Regionais usam criatividade para engajar ouvintes das comunidades
O rádio é um veículo com a natureza de proximidade e nessa característica reside a força das empresas que se conectam de maneira profunda com os consumidores de mercados locais, em uma relação que busca a cumplicidade através de conteúdo de qualidade e criatividade. No Festival de Cannes deste ano, por exemplo, o único Leão brasileiro em Radio Lions foi para uma ação regional da Rádio 91 Rock, de Curitiba, criada pela Master Comunicação. O prêmio foi fruto de um trabalho de engajamento com o público local desenvolvido há alguns anos.
“O mundo está vivendo esse movimento da regionalização. Não é de hoje que escuto o termo ‘glocal’, que é o pensar global e agir local. Nossos ouvintes querem se ‘ver’ na nossa programação, querem ter acesso ao que tem de melhor na sua região. Consumir local está cada vez mais próximo da nossa realidade, e para vender esses produtos, as rádios regionais são fundamentais, justamente pela sua capacidade de capilaridade”, analisa Aldo Malucelli, diretor-comercial da rádio. “A gente se vale de ser regional para ter maior liberdade na hora de nos expressar. Não estamos amarrados a grandes contratos. E isso, é claro, é um prato cheio para o trabalho criativo. Nos divertimos criando para eles, e o Leão é só uma consequência desse trabalho”, completa Cícero Rohr, diretor de atendimento da Master.
O Leão de bronze da Rádio 91 Rock foi com a peça Every Breath you Take, ação contra a violência doméstica, que usou clássicos do rock para alertar o público sobre relacionamentos abusivos, mostrando dualidade em letras de músicas conhecidas. Embora apenas um spot seja finalista, uma “releitura” do clássico do The Police, a ação teve outras peças como Meu Erro e Don’t Cry. Segundo o serviço “Ligue 180”, que trata de denúncias desse tipo contra as mulheres, houve cerca de 1,3 milhão de casos no Brasil. “Normalmente, nós, da Rádio 91 Rock, trabalhamos com diversas maneiras de engajar nossa audiência.
A começar pelo nosso posicionamento enquanto marca, veiculado em spots na própria rádio, buscando sempre retratar temas relevantes para a nossa audiência”, explica Malucelli. Outra forma de atrair ouvintes para a rádio é com canais proprietários, já que a rádio, que já esteve no dial, agora tem programação apenas na web. “Buscamos sempre estar presentes em tempo real no Facebook, Twitter e site, desenvolvendo ações para aumentar o engajamento da nossa audiência. Promovemos shows de bandas locais que fazem parte de nossa programação e patrocinamos a presença de atrações nacionais e internacionais em nossa cidade também”, explica o executivo.
O caso da Master e da 91 Rock não representa a primeira vez que um mercado regional possibilitou grande criatividade. Em 2010, o Brasil conquistou seu primeiro ouro no Radio Lions, com Dial, ação da Lew’LaraTBWA para a Cultura Inglesa de Ribeirão Preto (SP). Na ação, a programação da Rádio Oi FM tinha suas canções traduzidas simultaneamente no visor de dial do rádio nos carros.
Busca por afiliação
As grandes redes também apostam na força de suas redes afiliadas e notam uma profissionalização do meio nos mercados. “O meio rádio como um todo vive um excelente momento. Frequentemente, emissoras de outras cidades e estados nos procuram para serem afiliadas. Esse é um crescimento natural e favorece muito o mercado”, avalia Juarez Junior, diretor-comercial das rádios Top e Kiss FM. Sua rede tem presença no litoral e interior de São Paulo, abrangendo cidades como Campinas, Santos e Sorocaba. “A estratégia de pensar o rádio como um veículo local é extremamente relevante e efetiva, mesmo para emissoras de alcance nacional. Tanto na Top FM quanto na Kiss, trabalhamos cobrindo e realizando eventos e ações promocionais para praças específicas, além de ter na grade alguns horários com programação direcionada para aquela audiência em especial, tudo pensado de acordo com as características e particularidades daquela localidade”, reforça o executivo.
O segredo para manter esse relacionamento fortalecido é o engajamento com respeito às características locais. Na Top FM, além da programação mais local, a integração com o público é trabalhada em ações diretas com os ouvintes, como pedágios, blitz, shows e eventos, além de relacionamento por meio de plataformas digitais e redes sociais. Um investimento que compensa, de acordo com Junior.
Uma rádio local tem o poder de prestar serviços que vão desde trazer informações sobre a cidade, até conectar amigos e familiares. A Blink102 de Campo Grande (MS) se mantém no dial com a estratégia de abrir espaço para as pessoas da cidade fazerem suas reivindicações e cobranças. “As pessoas enxergam nos apresentadores seus companheiros, que vão amplificar suas demandas locais. Podem contar que sua voz será sempre ouvida, seja para encontrar o seu pet perdido ou seus documentos, amigos e familiares. Graças ao reforço dessa identidade local, aprofundamos a conexão com a audiência da Blink102, que sempre terá respostas ao que quer”, explica Sandra Mara, diretora-comercial da rádio sul-matogrossense.
A profissional explica que a maior força do rádio sempre foi ser local. “Sua maior virtude está na simbiose que cria com os ouvintes das comunidades onde está inserido. O maior bem do rádio, que deve sempre ser preservado por ele, é a cidade onde a antena irradia o seu sinal”, analisa. “A audiência tende a responder positivamente e a se engajar quando percebe que a rádio tem um laço com aquilo que eles julgam mais importante: o cuidado com a cidade e seus habitantes”, explica. A rádio promove campanhas para reciclagem, cuidado com a água, plantio de árvores e recuperação as margens dos córregos assoreados de Campo Grande.
Em Curitiba, a Rádio Banda B tem expectativa de crescimento da força das rádios regionais, através de uma estratégia que une prestação de serviço, jornalismo local, aproximação via canais digitais e o esporte focado nos times locais. A interatividade em programas também é estimulada, bem como ações de filantropia para a sociedade local. “As emissoras que focam em conteúdos próprios e regionais têm mostrando ótimos resultados, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, com número significativo de pessoas que consomem rádio nesses países”, afirma Michel Micheleto, diretor-executivo da rádio. Na trilha do que ele diz, nos Estados Unidos, as rádios atingem 271 milhões de pessoas, sendo que 93% da população do país acessa semanalmente o meio, segundo o estudo Audio Today, da Nielsen, de 2017. Os investimentos publicitários no segmento foram de US$ 17,6 bilhões em 2016.
Já no Brasil, o Atlas da Notícia, projeto do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor) com a agência de dados Volt Data Lab, divulgou em julho de 2018 que 75% da população vive em cidades que possuem, pelo menos, uma rádio ou TV local, o que corresponde a 151 milhões de pessoas. Apenas para comparação, 65% dos brasileiros estão em lugares com ao menos um site ou veículo impresso, demonstrando a força do rádio e TV para atingir as localidades com informações mais relevantes. O instituto, no entanto, faz uma leitura oposta sobre o dado e indica um “deserto de informação” para cerca de 50 milhões de pessoas no país que não têm acesso rádios ou TVs com conteúdo local e, no máximo, ao que é gerado pelas retransmissoras. O que também é uma oportunidade.
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