Coragem premiada

Nesse mundo assolado por fake news e por governantes de posições fugidias e pouco confiáveis, ganham as marcas que demonstram coragem de ocupar o espaço da verdade e de assumir posições contundentes frente aos assuntos sensíveis da sociedade. É sem dúvida admirável o posicionamento de algumas marcas, expressando-se corajosamente nas suas campanhas publicitárias.

Na sensível questão de igualdade de gênero, por exemplo, já é comum vermos marcas retratar casais do mesmo sexo em cenas românticas. Mas quero destacar três cases marcantes, que foram merecedores de grandes prêmios internacionais.

O primeiro foi ganhador de Grand Prix do Cannes Lions 2014 e vem da Austrália. O ANZ é um banco de respeito na Austrália, um dos maiores. Mas não teve receio em assumir uma posição de apoio às manifestações LGBT durante a Parada Gay & Lesbian Mardi Gras, de Sidney. O banco é patrocinador da parada há mais de dez anos.

O case que ganhou Grand Prix foi o de “vestir” suas ATMs (caixas automáticas) com cores e símbolos alusivos escancaradamente ao universo LGBT. Eles chamaram essas ATMs de GayTMs.

E mais recentemente o banco reforçou seu posicionamento, abrindo uma agência mais do que gay friendly, totalmente decorada e ambientada ao estilo gay.

A agência, que fica numa rua de grande frequência do público LGBT (onde passa a parada), chama-se agora GayNZ. Quero reforçar que o ANZ não é um banco de nicho. Ele está entre os três maiores do país. Daí o reconhecimento da coragem desse posicionamento. No Cannes Lions deste ano, mais duas campanhas vitoriosas são dignas de registro nesse mesmo campo de luta por igualdade de gêneros.

A primeira é brasileira e foi criada pela David Brasil para a Coca-Cola. Lançando mão de uma expressão popular pejorativa usada para taxar alguém de gay – Essa Coca-Cola é Fanta – a agência propôs à Coca-Cola envazar algumas latas de Coca-Cola com o líquido da Fanta. E na embalagem foi estampada a frase Essa Coca-Cola é Fanta. E daí?.

As latas não foram comercializadas, mas foram amplamente distribuídas junto ao público interno da companhia, assim como para líderes de opinião, reforçando o posicionamento da empresa contra a homofobia. Atitude corajosa, não? Merecidamente ganhou diversos Leões no Cannes Lions.

E o terceiro case vem também da Austrália e ganhou Leão de ouro do Cannes Lions deste ano. Trata-se de um posicionamento de outra marca icônica e de enorme visibilidade: a Nike.

A empresa se posiciona abertamente a favor da não discriminação de gêneros. Já em 2013, a Nike apoiou abertamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo no estado de Oregon, nos EUA.

Mas a campanha australiana, ganhadora de ouro na categoria Outdoor deste ano, teve o mérito de usar o seu swoosh (o símbolo que se assemelha a um tique de tarefa cumprida) no campo Sim na campanha do plebiscito sobre a liberação do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

O reforço da Nike foi fundamental para a vitória do Sim. Esses três exemplos refletem o valor da coragem de marcas que já entenderam que seus consumidores esperam mais do que produtos e serviços de qualidade a bom preço.

O público espera ver atitude por parte das marcas. Mas tem seu risco. Nesse mundo polarizado entre haters versus lovers, é realmente corajosa a iniciativa de se posicionar claramente frente a temas sensíveis e polêmicos.

Mas além de atitude, espera-se coerência e autenticidade, também da porta para dentro. Antes de mais nada, as empresas devem fazer seu dever de casa e realmente adotar uma prática compatível com o discurso liberal.

É preciso estabelecer políticas internas de respeito às diferenças e a favor da igualdade racial, de cor e de gêneros. Não é à toa que marcas autênticas e corajosas são as que vêm sobressaindo e ganhando corações e mentes de pessoas cada vez mais engajadas e críticas. O futuro das marcas exige coragem!

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional de Agências de Propaganda) (alexis@fenapro.org.br)

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