dia das mulheres na comunicação, o propmark ouviu lideranças femininas, que compartilham suas visões sobre os desafios atuais, a importância da representatividade e as transformações que ainda precisam acontecer para que o mercado seja, de fato, mais igualitário.

Afinal, quais desafios as mulheres ainda enfrentam no mercado de comunicação?

"As mulheres ainda enfrentam desafios significativos no mercado de comunicação, especialmente no acesso a posições de liderança e decisão. Apesar dos avanços recentes, muitas ainda se deparam com barreiras por vezes invisíveis que dificultam sua ascensão. A falta de uma projeção clara de carreira e a perpetuação de estereótipos de gênero reforçam a ideia de que determinadas funções são mais 'adequadas' para elas, limitando seu crescimento. Além disso, a síndrome da impostora leva muitas a duvidarem de sua própria competência, exigindo que se provem constantemente. Para mudar esse cenário, é essencial promover uma cultura que valorize a diversidade, ofereça mentorias inspiradoras e incentive a presença feminina em todas as áreas, garantindo equidade real e oportunidades justas". Flávia Côrtes, COO da DPZ
"Apesar de termos melhorado em representatividade nos últimos anos, tem alguns desafios que ainda estão bem presentes. Como pouca representatividade na liderança quando olhamos para CMO's e CEO’s, diferença salarial e um grande estigma em relação a imagem da mulher como executiva - quando somos mais incisivas sugerem agressividade ou que perdemos a linha facilmente, ou, ainda pior, a "TPM". Homens incisivos são vistos como fortes, poderosos e assertivos. As nuances são muito claras. Na verdade, a maior representatividade só deixa mais visível como o ambiente da comunicação ainda é muito tóxico para as mulheres. As demandas ainda estão desequilibradas, são as mulheres que ficam na posição de assistir, atender, organizar, encarregadas de tarefas invisíveis, como mediação de conflitos e manutenção da cultura organizacional, o que pode sobrecarregar e desviar o foco de funções estratégicas. Muitas vezes falta oportunidade de poder mostrar nossa capacidade para além dessas tarefas impostas historicamente para mulheres. Na GUT, desde o dia um vivemos em um ambiente igualitário, onde todos possuem a mesma voz e não aceitamos menos que isso, a luta da nossa liderança feminina é diária e em prol de que possamos ver todo o mercado evoluir." Alessandra Visintainer, managing director da GUT
"O desafio de "permitir-se". Permitir aceitar ser vulnerável. Permitir não dar conta de tudo. Permitir ser dura e firme sempre que necessário nos momentos desafiadores. Permitir ser acolhedora e emotiva no seu dia a dia profissional". Tatiana Pacheco, COO da Cheil Brasil
"Além da desigualdade salarial e do desequilíbrio entre vida profissional e pessoal, que extrapolam questões de gênero, a Síndrome da Impostora emerge como um fator que pode limitar o potencial da liderança feminina. Muitas de nós lidamos com sentimentos de inadequação e insegurança em relação às nossas habilidades. Se, por um lado, isso nos impulsiona a ter um nível de exigência altíssimo, por outro, afeta a nossa autoconfiança, o que pode limitar o nosso crescimento. É fundamental abordarmos essa questão, promovendo um ambiente que valorize e celebre as nossas conquistas, e incentive o desenvolvimento da autoconfiança". Aline Garcia, diretora-executiva de operações & negócios da LePub São Paulo
"No mercado de comunicação, as mulheres enfrentam desafios que vão além das questões de diversidade e liderança. O grande desafio é criar um ambiente que não se baseie apenas em estatísticas, mas em transformações reais que impactem como nos conectamos com o público e as marcas. Na Magenta, nosso principal desafio tem sido equilibrar o crescimento exponencial ano após ano com a necessidade de uma comunicação autêntica. Trabalhamos com marcas como XP, Cinemark e Ox, e para nos comunicar de maneira eficaz com essas audiências diversas, a presença feminina se torna um diferencial estratégico. As mulheres na Magenta contribuem com perspectivas inovadoras e uma adaptação vital às diferentes realidades dos públicos. A cultura da Magenta é focada em refletir a complexidade e diversidade da sociedade. Para nós, a liderança feminina é crucial para criar uma comunicação genuína e relevante, não apenas representando, mas conectando as marcas de forma estratégica e autêntica. O verdadeiro desafio é transformar o mercado de comunicação e garantir que ele seja reflexo da pluralidade de pessoas e marcas que atendemos". Flavia Altheman, CEO da Magenta
