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Apesar de as brasileiras não se sentirem bem representadas pela propaganda, é cada vez maior o número de campanhas que buscam retratar uma mulher mais próxima da realidade e seus anseios. Há três anos, o Data Popular divulgou uma pesquisa apontando que 56% dos entrevistados (entre homens e mulheres) não acreditam que a publicidade mostre a mulher da vida real. Realizado em parceria com o Instituto Patrícia Galvão, o estudo não foi repetido, porém é possível notar que aumentaram as campanhas que abordam o empoderamento feminino. E por que essa tendência se estabeleceu? Talvez pelo fato de os anunciantes tentarem fugir dos estereótipos manjados e também porque o poder de decisão de compra da mulher cresceu consideravelmente. Modismos à parte, o tema chama a atenção.

Dove, por exemplo, é hoje globalmente reconhecida como a marca da real beleza, graças aos seus esforços de comunicação. Em 2004, lançou a Campanha pela Real Beleza, posicionamento que mantém até agora, baseado em um insight real de que apenas 2% das mulheres se achavam bonitas de verdade. Durante esses mais de dez anos, a ideia gerou vários insights, desdobramentos e prêmios, como os 15 Leões em 2013 no Festival de Cannes com a famosa campanha Retratos da Real Beleza, criada pela Ogilvy Brasil, que levou também o Grand Prix de Titanium, até então inédito para o mercado brasileiro.

“A campanha é baseada em um insight verdadeiro e consistente. A missão de Dove é convidar as mulheres a perceberem o potencial de beleza de cada uma, como forma de contribuir para que os estereótipos sejam sempre repensados. A marca acredita muito que a beleza tem de ser fonte de confiança e não de preocupação e tenta trazer sempre essa reflexão para empoderar as mulheres. Dove tem a ambição de ser fonte de transformação positiva, de ajudar a mulher a construir sua autoestima”, afirma Viviane Ramos, gerente de marketing de Dove.

Pertencente à Unilever, Dove chegou em 1992 ao mercado brasileiro. Dona de uma linha de produtos que inclui desodorantes, sabonetes e artigos para os cabelos, a marca realiza inúmeras pesquisas sobre o público feminino. O estudo global que identificou que só 2% das mulheres se sentiam bonitas foi repetido em 2011, mostrando que o percentual havia subido para 4%. “Esse número subiu muito pouco”, avalia Viviane. A executiva ressalta que a força da marca ajuda a confirmar que a comunicação está no caminho certo. “Hoje mais do nunca é importante falar sobre o empoderamento feminino, porque todo mundo está muito exposto a informações e estereótipos. Acho que a gente como marca precisa trazer essa visão real para que as mulheres façam essa reflexão”, acrescentou ela.

Empoderamento financeiro

Já a centenária Avon é uma das empresas mais relevantes na história feminina. “A gente costuma brincar que há 130 anos trabalha com o empoderamento da mulher, desde o nascimento da marca, em 1886, que deu a oportunidade para a nossa primeira revendedora a ter uma atividade com ganhos financeiros, em uma época em que as mulheres nem tinham direito de votar. A independência financeira é o primeiro passo para a mulher se sentir empoderada”, destacou Ricardo Patrocínio, VP de marketing de Cosméticos da Avon. Hoje, existem 1,5 milhão de revendedoras da marca no Brasil e 6 milhões em mais de 100 países.
O executivo conta que o Instituto Avon, que já tem 12 anos no Brasil, trabalha em frentes como o combate e a detecção do câncer precoce e contra a violência doméstica. A Avon também levanta a bandeira pela igualdade dos gêneros nas empresas. Na Avon Brasil, nós temos diversas mulheres em cargos de liderança e hoje 60% da força de trabalho é preenchida por mulheres”, disse.

Entre as últimas campanhas da multinacional americana está a do batom UltraMatte, que lançou a hashtag EuMeSintoConfortável. “Nós pegamos o insight do batom, que tem um diferencial na fixação, para lançar a ideia de que a mulher deve se sentir confortável para fazer o que quiser com o seu corpo. Com isso, procuramos estimular a conversa sobre esse tema bem atual, mas que para a Avon não é um modismo”, acrescentou Ricardo.

Mulher brasileira

No caso da Azaleia, o conceito da mulher brasileira norteia a comunicação da marca. “Neste ano vamos mais a fundo no tema e buscar exemplos de mulheres reais, que tenham uma história de vida bacana, que sejam bonitas e realizadas profissionalmente”, falou Ana Hochscheidt, gerente corporativa de marketing da Vulcabras Azaleia.

