Em meados dos anos 1990, fiz uma visita à sede do Havas, em Paris. Logo ao chegar, chamou a minha atenção uma palavra que cobria toda a parede da recepção. Agora não me lembro se eram letras brancas sobre fundo preto ou o contrário.

Mas a palavra me ficou gravada: disruption. Imaginem a curiosidade que tal conceito me causou há mais de 20 anos. Pesquisei e até onde consegui compreender se tratava da promessa, à época, de promover algum tipo de ruptura nos padrões da propaganda. Ou seja, os clientes que procurassem o Havas experimentariam uma oferta de soluções que rompiam as referências até então conhecidas. Uma promessa e tanto.

O trabalho da agência, porém, era bem careta. Aqui no Brasil, a DPZ, por exemplo, já vinha surpreendendo com as suas propostas criativas desde o fim dos anos 1970. Ou seja, era uma agência, digamos, disruptiva por natureza. Por já ter trabalhado na DPZ e na W, por exemplo, acabei não me impressionando com a terminologia adotada pelos franceses.

Hoje, a disrupção está em voga outra vez, com a diferença de que intimamente ligada à tecnologia. É praticamente obrigação de toda startup ser disruptiva. Se na década de 1990, a disrupção era só uma promessa um tanto vaga, carregada de fantasia, hoje é uma aplicação efetiva, demonstrada através da quebra de modelos para o uso de uma importante gama de serviços.

Torna-se, assim, um grande desafio ser disruptivo, pois já não se trata de fazer melhor o que já foi feito, mas fazer diferente o que sempre foi feito de determinada maneira. Talvez tamanha exigência explique o altíssimo índice de fracassos entre as milhões de tentativas de ser disruptivo que já vêm sendo feitas há alguns anos. Estão aí as tais incubadoras, que não me deixam mentir. Trata-se de um processo muito desgastante. E o curioso é que os problemas decorrem, como antigamente, de brainstorms que não dão em nada, na pobreza das ideias. De todo modo, parece que sempre que um projeto vinga acaba justificando o tempo, o dinheiro e a energia despendidos em centenas de outros.

O caso do aplicativo 99, que foi recentemente vendido aos chineses, é um exemplo bem emblemático. Certamente, ao circular a informação de que
um sujeito embolsou um bilhão com um aplicativo disruptivo, milhares de jovens mergulharão no mundo das startups em busca do seu bilhão. Sempre se sairão melhor aqueles que forem mais criativos e tiverem as melhores “sacadas” como se costumava dizer.

Mesmo que a expertise em tecnologia não seja o seu ponto forte. Porque, mais do que em qualquer outro tempo, o importante agora é a capacidade de “enxergar além”. E enxergar além é compreender a essência dos acontecimentos.

Numa analogia com a ciência, seria como ter a capacidade de decompor um acontecimento para avaliar do que ele é constituído e, sob a perspectiva da história, prever para o que esse acontecimento evolui e a qual velocidade. Principalmente se você pensar que está numa corrida em que se chegar tarde, perde, mas, se chegar cedo demais, também perde.

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing (stalimircom@gmail.com)