"Quando olho ao meu redor, vejo um cenário muito diferente daquele que encontrei ao iniciar minha trajetória na comunicação, há 22 anos. A presença feminina cresceu e conquistamos espaços antes inacessíveis. Hoje, conseguir uma equiparação salarial e conviver com mulheres e líderes em sua maioria no meu dia a dia é algo que me deixa muito feliz. Mas o caminho ainda está longe de ser completamente igualitário. O equilíbrio entre vida pessoal e profissional, por exemplo, ainda continua sendo um desafio para muitas mulheres. A grande questão não é tentar dividir tudo sozinha, mas sim encontrar pessoas e redes de apoio para que a gente consiga viver nossas múltiplas jornadas sem culpa, cobrança excessiva e equidade. Cada mulher constrói seu próprio caminho, e não há fórmula única para dar conta de tudo. Ainda enfrentamos desafios na ascensão a cargos de liderança e, muitas vezes, uma pressão desproporcional para provar nosso valor. Precisamos continuar discutindo, questionando e promovendo mudanças concretas. Criar um ambiente de trabalho mais justo não é apenas uma pauta feminina — é uma necessidade coletiva". Caroline Swinka, sócia e COO da SoWhat
"Nosso principal desafio é ter um foco claro e manter a coragem, a resiliência e a persistência para chegar lá. Para nós, a carreira demora mais pra escalar, ao contrário dos homens, que tem um histórico maior de carreiras meteóricas. Como a nossa jornada é mais longa, requer muito mais esforço, porque não seremos ouvidas na primeira vez; não seremos vistas na primeira vez; não teremos um lugar à mesa na primeira vez. Tudo é conquistado com muito esforço e, no meio do caminho, muitas de nós acabam ficando para trás. Quando chegamos ao topo, nos sentimos exaustas e ainda com síndrome de impostora, porque olhamos para o lado e vemos um ambiente ainda bem masculino e opressor que nos pressiona além da conta, quase como se tivéssemos que provar todos os dias que merecemos estar ali. O mercado está mudando, mas ainda há muito a fazer. Somente com a união das mulheres conseguiremos seguir nessa jornada de transformação". Ana Sanchez, VP de mídia da Publicis Brasil
"Vejo que evoluímos bastante em questões como a presença de mulheres em áreas antes dominadas pelos homens e a ascensão aos cargos de lideranças. Mas ainda temos que batalhar muito para dar mais visibilidade, peso e importância à nossa voz. O mercado segue em constante evolução, com muitos programas de inclusão e capacitação que não podem se perder pelo caminho e muito menos servir apenas como fachada para uma boa imagem. Sou sócia de uma agência ao lado de dois homens que me respeitam em toda minha integridade, mas sei que não é a realidade da maior parte do mercado publicitário. Questões como assédios, disparidade salarial e falta de presença feminina em cargos ligados à tecnologia são pontos urgentes que precisam ser trabalhados para que todas as mulheres possam ocupar os espaços que quiserem". Clariana Regiani, sócia e COO da Dark Kitchen Creatives
"Ainda estamos todos no mesmo "samba de uma nota só", desde dentro das agências, onde as áreas de criação ainda são dominadas por homens, até em como isso reflete na comunicação e nas campanhas. No início de 2024, as mulheres estavam em 88% das personagens nas propagandas, mas, pasmem, em apenas 3,6% elas eram atletas, em 3,4% eram profissionais de ciência, tecnologia, engenharia e matemática e, em 2,5%, eram donas de negócios; ao passo em que 30% delas estavam na cozinha. É um certo efeito Tostines, né? Trago aqui mais que as minhas dificuldades, uma chamada: que tal quebrar o ciclo, convidar as agências a criarem para empoderar mulheres, dar a elas essa ambição e, com isso, termos mais mulheres na criação, em cargos de liderança, aparecendo da forma devida nos comerciais de margarina? Assim poderemos discutir — nos próximos dias 8 de março — os desafios de um mercado que precisa se reinventar através da IA, ou a vitória com a licença parental universal brasileira". Mayra Cordeiro, CCO da OMZ