A atriz Grazi Massafera é a embaixadora da marca e encabeça a lista de mulheres que fazem parte da campanha. “Temos três mulheres na comunicação, além da Grazi, que é a nossa embaixadora e a celebridade que temos na linha licenciada. Ela é um exemplo de mulher forte, vencedora, que deu certo”, disse.
Para dar o pontapé na campanha no mês das mulheres, a Azaleia adesivou os vagões femininos dos trens do Rio de Janeiro com o slogan Você é o seu melhor momento. A comunicação criada pela Pereira & O’Dell também terá desdobramentos com anúncios em revistas e ações na internet.

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“A essência é buscar histórias de mulheres reais e incentivá-las a dividir suas histórias nas redes sociais”, acrescentou Ana. “A gente sabe da força da mulher, do seu poder de decisão de compra, mas ao mesmo tempo existe uma pressão muito forte para que ela seja perfeita. A gente tentou fazer um discurso mais próximo, valorizando as histórias legais que cada uma das mulheres tem para contar”, revelou a executiva.

Pluralidade
Uma campanha considerada inovadora para falar da pluralidade da mulher foi a série Marias, da Intimus. A marca lançou seis curta-metragens que contam a história de seis mulheres chamadas Maria. Os vídeos falam de amor, relacionamentos, sonhos, trabalho e menstruação. “A gente viu muito em pesquisas que as marcas nessa área não conseguem criar uma conexão com as consumidoras. Tentamos falar de menstruação de uma maneira mais natural”, contou Sâmia Chehab, diretora das categorias cuidados adultos e femininos na Kimberly-Clark, dona de marcas como Intimus e Plenitud.

Criada pela Ogilvy e VML, o mote da campanha lançada no ano passado é Elas não vão com as outras. A campanha multimídia viralizou rapidamente. “Os vídeos tiveram mais de 20 milhões de visualizações num período de menos dois meses”, revelou a executiva.

O sucesso garantiu a continuidade da campanha, que este ano entra em uma nova temporada com uma parceria com a Sony. “Estamos pensando em algo maior, mais em estilo de série para TV e web”, adiantou Sâmia. “A gente acredita muito nesse projeto, superousado, que fugiu do padrão”.

A executiva conta que a empresa também está fazendo um trabalho muito forte com Plenitud, marca de produtos para incontinência urinária. “A publicidade não aborda essa questão do envelhecimento de uma forma mais atual”, disse Sâmia. Ela lembra que uma mulher de 50, 60 anos não é mais como era antes. “Hoje essa mulher está se separando, casando de novo, fazendo faculdade. A perspectiva de envelhecimento mudou”.

De acordo com dados da empresa, uma em cada três mulheres a partir dos 45 anos tem incontinência urinária no Brasil. “É um assunto supertabu e a gente vem trabalhando para ter uma conversa mais aberta e uma imagem de marca mais moderna. Fizemos um videomanifesto mostrando que a terceira idade não é mais como antigamente. Foi um vídeo superinspirador, em que pedimos para as mulheres compartilharem as suas histórias. A gente vai ter de aprender a falar com essas mulheres mais velhas e empoderá-las”. O projeto Vontade plena é assinado pela VML.

Polêmica

No quesito campanhas polêmicas, a Duloren ganha disparado. No entanto, a diretora de marketing Denise Areal afirma que o objetivo da comunicação da marca é libertar e empoderar as mulheres. “Já falamos sobre o empoderamento da mulher há muito tempo, desde os anos 1990, quando começamos a discutir temas como aborto e opção sexual”, falou ela.

A executiva cita como exemplo de campanha polêmica uma que falou implicitamente sobre a masturbação feminina, que foi alvo do Conar (Conselho Nacional de Autorregualmentação Publicitária). “O anúncio apenas mostrava uma mulher numa cadeira em posição sugestiva, com a frase Eu me amo”.

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 Segunda maior fabricante de lingerie no país, a Duloren também já abordou a produção independente. “Também falamos que qualquer forma de amor vale a pena. A intenção é sempre mostrar o poder da mulher”. A X-Comunicação, de Marcelo Gorodicht, é a agência de publicidade da marca.

Do lado das agências, Renata D’Ávila, VP de planejamento da Lew’Lara/TWBA, afirma que o empoderamento feminino na propaganda nada mais é do que reflexo da própria sociedade. “É um assunto que está muito pulsante, porque estamos discutindo o papel da mulher num âmbito maior. Eu acho que para as marcas serem relevantes, elas têm de fazer parte da vida das pessoas e se posicionarem sobre temas que fazem sentido na vida dos consumidores. Um próximo passo seria fazer com que as mulheres se sintam mais representadas na propaganda”. Na opinião da publiciltária, as agências têm pela frente um enorme trabalho para sair do lugar-comum, fugir de estereótipos e trazer a representatividade feminina de uma forma mais natural para a publicidade.