“Titanium conversa em qualquer plataforma, abstrai e muda o jogo”
Jurado pela segunda vez na competição Titanium & Integrated, Nizan Guanaes completa 59 anos em 2017 e vai participar de um Iron Man em novembro.
O publicitário Nizan Guanaes vê a indústria da propaganda do Brasil como uma das melhores do mundo
A competição esportiva é motivo de uma analogia com as áreas que vai julgar no Cannes Lions 2017. “Titanium é uma peça que nada, corre e pedala. Ou seja, ela é boa e conversa em qualquer plataforma, abstrai e muda o jogo. Muda a lógica de alguma coisa”, diz ele.
Na era da comunicação multidisciplinar, muitas agências costumam inscrever peças em várias áreas do festival, mas, nas palavras de Nizan, Titanium é como Netflix. “É uma plataforma que sai da caixinha. O Steve Jobs é Titanium. Eu? Não sei. Acho sou resiliente. Tenho convicções claras. Vejo a propaganda um pouco perdida. O que defendemos na DM9 é propaganda, propaganda. E isso é branded content”, afirma.
Nizan, que hoje integra a equipe de criação da DM9, considera uma piada o discurso sobre o fim da propaganda. “O que está matando a atividade são as pesquisas erradas e o excesso de ‘marketismo’”. Na sua reflexão, uma pessoa com um controle remoto na mão não vai ficar vendo comerciais de 30 segundos desinteressantes que, em linhas gerais, reproduzem apenas o briefing do cliente.
“Isso não é propaganda. Boa parte do que está nas TVs é veiculação. Será que o consumidor vai querer ver lugares comuns? O problema não é da propaganda, mas sim dos processos de marketing. São diretores de marketing falando as mesmas coisas e profissionais de criação e agências sem coragem. A culpa é de todos. Somos nós que, por falta de técnica, princípios, persistência ou mercantilismo, estamos matando a propaganda”, ele justifica.
Diante desse cenário há uma oportunidade? Nizan responde: “Sim. Quando se tem uma cultura, se aproximam e se afastam pessoas. Minha cultura se resume à concentração ao cliente. Isso significa ter tempo para entender o problema, ter honestidade, fazer rotas, mas também ter senioridade. Não podemos negar que a propaganda está muito júnior, do lado das agências e clientes. Falta cabelo branco e isso se consolida com a mistura das gerações”.
Para Nizan, os fundamentos da comunicação não mudam, apenas as plataformas. “As pessoas não reinventaram a medicina; elas estão fazendo ela avançar com novos valores. Perder princípios não dá. Acredito que 50% das pessoas que trabalham com propaganda não entendem nada de propaganda. São jovens millennials que entendem muito de tecnologia, mas não lhes credenciam a dominar a propaganda. Em minha opinião, digital é default. A propaganda é a compreensão da alma humana”, exorta Nizan.
O júri de Titanium & Integrated não tem compromisso com o óbvio. E não se limita ao investimento realizado. Há 11 anos o projeto Design no código de barras, da japonesa Design Barcode, lembra Nizan, ganhou o Grand Prix de Titanium com um orçamento de R$ 30 mil e vendia o serviço de comunicação idealizado pela própria agência. O trabalho japonês, considerado “brilhante” pelos jurados, concorreu com cases milionários como o Mini Cooper 2006, com orçamento de criação, produção e mídia superior a US$ 150 milhões.
“Titanium é algo que o jurado olha e diz ‘pelo amor de Deus, que ideia legal’. Não quero fazer política, mas o projeto do João Doria, prefeito de São Paulo, de diminuir filas dos postos de saúde usando a ociosidade de hospitais nas madrugadas, é Titanium. Porque é um game changer. Uber é Titanium. É uma ideia que parece ter saído da Singularity”, reconhece Nizan.
As mudanças feitas pelo Cannes Lions mostram uma evolução dos propósitos do festival. “Fiquei muitos anos sem comparecer. No início eu tinha razão, mas, com o tempo, vi que estava errado. Hoje o Cannes Lions é um centro de conhecimento. Presta um grande serviço, mas como todo grande remédio tem um efeito colateral, que é as pessoas destinarem às suas carreiras a conquista de um prêmio no festival. Isso é uma hecatombe; uma das piores coisas que essa profissão pode ter. Eu vou lutar para que a DM9 seja um lugar que esteja constantemente botando na rua: o pombo da Ambev; o bebê com down da Johnson & Johnson; e o gato com a voz do Bruno Gagliasso para o Itaú. Essa é uma produção de três meses após o meu retorno. Mas não vou ficar preocupado se esses trabalhos vão ganhar Cannes. A DPZ era assim. A Talent é assim. Eu tenho referências e recomendo aprender com os concorrentes. Vamos sair da soberba. E as agências que mais respeito, entre as quais a Wieden+Keneddy, Crispin Porter + Buguski e Droga Five, fazem coisas que mexem com seus países e são premiadas. O que eu quero é ter coisas legais no ar. Quando não tenho isso, fico mal. A DM9 é uma agência inspirada em Santa Janete Clair.
Gostamos de sucessos no ar. Quero que a DM9 seja premiada, mas, antes de tudo, uma agência consagrada. Não quero aplauso apenas durante uma semana; quero o ano inteiro, porque sou carente”.
Nizan recomenda aos anunciantes marcarem presença no Cannes Lions. “É importante porque é um centro de conhecimento e de boas discussões sobre o negócio. Os clientes não podem ver Cannes como custo. É um investimento. Os clientes dizem que as agências só pensam em televisão e que deveriam estar mais presentes no digital. Mas não querem pagar como fee às agências o que minha filha, que é digital influencer, ganha como post. Como minha filha ganha para botar um post o mesmo que os clientes querem pagar por um fee mensal, e nos acusam de não pensar direito no digital? Não é possível que todo o dinheiro dessa indústria vá para o Google e para o Facebook. É hora de conversarmos sobre as nossas questões”, questiona.
Para Nizan não faz sentido as críticas às BVs. Para ele é algo similar às milhagens. “Está na hora dessa indústria estar alinhada com empresários da nova geração como Edu Simon, da DPZ&T; Marcio Santoro, da Africa; e, por exemplo, Mario D’Andrea, da Dentsu. Lets walk the talk; vamos botar as conversas em perspectivas”, recomenda.
O fundador do Grupo ABC crê em boa performance do Brasil em Cannes exatamente pela criatividade. “A propaganda brasileira está listada entre as três mais importantes do mundo. Não podemos misturar os problemas da nossa atividade com os que estão relacionados à realidade do mercado”, finaliza Nizan.