Qual é o futuro da propaganda?
Outro dia me convidaram para dar um depoimento sobre como eu vejo o futuro da propaganda, confesso que amarelei. Gosto de fazer essa pergunta aos meus entrevistados publicitários. É um enigma interessantíssimo de conjecturar a respeito, principalmente no Brasil, onde há tantas peculiaridades em torno da profissão, entre oportunidades e limitações.
Curiosa, acabei passando a semana da propaganda – essa homenagem criada pela Fenapro – assistindo às especulações em vídeo enviadas por profissionais à própria entidade e também revendo algumas das respostas dadas pelos meus ilustres entrevistados nos últimos tempos.
O que dificulta qualquer previsão é, naturalmente, o fato de estarmos dentro da nave na qual os ajustes estão sendo feitos em pleno voo. Nela, modelos novos convivem com antigos, radicais convivem com moderados e muitas vezes me parece que sobra para escanteio a verdadeira razão pela qual estamos passando por tudo isso.
O que dificulta qualquer previsão é o fato de estarmos dentro da nave na qual os ajustes estão sendo feitos em pleno voo
Outro dia perguntei a uma diretora da Nissan se ela acha que os modelos elétricos da Nissan tomarão conta, um dia, do portfólio da montadora, eliminando por completo veículos movidos a combustíveis fósseis. A sua resposta foi rápida: isso está nas mãos do consumidor. Ele fará essa escolha.
Sua resposta bateu com o que, no fundo, eu penso a respeito do futuro da propaganda: eu, você e todo mundo, os “consumidores”, as pessoas que consomem, que compram “coisas”, é que vão decidir o futuro da propaganda. A partir daquilo que nos emociona, nos motiva para “comprar” algo – seja um produto, um serviço ou uma ideia, uma filosofia.
Cansamos, cansamos todos, dos modelos tradicionais interruptivos e invasivos da propaganda. É fato. Não é essa entidade etérea, “o consumidor”, que cansou. Somos eu e você. Uma matéria recente com profissionais de mídia de destaque no Ad Age me chamou muita atenção porque perguntava a eles se eles pulavam comerciais ao assistir seus programas. Todos confessaram que sim. E todos se digladiam, diariamente, em suas estratégias, com o fato de que “os consumidores” andam preferindo pular comerciais.
Portanto, os consumidores somos nós e eu diria, quase filosoficamente, que olhar para nós mesmos pode ajudar um bocado a olhar para o mundo ao nosso redor. Mudamos, isso certamente vale para o cara ao nosso lado e para um bocado de gente. Boa parte do planeta. Mudamos porque temos finalmente escolha. Antes, não tínhamos. Havia o sofá. Havia a TV no meio da sala. Havia o momento de sentar e ver um programa. Havia mais tempo? Nem sei, mas não havia muita escolha. Era isso ou um livro, folhear uma revista e ouvir música, ler o jornal, ir pra rua.
Estamos, sempre estivemos e possivelmente sempre estaremos, buscando conteúdo para preencher nossas expectativas e necessidades. Buscamos informações e narrativas de todos os tipos e gêneros. Patricia Weiss, especialista que vem se dedicando a analisar essa nossa bela nave que se transforma em pleno voo, costuma dizer que as pessoas não consomem conteúdo porque ele pertence a uma determinada marca.
Consomem porque ele é interessante, relevante, faz sentido no imenso hall de escolhas que fazemos o tempo todo. Se esse conteúdo for de uma marca e isso causar empatia em quem consumiu, foi feita a conexão nesse admirável mundo novo. Para marcas, sim, ficou mais difícil ganhar a atenção das pessoas.
Mas isso tornou esse negócio – a propaganda – infinitamente mais interessante.
Ao tentar traçar o futuro da propaganda, algumas pessoas ficam nostálgicas, recordam os anos 1960 ou falam das novas plataformas e comentam os budgets limitados, a pressão por resultados e a consequente perda de qualidade e relevância da propaganda. Falam de sustentabilidade, de fazer a diferença no planeta.
Olivetto disse que a grande ideia é o que moveu, move e moverá a propaganda para frente – o que certamente é verdade. Acredito que a Big Idea nasce, hoje mais do que nunca, do olhar cuidadoso para o que leva hoje eu, você e “os consumidores” a se conectarem com as marcas. A grande ideia é o que “dá liga”. Prestar atenção nisso a partir daquilo que uma marca tem de genuíno para comunicar ou oferecer, creio que é o mais próximo que se pode chegar do tão almejado “Oráculo de Delfos da propaganda”.