Não preciso dizer que o Brasil está passando por um momento crítico. Uma conjunção perversa de fatos negativos nos faz relembrar pragas bíblicas: queda vertiginosa dos preços de commodities e do petróleo (colocando em risco os benefícios do, outrora redentor, pré-sal), infestação de Aedes aegypti (e a consequente epidemia de doenças), desastre de Mariana.

Alê Oliveira

Mas talvez as “pragas” mais contundentes sejam a do pessimismo e a da impotência frente à onda de malfeitos e atitudes antiéticas.

De repente, fomos assolados por um tsunami de lama que parece não ter fim. A cada dia, uma nova manchete de escândalo envolvendo lideranças empresariais e governamentais.

Passada a fase da estupefação, veio a da indignação e, a pior, a da desesperança. Quem poderá nos salvar? Infelizmente, super-heróis não existem.

Existe um time quixotesco de promotores e juízes, que não se curva à pressão dos poderosos e vai até o fim para alcançar os antes intocáveis malfeitores.

Mas eles sozinhos não serão capazes de reverter a situação de caos político, econômico e ético que se instaurou no nosso país. Pois é… a salvação está em nós mesmos.

Não me refiro somente ao bater de panelas e às manifestações explícitas de indignação perante os atos de governantes, avalizando e dando forças aos juízes e promotores, cobrando um fim aos desmandos. Essas são importantes, mas não bastam.

A solução não é de curto prazo e estará centrada na atitude de cada um de nós. Temos o hábito de achar sempre que corruptos e antiéticos são os outros.

Mas muitas vezes nos pegamos deslizando eticamente em situações que, de tão corriqueiras, não parecem delitos. Um exemplo pessoal: como muitos brasileiros, tive, meses atrás, minha carteira de motorista suspensa por excesso de pontos.

OK, pena merecida para quem descumpriu regras de trânsito. Para renovar com um mínimo de perrengue, procurei um despachante. De cara, ele me propôs um valor para um “atalho” que abreviaria a pena e me isentaria do exame de renovação.

Deixei claro que não era isso que queria, que estava em busca apenas de uma ajuda na logística do processo, essa coisa de ir ao Detran, ficar em filas imensas, enfrentar profissionais mal-humorados… Você sabe, não é?

Pois bem, o tal despachante não tinha outro serviço senão o da “chicana” corrupta. Decidi cumprir o calvário sozinho, sem jeitinhos. Tudo dentro dos conformes.

Foi chato, é claro, mas estou com a minha carteira renovada e me sentindo muito bem por não ter contribuído com a máfia impregnada nesse processo.

Esse é apenas um caso trivial, pequeno, mas se cada um de nós levássemos às últimas consequências a observância aos processos legais e éticos, talvez nós não estivéssemos à mercê de lideranças tão desprovidas de princípios nobres.

Trazendo o assunto para a nossa praia, do universo da comunicação, cabe-nos questionar o quanto somos zelosos em relação aos processos inerentes aos nossos negócios.

Ficamos possessos quando “marqueteiros” – assim chamados pejorativamente 

– são confundidos com verdadeiros publicitários e ganham manchetes no meio da lama da corrupção.

Apontamos o dedo e dizemos: “Isso é um absurdo! Esses corruptos não são publicitários!”. E é verdade! O que fazem esses pseudopublicitários é uma outra coisa.

Não tem nada a ver com os verdadeiros publicitários, que tocam o seu negócio com transparência e observância aos princípios éticos.

Mas será que estamos todos no clima de tolerância zero? Será que estamos resistindo aos atalhos do jeitinho? Será que estamos todos respeitando a preciosa autorregulamentação que o nosso setor conquistou?

Não me entenda mal: o questionamento que faço é para um de nós, brasileiros, que, via de regra, somos contundentes na crítica, mas condescendentes na autocrítica. Será que antiéticos são só os outros?

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional de Agências de Propaganda)