Senhor unanimidade
No último dia 30 de junho, Gilberto Leifert deixou o comando da estratégica diretoria de relações com o mercado da Rede Globo, à frente do qual estava desde 1988. Nesses quase 30 anos de Globo, Leifert, com seu estilo diplomático, conseguiu tornar-se uma unanimidade junto aos profissionais do mercado da comunicação, do qual ele não se aposenta totalmente, pois continuará a atuar como representante da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e seguirá presidindo o Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária (Conar), no qual exerce seu nono mandato consecutivo.
Paulistano, filho do advogado Valdemar Leifert e de Júlia Leifert, ele começou a trabalhar seguindo a carreira do pai, tendo se formado em direito pela Universidade de São Paulo e atuado como consultor jurídico em diversos bancos da capital paulista. Ainda estudante, trabalhou como estagiário na redação do jornal O Estado de S.Paulo e na Rádio Bandeirantes. Foi quando tomou gosto pela comunicação. Em 1980, convidado por Petrônio Corrêa, tornou-se o primeiro presidente do recém-fundado Conar. Nos cinco anos em que permaneceu no Conar, foi responsável pela revisão do estatuto do Conselho e criou o seu regimento interno. Em seguida, recebeu novo chamado de Petrônio Corrêa, que também era sócio da MPM Propaganda, desta vez para trabalhar na agência. Da MPM, transferiu-se, a convite de Said Farhat, para a Semprel, a primeira agência de relações governamentais do Brasil. Em 1988, trabalhando para a Semprel, acompanhou de perto a instalação da Assembleia Nacional Constituinte e ajudou a viabilizar a emenda que reservava ao Congresso Nacional, com exclusividade, a prerrogativa de legislar sobre propaganda comercial.
No mesmo ano, foi convidado pelo então superintendente-comercial da Rede Globo, Antonio Athayde, para dirigir uma nova área da empresa, a divisão de Relações com o Mercado. Diretamente ligada à superintendência comercial, a divisão se relacionava com as centrais de Marketing, Vendas e Operações Comerciais e tinha como principais atribuições as ações de relações públicas dirigidas ao mercado publicitário, a gestão do Programa Globo de Incentivo às Agências de Publicidade e a tarefa de contribuir para a formulação de um padrão ético para o intervalo comercial da Globo.
À frente da Divisão de Relações com o Mercado, Leifert foi responsável, desde 1988, pelo Prêmio Profissionais do Ano, concedido pela Globo, além da criação e desenvolvimento de ações de relações públicas em eventos como, por exemplo, o Grande Prêmio Brasil de Fórmula 1. Além disso, vale ressaltar que teve a seu cargo a formulação do padrão ético dos intervalos comerciais, o programa de incentivo às agências, o relacionamento com as entidades do mercado publicitário.
Em 1990, passou a representar a Abert no Conselho Superior do Conar e, em 1998, passou a ocupar o cargo de presidente da entidade. Também integrou, de 2005 a 2007, o Conselho de Comunicação Social do Congresso
Quais são os seus planos de agora em diante?
No primeiro momento, pretendo buscar mais equilíbrio entre “ser” e “dever”. Explico: vou tentar me reinventar, fazer coisas que não fazia porque não tinha tempo ou porque achava que não tinha. Mais exercícios físicos, mais leitura e maior atenção a iniciativas da sociedade civil que possam melhorar o país.
O senhor vai se dedicar full time ao Conar?
Não será necessário. O Conar funciona muito bem. O vice-presidente executivo, dr. Edney Narchi, e a secretária-geral, dra. Juliana Albuquerque, são excelentes profissionais. De todo modo, o presidente também tem trabalho: despacha diariamente os processos éticos, responde ofícios de autoridades e instituições, representa a entidade em audiências públicas etc.
O que o senhor destacaria da sua trajetória na Globo?
Tive muita autonomia para conduzir a área de Relações com o Mercado e a boa sorte de trabalhar com Willy, Octávio e Athayde, todos muito competentes e ótimos companheiros. Destaco também o profissionalismo das equipes da Globo e a qualidade da estrutura que as apoia. E não posso deixar de mencionar a admiração que tenho pela família fundadora da organização.
Que mudanças impactantes o senhor acompanhou
na TV nesses anos todos de Globo?
Foram muitas. Destaco a tecnologia: o som e a imagem da televisão no ambiente digital melhoraram muito e ela própria assumiu o papel de plataforma. Essas duas características garantiram o papel gregário que ela sempre teve. Testemunhei também o empenho da organização em ser percebida como isenta, apartidária e livre de preconceitos. E o mercado publicitário foi e é o sustentáculo desse esforço bem-sucedido.
