Saída de Faustão da Globo cria oportunidades para anunciantes
A parceria entre Globo e Faustão já tem data para acabar. Emissora e apresentador anunciaram na última semana que 2021 será o ano derradeiro do Domingão do Faustão. A atração dominical terminará após mais de 30 anos no ar. Ao lado do saudoso Gugu e do ainda ativo Silvio Santos, Faustão é integrante de uma espécie de “santíssima trindade” dos domingos da TV brasileira. O fim de seu programa é também o fim de uma era do audiovisual. Mas o término da atração pode significar oportunidades para o mercado anunciante.
Em comunicado, a Globo chamou Faustão de “um dos maiores comunicadores da televisão brasileira” e afirmou estar determinada a fazer em 2021 “a melhor temporada de todos os tempos do programa”. “Ao longo dos próximos meses, a empresa vai reunir a sua comunidade criativa para definir qual dos projetos em discussão para o domingo é o mais adequado aos desafios de 2022 e a seu compromisso permanente com a inovação”, disse a empresa. O próprio Faustão, com sua irreverência característica, agradeceu a parceria. “Gostaria de deixar aqui registrada a minha gratidão à Globo, onde aprendi muito e com a qual tive a honra de viver nos últimos 32 anos uma parceria de respeito e sucesso. Repito aqui o que sempre disse no ar: a Globo é uma empresa quase perfeita”.
Como numa grande despedida de um jogador de futebol, o ano derradeiro do Domingão vai chamar a atenção da audiência, além de acelerar a digitalização da Globo, forçando a emissora a criar oportunidades para os anunciantes, conforme explica Pedro Curi, coordenador do curso de Cinema e Audiovisual da ESPM Rio. “Temos visto um movimento das marcas de se associarem a pessoas com bastante presença digital. O Faustão representa uma televisão muito tradicional, desse programa de variedades ancorado por uma figura muito forte que, de certa forma, é uma herança que a gente tem do rádio.[…] O Domingão, por mais que seja um programa único, tem muitos quadros internos. Estes quadros eram patrocinados e a Globo vai conseguir fazer isso ainda, talvez trazendo outros apresentadores”, reflete.
Para Curi, a emissora pode explorar nichos diversos usando novos nomes. “Talvez com mais presença digital para tentar renovar também o público da emissora. Acho difícil que o domingo traga algo diferente de um programa familiar, mas talvez algo mais picado, como a gente vê com o É de Casa”, exemplifica. Além disso, o professor também acredita que quadros do Domingão podem ganhar vida própria. “A Dança dos Famosos é um programa independente fora do Brasil”, exemplifica.
Apesar de querido na internet e protagonista de memes (Tá pegando fogo, bicho e a fanfic Fausto Silva e Selena Gomez, por exemplo), Faustão é uma figura analógica. “Repare nas fichas que ele usa. […] Vemos um movimento maior de trazer para a tela pessoas com grande presença digital que já tragam para a Globo um número grande de seguidores também. Tendo a achar que a Globo não vai perder espaço com a saída do Faustão, porque olha o quanto a emissora ganhou de anunciantes com o Big Brother, trazendo mais gente com presença digital. Acredito que não haverá uma perda de anunciantes, mas, sim, uma diversificação e uma abertura de oportunidades”.
Para José Conrado, professor de publicidade e propaganda da Universidade Presbiteriana Mackenzie, não é o fim do Domingão que pode afastar patrocinadores, mas a própria situação da TV aberta. “É um programa que está há muito tempo no ar e tinha cativado uma certa audiência. Mas precisamos considerar o desgaste. São mais de 30 anos. Isso também afasta anunciantes”, reflete. “A Globo pode criar outro programa? Acho que a tendência talvez seja esta, considerando que esta linguagem dos programas dominicais está gasta. As pessoas estão um pouco cansadas disso. A grande questão é renovar este público. Talvez a escolha de um apresentador mais jovem que represente um pouco mais esse mundo contemporâneo pode ser uma alternativa”, avalia.
A boa relação de Faustão com o mercado publicitário também será difícil de substituir. Hugo Rodrigues, CEO da WMcCann, e Luiz Fernando Musa, CEO da Ogilvy, corroboram tal afirmação. “Eu tive o prazer de trabalhar e conhecer o Fausto em uma campanha grande para Chevrolet, em 2007. Se você perguntar para todo mundo que o conhece, provavelmente vai ouvir a mesma coisa: é difícil não se apaixonar por ele, pelo seu lado humano e pelo respeito que tem pelo próximo. O Fausto trata todos, independentemente da posição ou cargo, com muita generosidade, educação e ouvindo com muita atenção. Ele está há 32 anos liderando os domingos e isso prova o quanto sabe se comunicar com a grande maioria dos brasileiros. Se ele decidir fazer qualquer outra coisa, terá um mercado ainda muito grande pela frente”, diz Rodrigues.
Musa relembra que a trajetória de Faustão começou muito antes da Globo, quando ele criou um formato “totalmente inédito e revolucionário do Perdidos na Noite, na Band”. “Na Globo ele teve a oportunidade de ampliar toda a sua irreverência e sacadas inteligentes, com quadros que fazem parte da cultura popular, como Olimpíadas do Faustão e Caminhão do Faustão, por exemplo. É dele o crédito de estabelecer o hábito da audiência de acompanhar uma programação dominical extensa e plural”, relembra.
O CEO da Ogilvy também fala sobre como foi trabalhar com o apresentador. “Faustão é um cara que cria, opina e participa da estratégia do negócio junto com o anunciante. Não existe alguém que tenha um envolvimento tão forte em todos os níveis quanto ele. Tivemos aqui na Ogilvy a oportunidade de trabalharmos juntos em diversas oportunidades. O caso mais emblemático é com Magalu, mas também trabalhamos com Claro e Unilever, além do lançamento da JAC Motors no Brasil”, relembra.
Musa destaca que a despedida de Fausto Silva pode fechar seu histórico na Globo com chave de ouro. “O término do contrato na Globo é uma excelente oportunidade para tornar esse período um ano histórico. É o momento de solidificar esse legado, mostrar para todo mundo a importância dessa história. É um momento particularmente interessante, inclusive, para as marcas, que poderão resgatar quadros e formatos que foram eternizados nos últimos 30 anos. Será um ano de comemoração, não de término. A Globo e todo mercado devem aproveitar o momento para celebrar, reconhecer os talentos que passaram por lá, e as contribuições do programa e do Fausto para a cultura popular”, opina.
Rodrigues relembra outros trabalhos de Faustão ao lado de anunciantes como Nestlé, Unilever e P&G, entre outras gigantes. “São marcas que fazem parte da vida dos brasileiros. Isso comprova que ele vai fazer muita falta se decidir mesmo não continuar fazendo propaganda ou entrar em outro tipo de atividade. Na minha opinião, o poder de comunicação do Fausto é inoxidável para qualquer marca que queira falar com o Brasil. O que fica, além de todo o profissionalismo e a história que ele tem com o mercado publicitário, é que o coração dele consegue ser maior do que o tamanho do Faustão. E isso faz ainda mais diferença para um mundo melhor”, finaliza o CEO da WMcCann.