Sobre a reputação da CBF e os riscos para seus patrocinadores

Alguma coisa está fora da ordem. Infelizmente, no espaço de uma semana, a CBF entidade máxima do futebol no Brasil está ao mesmo tempo presente no noticiário político, esportivo e na coluna policial. A Confederação, empresa privada fundada em 1979 em função do desmembramento das responsabilidades da antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD) é responsável pela organização dos campeonatos de futebol. À ela respondem as Federações estaduais, responsáveis pelos campeonatos estaduais e também administra a Seleção Brasileira Masculina, cinco vezes campeã mundial, e a Feminina, vice-campeã mundial. Resumindo, a CBF é o símbolo maior da “pátria de chuteiras” ou da “paixão nacional”.

Como comecei o artigo, alguma coisa está fora da ordem. Seus últimos três presidentes foram afastados por denúncias públicas de corrupção e recai sobre o atual mandatário graves denúncias que podem ser vistas em todos os veículos de imprensa. Ou seja, a sua Governança, pilar do conceito ESG tem sido o elo fraco da sua atuação já tem muito tempo. Voltaremos a esse tema porém antes alguns fatores importantes precisam ser analisados. Como marca, a CBF tem como 4 grandes pilares: a brasilidade, o amor pelo futebol, a profissionalização da gestão da empresa e a evolução do ecossistema do futebol nacional.

Clubes de Norte a Sul tem torcedores apaixonados, enquanto a CBF como marca corporativa não disfruta do mesmo privilégio. Suas submarcas ainda têm carisma mas já viveram tempos melhores. Cada vez mais, o público mais jovem tem tido dificuldade de criar a conexão com o futebol, preferindo outros esportes entre eles notadamente o e-sports. O amor pelo futebol também já encontrou eco em dias melhores. Hoje, não mais. Como no filme “Feitiço do Tempo”, a CBF está presa a uma armadilha temporal que tem feito ela reviver o mesmo problema várias vezes sem fim, prejudicando a percepção de evolução dos demais pilares como profissionalização da gestão e evolução do ecossistema estão comprometidos pelo retrospecto acima.

Por outro lado, como empresa e detentora das seleções masculina e feminina de futebol a corporação apesar de tudo, vai muito bem, obrigado. Patrocinadores como Nike, Guaraná Antarctica, Vivo, Itaú, Mastercard, GOL, CIMED, Semp TCL, Fiat, Pague Menos junto com outros de menor expressão enfileiram-se para estampar suas marcas junto da CBF para alcançar a visibilidade tão desejada. Claro que todos sabemos que buscar visibilidade para as marcas é a regra do jogo. O que é questionável é não perceber a necessidade de separar o joio do trigo.

Segundo os jornais quatro dos dez patrocinadores manifestaram preocupação e pediram investigação séria sobre o caso de assédio: Itaú, Ambev, Gol e Mastercard. Mas surgem algumas dúvidas muito relevantes: se todas elas têm políticas robustas de Compliance, por que somente quatro se manifestaram e não as dez empresas? Diante do retrospecto negativo de gestão da Confederação por que somente agora elas decidiram se posicionar? Elas fizeram alguma análise comparando a visibilidade a ser obtida pelo patrocínio vis-à-vis os riscos reputacionais inerentes a essa parceria? Por que não aplicaram antes seus mecanismos de compliance? Como disse Amir Somoggi em um recente artigo publicado, “O futebol brasileiro tem na CBF um grande obstáculo para seu crescimento — com uma gestão arcaica que e aniquila o desenvolvimento do nosso futebol”.

Retomando aos conceitos do ESG o que está proposto é uma mudança estrutural na forma como as empresas são conduzidos para adaptação urgente a um novo modelo econômico, social e de governança mais coerentes com o nosso novo contexto. Se esses pilares guiarão as tomadas de decisões pelo mundo, como várias das marcas patrocinadores tem negócios em escala global, como elas serão impactadas? Não creio que essas relevantes empresas estejam dispostas a morrer no fundo do mar agarradas aos problemas da CBF. Também não creio que na balança de decisões a visibilidade alcançada seja mais relevante que um potencial detrator da sua reputação. Acredito que elas precisem estabelecer urgentemente um modelo de avaliação do impacto do patrocínio na sua reputação. Talvez seja a hora da CBF e seus patrocinadores entenderem os desafios dessa nova época e se adaptarem ao novo contexto mundial antes que a “pátria de chuteiras” cobre essa nova postura criando uma crise reputacional sem precedentes.

Dario Menezes é diretor executivo da Caliber, consultoria internacional especializada na reputação corporativa