Armando Ferrentini: "temos que continuar fazendo a nossa parte, mesmo com todas as barreiras impostas pelo lado B da nossa economia"

1. Embora muito lentamente, a reação de alguns setores da economia à crise brasileira começa a se fazer sentir com reflexos na atividade publicitária, que, como foi dito aqui na edição anterior do propmark, se a propaganda é a primeira a ser cortada nas crises, é também a primeira a ser lembrada para combatê-las e, mais ainda, aos primeiros sinais de retomada.

O cenário vai aos poucos se modificando, graças à iniciativa privada, que já aprendeu a não ficar eternamente reclamando das dificuldades derivadas dos nossos maus governos.

Temos que continuar fazendo a nossa parte, mesmo com todas as barreiras impostas pelo lado B da nossa economia, que insiste nos últimos tempos a repetir a lição errada, matando ou adoecendo as galinhas dos ovos de ouro que habitam nosso território.

A verdade é que é muito fácil exercer as funções de governo em nosso país, porque a cobrança não raro se perde no vazio e os erros das autoridades, principalmente os que provocam a falta de numerário nos caixas oficiais, são pagos através de canetadas impostas à população (pessoas físicas e jurídicas), sem qualquer preocupação dos mandatários sobre a impossibilidade destas cumprirem sem grandes sacrifícios o que lhes é exigido.

O círculo vicioso se repete através dos tempos, agravado em certos períodos como o que agora vivemos, quando se procura insistentemente mudar o modelo político adotado pelo país e se destinam verbas incalculáveis para obras em outras nações cujos governos professam ideologia semelhante.

Na verdade, o que se pretende com essa prática não é simplesmente ajudar quem precisa, mas criar fortes elos internacionais nessa corrente de pensamento político que já deveria pertencer de forma definitiva tão somente ao passado.

Todos sabemos o fracasso que foram os anos de chumbo na extinta URSS, cuja abertura, a partir da queda do muro de Berlim, revelou ao mundo a podridão política que a censura à mídia local impedia de ser revelada.

O Brasil não foi feito para isso, mas não está conseguindo impedir como deveria que os profetas do caos prossigam catequizando os menos favorecidos, no sentido de convencê-los que a democracia não é o que dizem os verdadeiros democratas, mas sim um caminho que poderá levá-los sem muito esforço ao paraíso.

É exatamente no âmago dessa engabelação que precisamos acertar, revelando aos crédulos quem são na verdade esses profetas, que se aproveitam da miséria de grande parte da população brasileira para se enriquecerem de forma indevida.

Basta a esse estado de coisas, se quisermos um país verdadeiramente mais justo para todos os brasileiros. Estamos todos cansados de assistir à repetição das trapaças de quem detém o poder. O “nós e eles” aqui cabe como uma luva: “nós” somos os poucos mais de duzentos milhões de patriotas que cumprimos cotidianamente com as nossas obrigações e “eles” são aquela minoria apeada ao poder – com raras exceções – que mistificam conscientemente suas palavras e promessas, fazendo-nos crer que finalmente tudo mudará.

Tudo mudará para quem e para onde?

2. Destaques para as campanhas de duas redes de postos de serviços: a da Shell, criada pela J.Walter Thompson com foco em motivar individualmente cada brasileiro a ir até o fim nas suas ideias e boas atitudes (“Se você for tentar, vá até o fim. Se não, nem comece.”).

A outra, que já tem longa duração e sempre merecendo aplausos, é a dos postos Ipiranga, criação da Talent sempre vitoriosa nos concursos publicitários e que a cada semana, em média, apresenta comerciais que provocam admiração nos espectadores de tevê e cinema e nos internautas. A qualidade da linha criativa da campanha provoca a torcida do público pela próxima exibição de cada comercial, mesmo que seja o mesmo anterior. Isso é propaganda que dá resultados: a que faz o público torná-la seletiva.

3. Especial para o propmark, o texto a seguir de Humberto Mendes, da Fenapro: “De 1960 a 2015 – Se eu estivesse em Cannes no festival de junho, teria subido ao palco para dar um abraço em Amir Kassaei pela palestra na qual ele teve a coragem de dizer que ‘a propaganda está perdendo a relevância e se deslocando da realidade, esquecendo do verdadeiro consumidor que está nas ruas, para quem muitas coisas consideradas criativas, hoje já não fazem sentido’.

Se ele estivesse falando sobre a propaganda brasileira, poderia dizer também, sem nenhum medo de errar, que está esquecendo de si mesma, de seus valores, e de sua relevância.

Ele teve a coragem de apresentar num telão o célebre anúncio em que a grande DDB – Doile, Dane & Bernbach Inc., no início dos anos 60, propunha que se resgatasse o sentido da propaganda.

O célebre anúncio chamava o leitor a refletir sobre verdades e outros fatores importantes que não se colocava nos anúncios de certos produtos, porque simplesmente tais verdades não existiam e ia ainda mais longe, ao vaticinar, numa provocação, ‘se não aprendermos a lidar com isso, morreremos todos’.

Sinceramente, eu acho que seria oportuno alguém fazer hoje um manifesto semelhante, na forma de anúncio comentando os acontecimentos que estão levando a nossa atividade no Brasil a um nível muito abaixo do lugar de respeito e destaque que sempre teve. Esses tristes acontecimentos estão aí e todos sabemos quais são.

Eu só não os escancaro aqui, neste humilde texto, porque não sou nenhum Sr. Doile, nem o Sr. Dane e muito menos o senhor Bernbach. Eu sou apenas um velho publicitário com mais de 60 anos de trabalho, tentando fazer alguma coisa útil pela nossa atividade.

Os acontecimentos que estão provocando o desmanche no nosso negócio estão aí, repito, e se ampliam cada vez mais, com mais intensidade, como tudo o que é ruim.

Só ouso afirmar, em meu nome pessoal, que, ou tomamos uma atitude ou morremos todos, como já vaticinava a grande DDB há quase 60 anos”.

*Diretor-presidente da Editora Referência, que edita o jornal propmark e as revistas Propaganda e Marketing