Alê Oliveira

Uma das piores consequências de uma crise econômica, depois que passa, é a percepção de que se pode viver sem algumas ferramentas do marketing, deixadas de lado por carência de verba durante a crise e que aparentemente não fizeram falta.

É o caso, por exemplo, de campanhas publicitárias institucionais, cuja própria natureza não exige resultados imediatos, levando o anunciante a pensar que pode prosseguir no pós-crise sem esse recurso de comunicação.

Campanhas que não têm a característica de provocar vendas imediatas provocam, no médio prazo, quando abandonadas, estragos que podem ser comparados a outra crise.

A retomada dos negócios, que começa a acenar nos diversos segmentos do mercado brasileiro, embora ainda lentamente, deve também produzir, nas mesmas proporções, a retomada dos investimentos.

Não podemos nos iludir com a falsa constatação de que determinada função do marketing, deixada de lado no pior momento da crise, não nos fez falta. O que geralmente ocorre nesses períodos de queda acentuada dos negócios é a mais completa inibição das armas e estratégias, normalmente utilizadas e com boas performances em períodos favoráveis da economia.

Na sua retração, pouco ou nada funciona porque as pessoas, tanto físicas quanto jurídicas, encontram-se sem recursos e desmotivadas para  compras e investimentos, aguardando dias melhores.

Entre nós, aqui no Brasil, eles estão chegando e serão ainda mais acelerados a partir da confirmação do impeachment da presidente afastada.

Paira no ar ainda um quê de dúvida quanto ao sucesso do seu afastamento definitivo, porque o Brasil, com certa frequência, surpreende tanto para o certo como para o errado.

Essa dúvida, por menor que seja, emperra o deslanche dos negócios, mesmo que seus primeiros sinais já estejam despontando à nossa frente.

O ideal, portanto, é, à medida que o caixa for se recompondo, retornar às iniciativas que faziam as empresas alcançarem suas metas. Acreditar que uma crise, por maior que seja, provoca revelações inesperadas, como a de ineficácia de determinadas ferramentas do marketing, é ajudar o concorrente que não pensa dessa forma a tomar fatias do nosso mercado.

As crises ensinam, sim, coisas que nos momentos de sucesso desprezamos, como reduzir ou mesmo acabar com despesas inúteis, substituir colaboradores que já não vinham bem, mas só percebemos isso com o agravamento da economia, e até mesmo – e principalmente – fazer mais do mesmo.

Grandes vencedores de fases pós-crise tiveram o cuidado de prestar a devida atenção a esses e a outros pontos que são mais percebidos durante as dificuldades, aproveitando para cortar, parcial ou totalmente, esses e outros custos inúteis que sobrecarregavam as empresas, mas não eram facilmente percebidos porque a bonança costuma encobrir os pontos fracos ou mesmo inúteis de qualquer empreendimento.

 

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Nizan Guanaes assinou na última terça-feira (19/7) um instigante artigo na sua coluna semanal na Folha, abordando a importância da propaganda que vira cultura popular.

Na sua narrativa, à medida em que ele provoca uma pergunta, responde de imediato com o jargão de uma das melhores campanhas dessa natureza que já se fez no Brasil até hoje: Pergunta lá no posto Ipiranga.

A frase ordenativa é o próprio título do artigo e seu autor, um criador contumaz da boa propaganda que não só vira cultura popular, mas que antes disso usa dos seus recursos, argumentos e tradições para incentivar cada vez mais essa riqueza que é a voz do povo.

Como ele bem reconhece, dificilmente esse tipo de campanha sai vencedora em Cannes, porque é muito difícil para um gringo decifrar a riqueza de um Pergunta lá no posto Ipiranga.

Mas a propaganda não é feita para ganhar prêmios em festivais, como diziam nossos pioneiros. O maior prêmio de um anúncio ou de uma campanha é provocar movimento se possível acentuado nas vendas do anunciante.

Ganhar prêmio então é ruim? Ou irrelevante? De forma alguma. É sempre bom um reconhecimento ao bom trabalho publicitário, por profissionais de renome internacional como no Cannes Lions. É a certeza de que se está diante de um produto final publicitário de alta qualidade, no qual se vislumbra não só o domínio da profissão pelos seus autores, como aquele algo mais tão importante em qualquer atividade que requer a participação humana de ponta a ponta: o talento.

Palavra mágica que não apenas os criativos, mas principalmente, no caso da propaganda, os anunciantes e, mais ainda, o público ao qual é destinado o trabalho, sabem todos reconhecer quando se apresenta robusto em um simples anúncio de meia página em jornal, como em uma grandiosa campanha que usa todas as plataformas dos universos analógicos e digitais.

Para recompensar o autor do artigo que motivou o presente texto neste editorial, cito a campanha das velhinhas digitais do Itaú, que vem fazendo grande sucesso junto ao público dos oito aos 80 anos.

 

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O brasileiro José Papa Neto, que desde janeiro de 2015 é o CEO global da WGSN, empresa especializada em inteligência de negócios, passará a liderar o Cannes Lions, sucedendo Philip Thomas, que havia se tornado CEO do festival em novembro de 2006.

Detalhe: a WGSN e o Cannes Lions fazem parte da Ascential (antigo Top Right Group), que tem Duncan Painter como CEO desde 2011. Painter fará uma viagem de negócios ao Brasil na primeira quinzena de novembro.

Armando Ferrentini é diretor-presidente da Editora Referência, que publica o PROPMARK e as revistas Marketing e Propaganda