Como o senhor vê o mercado da comunicação hoje?
O mercado está em permanente mutação. A presença de grandes players com atuação planetária dissemina as novas tecnologias com grande velocidade. Diria que a competição tornou-se muito maior e mais difusa, e o sucesso mais efêmero.
O senhor disse em recente entrevista que a ética precisa avançar mais na publicidade, citou o campo político, mas e na área comercial, como o senhor vê essa questão?
Eu me referia especificamente à publicidade na internet. No mais, o sistema misto de legislação e autorregulamentação me parece bastante satisfatório e as normas do Conar Brasil são referência para organismos congêneres estrangeiros. Em 2018, o Código Brasileiro de Autorregulamentação completa 40 anos. Os aprimoramentos introduzidos de tempos em tempos fizeram muito bem à atividade e, inclusive, contribuíram para que menos leis fossem escritas.
Volta e meia aparece alguma proposta de cerceamento da publicidade, como ocorreu com o cigarro. Sabe-se que
a publicidade infantil é das mais visadas, mas quais
outras áreas sofrem mais esse tipo de pressão?
Pode parecer exagero, mas, ao longo das últimas três décadas, foram milhares de projetos de lei. Atualmente, duas centenas deles tramitam no Congresso Nacional, mirando o target criança, além de produtos como alimentos, refrigerantes e medicamentos, dentre outros. Temos a nosso favor a Constituição de 1988: todas as propostas de banimento apresentadas à Assembleia Nacional Constituinte foram rejeitadas pelos legisladores constituintes. Graças à clareza do texto constitucional não vingaram, por exemplo, resoluções da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e do Conanda (Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente) sobre propaganda comercial, tampouco as iniciativas das assembleias estaduais e câmaras municipais, pois a competência para legislar sobre publicidade é exclusiva do Congresso Nacional.
Quem mais pressiona por restrições são setores
da sociedade ou políticos?
Ambos. A sociedade está mais organizada e ativa; os políticos captam as demandas e dão forma a muitas delas. Existe no país a crença de que tudo se resolve por meio de novas leis. O ambiente de internet trouxe mais efervescência às causas suscitadas por grupos de pressão. A intolerância e a virulência que se abrigam na internet me preocupam, e a larga aceitação do anonimato, embora haja vedação a respeito na Constituição Federal. Entendo que não se deve admitir que uma pessoa exerça o direito a expressão, crítica e opinião sem revelar seu nome, mantendo sua identidade protegida por pseudônimo.
Quais são as principais preocupações do Conar atualmente?
Mencionarei duas delas: a primeira é preservar sua essência privatista. O Conar nunca aceitou subsídios dos poderes públicos, não custa nada ao erário e não tem nos quadros dos Conselhos Superior e de Ética agentes públicos e representantes políticos. A segunda preocupação é atuar mais fortemente sobre a publicidade veiculada no ambiente de internet. A falsa ideia de que a internet seria totalmente livre e infensa a regras, inclusive às leis, pode prejudicar a integridade da propaganda comercial. Jornais, revistas, rádio e televisão estão acostumados às regras éticas, à lei de defesa do consumidor, ao dever de separar escrupulosamente o editorial do comercial (“a igreja do estado”). Na internet não é sempre assim. É preciso aumentar a noção de ética e difundir a autorregulamentação. Outra preocupação permanente é não sucumbir ao politicamente correto.
O seu nome sempre é associado ao seu filho, o que o senhor acha desse “cartão de visita”?
Sinto muito orgulho. Tiago começou na TV quando tinha 16 anos; portanto, há mais de 20. Vem construindo uma linda carreira. Deixou sua marca no esporte e agora no entretenimento. Acho que saí ganhando: meu “cartão de visita” é de pai de artista.
Renato Pereira – novo diretor de relacionamento com o mercado da Rede Globo
Qual a sua formação profissional?
Sou graduado em engenharia eletrônica pela PUC e pós-graduado em marketing pela ESPM.
Haverá mudanças na sua gestão?
A área de relações com o mercado continuará pautada pela defesa da ética e do compliance, sempre em linha com as melhores práticas da nossa atividade.
Quais serão os seus principais desafios?
Preservar as conquistas e o padrão de qualidade alcançados ao longo destes anos pela área, acompanhando de perto os movimentos do mercado para alinhá-los às novas demandas e oportunidades.
O Willy disse no comunicado sobre a saída do Leifert que o senhor vai acumular funções, quais?
Nesta nova fase, a área passa contar com uma única diretoria, responsável pelas áreas de relações públicas e institucionais com o mercado publicitário, relações com as agências e o Prêmio Profissionais do Ano.
