Semana passada foi aniversário do Neil Ferreira. E ele recebeu uma bela homenagem de Eliana Machado Ferreira, com quem foi casado por quase cinco décadas.

Um site criado com muito esmero, contendo toda a história e a obra desse formidável criativo, com quem tive o privilégio de, por anos, dividir o espaço da mais emblemática agência de publicidade do Brasil: a DPZ.

Embora colegas de trabalho, nos víamos e falávamos pouquíssimo. Recém-chegado de Porto Alegre e ainda me ambientando às idiossincrasias do ecossistema daquela verdadeira instituição criativa, em que egos inflados por prêmios e elogios disputavam espaço, cumpri o ritual de ater-me à comunidade do quinto andar, o andar do Petit e do Washington.

Aliás, pelo menos enquanto estive por lá, conheci um único personagem que transitava com desenvoltura entre esses “dois mundos”, o querido Nelo Pimentel.

Acabo de lembrar, inclusive, que no dia em que fui apresentar meu portfólio e ser entrevistado, quem estava ao lado do W, era exatamente o Nelo.

Mas, voltando ao Neil, as primeiras impressões que tive dele me causaram um certo receio de me aproximar mais. Parecia-me um avaliador implacável, em ação permanentemente. A inquietude do olhar, a resposta pronta, a indagação desafiadora, tudo isso, confesso, me espantava um pouco.

Por outro lado, seu trabalho me inspirava. E acho que hoje, tantos anos passados, e sem retirar uma sílaba de toda a gratidão que tenho pelo Washington, posso falar que o Neil me inspirava mais. E explico a razão: talvez por preconceito elitista de gaúcho, achava o estilo do meu diretor de criação popular demais, seja lá como eu interpretasse isso na época. Mas não tenho dúvida de que, assim, o Washington se tornou um dos maiores responsáveis pela simpatia dos brasileiros pela propaganda.

O padrão do Neil, no entanto, me soava mais elegante, mais sofisticado no uso da inteligência, e eu me identificava melhor com isso.

Claro que nunca comentei essa impressão nem com um nem com outro, por motivos óbvios. Quando assumi a direção de criação da DPZ-Rio, fiquei mais sob a mira do andar do Zara (de quem, ironicamente, me aproximaria, no futuro, muito mais do que do Petit).

Mas na época em que cuidava da conta da Souza Cruz, vivi algumas situações difíceis, reconheço agora, produto de uma teimosia idiota dos meus 30 e poucos anos.

Simplesmente, certa vez me neguei a cumprir um briefing de um dos maiores clientes da DPZ. Um escândalo!

E só por ser uma agência como aquela, não fui demitido sumariamente. Mas fui chamado às falas em São Paulo, pela primeira vez no sexto andar e com o Zara.

Cheguei cedo e tive de esperar, ocasião em que encontrei o Neil no café. Com um olhar que misturava estranhamento e deboche, ele me perguntou que história era aquela e emendou um pedido de que eu ensinasse a ele como se faz isso, porque nunca havia passado pela sua cabeça se negar a cumprir o briefing, por pura teimosia.

Já a conversa com o Zara foi mais curta: me perguntou se eu gostaria de continuar trabalhando na DPZ. Respondi que sim. E ele, sem retirar os olhos do layout que ia rabiscando: então, vai lá e faz essa porra que o cliente está pedindo.

Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
stalimircom@gmail.com