Desde sempre, o segmento de agências de marketing promocional ou live marketing se ressente de um tratamento desigual com seus clientes, quando comparado ao das agências de propaganda. Principalmente o regime de conta é motivo de inveja por parte dos empresários de agências não propaganda.

De fato, ao invés de um casamento, a proposta dos contratantes de serviços de live marketing é de apenas “ficar” com a agência até que o final do job os separe. E a cada job se inicia uma nova paquera, juras de amor e lá vão eles para mais uma aventura com tempo certo para terminar.

De uns tempos para cá, alguns clientes passaram a propor uma situação de poligamia, com três ou quatro “preferidas”, às quais direcionam algum carinho de tempos em tempos. É o tal sistema de agências homologadas. Situação menos incômoda para as agências, que pragmaticamente acabam aceitando este formato, já que a outra opção, concorrência fria job a job, sem homologação prévia, parece ainda pior.

Continuando a analogia com casos amorosos, seria a luta para conquistar “parceiros” diferentes o tempo todo, sem se prender a nenhum deles. Uma promiscuidade total. Como há muita agência aceitando esse “ficar” job a job, o cliente se sente o garanhão do pedaço e continua atraindo pretendentes. Paro aqui essa analogia, que já foi longe demais.

Até porque começo a perceber um movimento de agências que já não se incomodam tanto com a relação job a job, mas passam a vê-la mais como projeto a projeto. A diferença é que a agência pode adotar um papel ativo na relação (Ops! Lá vou eu outra vez…). Ao invés da passividade à espera de um job, traduzido num convite para uma concorrência, algumas agências vêm descobrindo que pode ser bom não ter uma relação estável, amarrada por fees ou homologações.

Ao contrário, já que não há contas amarrando cliente e agência, há a liberdade de prospectar qualquer cliente potencial. Ou seja, o job nasce sem briefing, mas, isso sim, fruto de uma proatividade da agência, que estuda o mercado e o cliente potencial e bate na sua porta com um projeto que tem chance de atrair a atenção do cliente e emplacar.

Quando isso acontece, as regras do job são estabelecidas por quem o formula – a agência – e não necessariamente por quem contrata – o cliente. É claro que esse processo está sujeito a todas as negociações, inclusive aquelas do departamento de compras, cada vez mais envolvido nas contratações de serviços promo. Mas, pela proatividade e a autoria do projeto, a agência consegue sair das amarras de um contrato leonino e obter condições mais favoráveis.

Joga ainda a favor deste modelo o fato das ações de marketing/comunicação tenderem a fugir do modelo tradicional. Projetos fora das caixas convencionais propaganda/promoção/RP são buscados e valorizados. Uma boa conversa com um amigo, dono de uma agência que se propõe a atuar neste modelo, me motivou a escrever este artigo. Refiro-me ao Marcelo Lenhardt, da Hands, que me apresentou um desses cases fantásticos, que não se enquadram em disciplinas convencionais do marketing mix.

Trata-se do projeto de recuperação do icônico Beco das Garrafas no Rio, local que faz parte da história da bossa nova e que marcou o nascimento da carreira de uma das mais incensadas cantoras brasileiras de todos os tempos: Elis Regina. O Beco das Garrafas, área localizada no coração de Copacabana, famosa pelas casas noturnas Little Club, Bacará e Bottle’s Bar, foi o ponto de partida para o surgimento da bossa nova e reunia diversos artistas que mais tarde se tornariam grandes estrelas da música nacional.

Criado no final dos anos 50, por lá se apresentavam, além de Elis, Sergio Mendes, Wilson Simonal, Nara Leão, Baden Powell, Wilson das Neves, Jorge Ben Jor e muitos outros. O grande mérito da Hands foi ver na recuperação do Beco das Garrafas uma excelente oportunidade para a Heineken se projetar, dentro do escopo da sua campanha mundial “Cities of the World”. Mais do que ter sua marca fortemente presente nos bares recuperados, Heineken se apropria de um resgate muito caro aos cariocas e brasileiros em geral. Isso é mais forte do que atividades convencionais de comunicação. A Hands não esperou um briefing para criar esta ação para Heineken. Este não é um caminho fácil, mas pode ser uma válvula de escape para as agências cansadas de relações desiguais com seus clientes.

*Diretor de marketing do WTC