Como o senhor avalia o mercado hoje?
Vivemos um momento desafiador. O mercado está em constante transformação, o que requer muita criatividade e sensibilidade para lidar com a realidade que se apresenta.
DEPOIMENTOS:
“Perto de completar 30 anos de serviços relevantes prestados à Globo, nosso companheiro Gilberto Leifert resolveu antecipar sua aposentadoria. Ele encerra seu ciclo na empresa movido pelo desejo de diminuir seu ritmo de trabalho e estar mais próximo da família. Todos que conhecem Gilberto sabem que ele não vai parar nunca. De fato, ele não deixará o mercado publicitário e, como representante da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), seguirá presidindo o Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária (Conar), onde atualmente exerce seu nono mandato consecutivo.
Desde 1988, como titular da área de Relações com o Mercado, Gilberto tem sido o responsável pelo relacionamento empresarial com as agências de publicidade, pela formulação do padrão ético dos nossos intervalos comerciais, pelo Prêmio Profissionais do Ano e pelos eventos e ações de relacionamento dirigidos ao mercado publicitário. Ele nos deixa como legado não somente importantes conceitos e princípios que norteiam nossas políticas comerciais, mas também uma equipe madura e preparada para dar continuidade ao seu trabalho.
Renato Thomaz Pereira, que iniciou na Comercialização da Globo na década de 1990, passará a liderar a área, acumulando suas atuais atribuições com este novo desafio. Ele atua na área de Relações com o Mercado desde 2011.
Ao Gilberto, temos muito a agradecer pela imensa contribuição dedicada não somente à Globo, mas a todo o mercado publicitário e desejamos que seja muito feliz nesta nova etapa de sua vida.
Ao Renato, que passa a se reportar diretamente a mim, desejo muita sorte diante dos desafios requeridos pelo mercado, com a certeza de que nosso relacionamento com entidades e parceiros continuará a ser conduzido com habilidade e competência.”
Willy Haas – Rede Globo
“O Leifert ocupou um posto fundamental para a propaganda brasileira e com seu empenho e eficiência ajudou a formar um dos mercados mais desenvolvidos do mundo. E o tempo nos mostrou que, todo tempo que estava brigando com a gente, ele estava, na verdade, brigando pela gente.”
Nizan Guanaes – Grupo ABC
“A história de Gilberto Leifert se confunde com a história da propaganda brasileira. Poucos fizeram tanto pela profissionalização do mercado brasileiro de comunicação e marketing. Leifert é um dos gigantes da nossa publicidade.”
Mario D’Andrea – Abap e Dentsu
“Gilberto Leifert nesses anos todos tem sido um dos grandes responsáveis pela prosperidade da publicidade brasileira. E uma prova de que é possível ser um grande homem de negócios sem deixar de ser um gentleman.”
Washington Olivetto – WMcCann
“São muitas as lições que o Gilberto nos deixa. Entre elas, a que eu mais vou guardar, é sua contribuição absolutamente voluntária e sem medir esforços para a construção e desenvolvimento do nosso mercado. Anunciantes, agências, veículos e produtoras, toda a cadeia de negócios, possuem relevância e força hoje como uma das maiores indústrias do mundo graças a líderes como o Gilberto! Muito obrigado.”
Marcio Oliveira – Lew’LaraTBWA
“Gilberto Leifert é um dos grandes guardiões da propaganda brasileira. Sempre cultivou a proximidade com os nossos problemas, criou e manteve iniciativas que contribuem para deixar de pé o nosso negócio.”
Fernando Barros – Grupo PPG
“O Gilberto Leifert é um daqueles profissionais que precisamos ler sua biografia inúmeras vezes, para nos inspirarmos e espelharmos pelo profissionalismo, ética e transparência com que sempre conduziu os negócios que esteve à frente. O Brasil precisa de mais ‘Gilbertos’, urgente!”
Marcio Toscani – Leo Burnett Tailor Made
“Tive o privilegio de conviver com Gilberto Leifert nos últimos 27 anos. Aprendi muito com ele, principalmente na minha atuação nas diretorias da Abap e do Cenp. Ele sempre defendeu com veemência a autorregulação voluntária com a parceria equilibrada entre agências, veículos e anunciantes. Ele criou o Premio Profissionais do Ano, incentivando a meritocracia e a criatividade. Defensor incansável da publicidade, Gilberto vem presidindo o Conar, na defesa da ética nas mensagens, respeitando os consumidores e coibindo abusos. Com muita contundência e integridade, mas sem nunca perder a leveza e o bom humor, Gilberto reúne conhecimento jurídico, institucional e do mercado que foram fundamentais para o crescimento da nossa indústria da comunicação. Que ele continue conosco, acreditando que a livre iniciativa e a competitividade são o melhor caminho para as agências construírem e posicionarem marcas de produtos e serviços, que geram riquezas, empregos e impostos.”
