Sleeping Giants: Um olhar prático sobre a compra de mídia
O final de Maio de 2020 poderá ser lembrado como o período em que as Fake News ganharam um adversário de peso no Brasil. O movimento Sleeping Giants que se iniciou nos Estados Unidos e vem atuando desde 2016 tem como proposta verificar a autenticidade conteúdos divulgados em páginas da internet e alertar as marcas que são identificadas anunciando nestes veículos “fraudulentos”. O principal alvo do grupo são sites propagadores de conteúdo inverídico ou contendo discurso de ódio.Por ter finalmente chegado ao Brasil e virado alvo de diversas matérias em grandes veículos, o grupo Sleeping Giants atingiu seu objetivo por terras tupiniquins ao gerar repercussão entre os consumidores. Ao ver uma marca sendo mencionada no Twitter pelo perfil do Sleeping Giants, há grande movimentação de parte dos seguidores da marca para que algo seja feito e logo as equipes de marketing e agências são acionadas em tom de urgência para tomar as devidas providências. Esse é o grande poder do movimento, o uso da pressão popular para combater o financiamento às fake news.
Honestamente, não acredito haver má fé por parte das marcas e agências.
Todo o ecossistema de marketing online foi cada vez mais se complexificando, até que soluções tecnológicas robustas tivessem que entrar em cena para unir a quantidade massiva de marcas querendo anunciar e produtores de conteúdo querendo viabilizar-se economicamente. Essas soluções incluem plataformas do Google, Facebook, LinkedIn, Amazon, etc… Em alguns casos estamos falando de um espaço proprietário, como no caso do próprio Facebook e LinkedIn que garantem um pouco mais de controle. Em outros porém, estamos falando de plataformas que permitem que inúmeros produtores de conteúdo utilizem sua tecnologia para de conectar a milhares de anunciantes.
Para falarmos de escala, umas das formas mais comuns de compra é via mídia programática. Resumidamente, é qualquer plataforma que permita uma compra de publicidade de forma automatizável, com uso de inteligência para segmentação e utilizando uma compra em tempo real (milissegundos para decidir a compra). Somado a esses fatores, podemos considerar a veiculação em diversos formatos (vídeo, áudio e banners) e em diversos ambientes. É de fato louvável que tenhamos chegado a este nível tecnológico, em que se consiga ter uma cadeia tão longa de informações sendo trocadas e decisões sendo tomadas em milissegundos beneficiando marcas (que conseguem mostrar o que tem a oferecer de maneira mais eficiente) e produtores de conteúdo (que conseguiram se diversificar e financiar).
Utilizando dados de uma das mais conhecidas plataformas de mídia programática pude verificar que nos últimos 30 dias (quando fiz a pesquisa) estavam disponíveis mais de 200 mil sites e aplicativos para veiculação de publicidade no Brasil. Diante de tal situação, qual o melhor caminho a se seguir? Queremos veicular em um pequeno número de portais para garantir a segurança? Não estaremos matando produtores de conteúdo menores? Conteúdos com melhor curadoria, mas voltadas para um nicho não ficariam em maus lençóis?
Trabalhando diretamente com compra de publicidade, fiz um exercício bem extenuante para decidir qual seria nosso posicionamento diante deste cenário. O caminho foi gerar diversos relatórios e realmente olhar site a site e aplicativo a aplicativo qual era o conteúdo em que estávamos veiculando ou que estavam disponíveis. Neste percurso, acabei tendo diversas surpresas. Pensando que no final valeria veicular em apenas uma centena de sites, acabei percebendo que para abarcar toda a diversidade de interesses e necessidades humanas, precisamos realmente de muitos produtores de conteúdo. Alguns dos sites que mais gosto apareciam entre os que investimos muito pouco e provavelmente seriam cortados se tomássemos uma decisão muito rigorosa. Na minha concepção, se temos um sistema que se utilize de publicidade desta forma, ele deve ter a responsabilidade de financiar a informação de maneira agnóstica como contrapartida.
E por sinal, mais um insight foi retirado nesta análise. Além das Fake News, encontrei sites de conteúdo suspeito, com péssima experiência de usuário, que não respeitam o mínimo dos padrões internacionais de publicidade online, com volume de tráfego suspeito, entre outros. E estes sim devem ser bloqueados a qualquer custo. O problema é maior ainda se olharmos sob essa perspectiva. Muito desta análise necessita de um feeling humano que uma máquina dificilmente consegue ter. Não estou isentando aqui as plataformas, que deveriam aumentar o nível de verificação.
Minha defesa aos pequenos, por outro lado veio ao analisar a diversidade de conteúdos sendo produzidos. Aqui dou de exemplo sites especializados em notícias locais, esportes menos populares, blogs de opinião, sites de culinária, beleza, vida saudável, plataformas voltadas para aprendizado e colaboração de usuários, sites informativos sobre como fazer imposto de renda, pedir auxílio emergencial, abrir uma empresa, câmeras ao vivo mostrando como está o tempo no litoral, entre outros. Podemos observar que a imaginação é o limite.
O ideal seria grandes plataformas de mídia desenvolverem algoritmos mais robustos especializados na verificação de conteúdo, para barrar veículos que se enquadram em qualquer categoria mal-intencionada citada anteriormente. Por ora, uma possível solução seria realmente olhar no detalhe quais são os locais em que estamos comprando publicidade e ir criando listas personalizadas de parceiros para veiculação. E quando digo olhar no detalhe, é ir além dos sites e apps de maior volume e analisar seu conteúdo. Outro caminho seria trabalhar com listas de negativação muito mais extensas do que geralmente usamos. Desta forma, falamos com o usuário em momentos distintos (afinal o momento de ler uma notícia é diferente do momento de aprendizado) e ao lado de conteúdos mais específicos. De bônus, conseguimos contribuir para a diversidade de informação.
Vitor Imamura, nosso team lead da MightyHive