Recessão compromete desempenho de agências e produtoras

Caudatário da atividade econômica, o negócio da publicidade foi impactado de forma sintomática desde que a recessão passou a comprometer resultados, subtrair vendas e adiar investimentos. A produção de motocicletas teve redução de 33,4% no primeiro semestre de 2016. O comércio encerrou esse período com queda de 8,3% na comparação com o mesmo semestre do ano passado. Veículos e autopeças contabilizaram 17% de perdas. Tecidos, vestuário, calçados e acessórios perderam 13,9%; eletroeletrônicos e informática, 13,3%. Dados da Ancine (Agência Nacional de Cinema) indicam que houve uma redução de 16,5% na produção de filmes comerciais. Foram finalizados 17.114 mil filmes no primeiro semestre deste ano. 

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“Uma queda esperada, diante do agravamento da economia brasileira neste período. Mas ainda é cedo para admitir este decréscimo para o ano. O desempenho do mercado será, de fato, inferior ao ano passado, mas a expectativa é que o Brasil volte timidamente a apresentar números melhores para o segundo semestre. Os clientes precisam voltar a anunciar com mais força para estimular o consumo e as vendas”, atesta Paulo Schmidt, presidente da Apro (Associação Brasileira de Obras Audiovisuais).

Schmidt acrescenta: “É fato que o mercado interno teve diminuição considerável nos filmes institucionais e lançamento de produtos. De qualquer forma, procuramos ter um olhar otimista, já que a publicidade, em momentos de crise, é absolutamente necessária para impulsionar vendas e fundamental para fortalecer as marcas em momentos de aumento de demanda. Por isso, vale dizer que grandes projetos esportivos, como a Olimpíada, nunca chegaram em tão boa hora. Com a alta do dólar, as produções internacionais aumentaram de forma relevante, compensando um pouco do que perdemos no mercado interno. Hoje colhemos os frutos do que plantamos há muitos anos com a plataforma FilmBrazil”.

O presidente da Apro enfatiza, porém, que os prazos de pagamento não estão sendo obedecidos e os atrasos comprometem a saudabilidade das produtoras. “Alguns anunciantes estão sendo mais agressivos nos prazos de pagamento. Isso prejudica muito o negócio das produtoras, que têm de buscar formas para bancar as produções, que, por sua vez, não conseguem transferir para os fornecedores as mesmas condições, em especial na contratação de talentos e profissionais, que vivem destas remunerações. Fora a diminuição de negócios, este certamente foi o principal item que fez com que muitas produtoras redimensionassem suas estruturas e/ou avançassem mais na produção de conteúdo. Prazo de pagamento é um dos temas que vamos tratar do 4º Forum de Produção, que deve ser realizado ainda este ano. Seguindo o exemplo de outros países, a contratação de produção deve trabalhar com recursos adiantados. Esta foi a conclusão da ANA (sigla em inglês para Associação dos Anunciantes Americanos). As produtoras não podem, até pela ausência de capital de giro e créditos, financiar a produção, já que grande parte do seu custo é representada por talentos e profissionais. Filme publicitário é a peça mais importante para os anunciantes que definem os meios eletrônicos e digitais como estratégicos para sua comunicação, portanto ele precisa ser bem cuidado e bem realizado”.

Cobrança

Orlando Marques, presidente da Abap (Associação Brasileira das Agências de Publicidade), afirma que não há um número exato, mas que, nas conversas que mantém com lideranças do segmento, estima-se que o declínio tem variação entre 12% e 16%. “Algumas agências operam com baixa e outras muito abaixo. Na última reunião da Abap, realizada há duas semanas em Fortaleza, a ênfase foi na importância da gestão de custos nas agências, controle e, principalmente, saber cobrar pelos serviços”, destacou Marques.
O executivo Alex Pagliarini, presidente da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda), considera o primeiro semestre como um período de freio de arrumação. “Ouvi de um dono de agência algo que resume o momento: ‘Não podemos desperdiçar uma crise. Enquanto está tudo bem, a gente suporta gordura e até ineficiência. Na crise, tudo deve ser repensado, otimizado’. É o que sentimos, de uma maneira geral, entre agências de todos os portes e de regiões diferentes do Brasil. O mais relevante tem sido o esforço de sobrevivência perante um quadro grave de redução de investimento. Downsizing é a palavra que resume tudo isso. Estamos observando um processo darwiniano: as agências que sobreviverem sairão muito melhor adaptadas para um momento menos desafiador”.

A janela de crescimento pode ser aberta em 2017, o que é um alento para a queda no PIB de 0,3% no primeiro trimestre deste ano. A previsão do relatório Focus do Banco Central é que o índice negativo seja de 3,86% este ano, com chance de zerar em 2017. A nova equipe econômica, liderada pelo ministro Henrique Meirelles, projeta cenários positivos no médio prazo. No recente congresso da Abvcap (Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital), a economista Alessandra Ribeiro, diretora da Tendências Consultoria, explicou que o país “retornou ao radar dos investidores estrangeiros, apesar das incertezas do quadro político”.

Dados da Agência 96 mostram que o marketing promocional tem sido aliado dos anunciantes nesse momento: as ações Compre & Concorra, por exemplo, tiveram adesão de 79% da amostra da pesquisa Promoção em tempos de crise. “Estamos buscando uma comunicação de conteúdo focado na relação entre marcas e pessoas em todos os pontos de contato. Não tivemos decréscimo. Estamos conseguindo transformar dificuldade em oportunidade”, finaliza Célio Ashcar, vice-presidente da Aktuellmix e chairman da Ampro (Associação de Marketing Promocional).

O único setor da comunicação que não sentiu os efeitos da crise econômica foi o que congrega a mídia exterior (veja reportagem na página 44). O retrato de outras regiões, como Sul e Rio de Janeiro, que acreditam em recuperação ainda neste semestre, está nas páginas 40 e 42.