Luiz Lara – Lew’LaraTBWA
“Gilberto Leifert foi importantíssimo na comunicação entre o mercado e a Rede Globo. Graças a ele todas as agências puderam realizar grandes trabalhos e com enorme audiência. Tenho certeza que ele deixa o cargo com a satisfação do dever cumprido e, fora da Globo, continuará a ser um grande incentivador e colaborador da publicidade brasileira.”
Luiz Sanches – AlmapBBDO
“Quando sento para conversar com Gilberto, sinto que estou falando com um monge cheio de sabedoria e ensinamentos. Gilberto é parceiro, sabe ouvir e aconselhar com carinho quando a gente precisa. Sua historia na Rede Globo é de intensa defesa do mercado publicitário assim como no Conar. Não existe ninguém no mercado que não o admire e respeite. Ele exerceu sua tarefa na Globo com perfeição.”
Sergio Amado – Ogilvy
“Ser um executivo líder em empresa de destaque é, por si só, um desafio muito grande. E fazer isso enquanto se dedica ao fomento da qualidade e defesa da seriedade de todo o mercado é algo que poucos conseguiriam. Gilberto faz isso com o empenho e a convicção de quem realmente acredita no que faz e por isso construiu um legado que vai seguir por todo o futuro da nossa indústria.”
Paulo Zoéga – Zoégas
Comunicação
“O Gilberto deixa na Globo o bom exemplo de como a decência pessoal exercida por gente competente, e de educação refinada, serve de padrão num mercado que precisa ser de entendimento e concórdia. Espero que a publicidade continue contando com ele fora da relação do dia a dia do trabalho, para enriquecimento do que temos de melhor, que são os organismos de autorregulação.”
Caio Barsotti – Cenp
“Gilberto trabalhou arduamente para a profissionalização do nosso mercado. Deixa um grande legado por ter participado do Conar desde o seu início. Com grande capacidade de articulação, ele costurou acordos, mediou conflitos e ajudou o mercado a caminhar com as próprias pernas. À frente da Globo, maior veículo do país, teve papel fundamental para construir o profissionalismo e a qualidade da propaganda brasileira. Tudo isso acompanhado de uma ‘faixa bônus’: por trás de posicionamentos importantes e firmes sempre, uma pessoa descontraída com um maravilhoso senso de humor.”
Aurélio Lopes – FCB Brasil
“Gilberto era um dos símbolos da Globo e ainda é um dos maiores nomes da nossa indústria. Ele batalhou muito e foi um dos principais responsáveis pela profissionalização e crescimento desse mercado ao longo das últimas décadas. Sempre foi um mestre no relacionamento com as agências. Desejo toda a sorte e muito sucesso para ele no novo caminho que escolher seguir.”
Claudio Loureiro – Grupo Heads
“O Gilberto deixa um grande legado que ajudou a pavimentar a trajetória da indústria da comunicação no Brasil. Também foi e continua sendo fundamental o seu papel na consolidação e relevância do Conar. Desejo a ele toda a sorte do mundo nessa nova etapa de sua jornada.”
Ezra Geld – J. Walter Thompson
“Conviver com o Gilberto Leifert foi um dos maiores benefícios de ter me tornado presidente da Fenapro. Descobri uma pessoa com conhecimento gigantesco sobre tudo o que envolve nosso negócio, além de ser gentil, seríssimo e, para sorte de todos nós, um gigante na defesa do modelo vencedor da propaganda brasileira. Somente com este convívio pude descobrir o quanto devemos a ele pelo altíssimo padrão internacional da nossa atividade. Estar com ele é sempre um prazer e uma oportunidade de sair engrandecido.”
Glaucio Binder – Fenapro
“Quando conheci o Gilberto ele já era uma lenda. Na primeira conversa pessoal com ele, reconheci que o rótulo não era apenas uma simples e respeitosa reverência do mercado aos anos de trabalho, mas um fato inequívoco. De uma hora de conversa planejada, ficamos três seguidas de almoço. Falamos de tudo: economia, Cenp, política, psicanálise e, claro, sobre nossos negócios. Durante o papo, tive um par de epifanias sobre o mercado e sobre meu negócio. Se fosse somente por aquele dia, já seria grato a ele.”
Ulisses Zamboni – Santa Clara