Nada contra o Big Data, mas o que me inspira mesmo é o Little Data.

Sempre gostei de sebos de livros, lojas de LPs e mercados das pulgas. Trabalhando em propaganda, descobri de alguma maneira que esta prática de fuçar estantes ou prateleiras era um jeito de buscar inspiração. 

Você procura Rolling Stones e tropeça em Raul Seixas. Vai atrás de Miles Davis e sai da loja com um bolachão de Mambo Cubano. 

Sempre encontrei inspiração onde eu não estava procurando.

Não é a bola pingando, o que está debaixo do nariz ou a ideia exposta na prateleira. Gosto de procurar referências nas referências que parecem não ter nada a ver.

Grandes ideias estão escondidas. Podem estar num sketch do Monty Python, numa abertura de um filme dos anos 1940, numa capa da Esquire, do George Lois, ou num haikai de Leminski, que ainda não virou “frase feita emoldurada no Facebook”.

Vou juntando estas coisas todas como um dono de sebo que vai empilhando seus livros. Às vezes, ficam catalogados; às vezes, não.

E assim vai se formando a minha biblioteca de pensamentos imperfeitos e ideias embrionárias. De vez em quando, consulto o meu sebo imaginário e tento encontrar alguma coisa que possa se encaixar.

Nestes tempos em que tanto se fala em pensar fora da caixa, a caixinha que mais me incomoda é a do search do Google.

No grande cruzamento de dados do Big Data, prefiro procurar a big ideia na esquininha de trás, no beco sem saída.

Ao longo de todos estes anos de propaganda, fui descobrindo que grandes ideias nasciam não apenas de grandes verdades, mas de pequenas descobertas.

No fim dos anos 1950, um comercial do Fusca, criado pela DDB, mostrava o motorista de um trator que limpa a neve das estradas. Aí, o locutor pergunta: “Como é que o motorista do trator de neve sai de casa pra chegar ao trabalho?”

Nos anos 1990, quando os veganos ainda não estavam na moda, um comercial do Nizan para a Churrascaria Esplanada Grill mostrava um cara magro, de bata branca, falando mole, dizendo que não sentia a menor falta da carne. No final, a assinatura é ironia em estado puro: “Esplanada Grill. Aquele lugar deprê, cheio de gente baixo-astral.”

Num comercial mais recente, da Nike, uma freira de 82 anos pratica triatlo. Fica difícil imaginar se os milhões de dados sobre os seguidores das marcas nas redes sociais conseguiriam descobrir no Facebook grupos de freiras octogenárias praticantes de triatlo.

Em todos estes casos, existe o mesmo ponto de intersecção. Mais do que pessoas de verdade, o que vemos são personagens. Gente feita de carne e osso e não de algoritmos. Gente feita de emoção real, em vez de robozinhos de inteligência artificial.

Não sou ingênuo, nem cético a ponto de ignorar que o Big Data chegou firme e forte. Que a inteligência artificial vai mudar radicalmente nossos hábitos e costumes.

Mas tenho certeza de que o que vai continuar emocionando as pessoas são pessoas. E os pequenos detalhes, que produzem grandes histórias e, consequentemente, as grandes ideias.

Aaron Sutton é diretor de criação da DM9

 

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