O tempo não para, diz a canção de Cazuza. E se ele segue adiante, por que não com um pouco de esperança, paz e felicidade? Foi com isso em mente que o designer Hans Donner, mais conhecido pelas vinhetas, aberturas de programas e novelas, além da linguagem visual da Rede Globo de Televisão nos últimos 30 anos, criou o protótipo de um novo tipo de relógio que, nas suas palavras, mede um tempo que não está relacionado ao dinheiro e a valores materiais. 

 

Alê Oliveira

“Ele marca o tempo como seus similares, mas a observação do seu movimento vai além do óbvio. Dá tranquilidade a quem o observa”, explica Donner, que conduziu uma pesquisa para saber a reação à exposição ao objeto. “As pessoas simplesmente me diziam que tinham um sentimento de paz ao constatar o movimento. É um relógio, mas sem pressa. O tempo é exatamente o oposto do dinheiro; é vida”, ele acrescenta.

As ideias de Donner sobre esse relogio conceitual, que começou a ser elaborado há cerca de 20 anos, quando realizava um projeto para o departamento de turismo do governo da França, estão ganhando as ruas em forma de mídia OOH (Out of Home). Donner é o primeiro usuário do modelo que terá produção em escala industrial em breve. Nesse instante, o designer se uniu ao empresário Marcio Soave, da Timedia, para estruturar uma plataforma de mídia cuja essência é delimitar o tempo disponível das pessoas quando expostas à publicidade nas ruas. O relógio é a inspiração. Donner leva sua experiência no meio televisão para propor que as telas de LED em avenidas e rodovias tenham conteúdo cognitivo para prender a atenção das pessoas no curto espaço de tempo que têm quando passam por esses monitores de 10 metros de largura e quatro de altura.

A primeira cidade contemplada foi Brasília. O lançamento ocorreu no último dia 21 de abril, no 57º aniversário da capital do país. Nos paínéis, instalados na avenida que faz a ligação do centro do Distrito Federal ao aeroporto, podia se ver imagens de Juscelino Kubitschek, que transferiu a capital do Rio de Janeiro para o Planalto Central, e do mártir da Independência, Tiradentes. A remuneração é feita por exposição de marcas de forma rápida. Por assim dizer, nas palavras de Donner, é complementar ao que é feito em outros canais de comunicação. “Brasília é a cara do futuro. Tivemos a oportunidade, em parceria com esse profissional incrível, de estrear um novo conceito no centro do país”, argumenta o empresário Marcelo Godoy, da Alúmi Out Of Home, parceira do projeto no DF.

“A TV tem um timimg preciso para abordar os espectadores. A publicidade nas mídias OOH pode ter esse sincronismo, porque o tempo é beleza. Os relógios de fogo e areia faziam remissão à natureza. As pessoas estão sob pressão e suas reações à mídia precisam de um significado para aquele momento, afinal o tempo é momento mais importante das suas vidas. O Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho) fez o que fez na Rede Globo porque é um designer do tempo. Aprendi muito com ele os significados de dialogar com as pessoas no seu tempo, mas com fluidez e beleza”, esclarece Donner.

Divulgação
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O projeto da Timedia não se resume aos modelos clássicos de mídia exterior. O plano de Donner é criar instalações em forma de esculturas para decorar cidades do mundo inteiro. Todas elas vão abrigar seu relógio conceitual, que abre mão dos ponteiros clássicos para propor um giro circular digital. Ele tem estudos para cidades como Casablanca, no Marrocos; Doha, no Catar; e São Paulo. “As esculturas se ambientam à linguagem da cidade, portanto, sem invadir seus valores. Como parte da paisagem, elas vão ter um ponto para o relógio e para a exibição de publicidade. Tenho tido reuniões com autoridades de vários países e a receptividade é enorme. É um projeto global sobre o tempo e seu aproveitamento lúdico”, diz o designer.

Donner também contempla os aspectos antropológicos na sua ilação sobre o tempo. Ele recorreu aos personagens da mitologia grega Chronos e Kayros. Ele explica: “Chronos é a personificação do tempo, aquele que tudo devora e ao mesmo tempo gera. Chronos deu origem à palavra cronômetro do relógio, que regulamenta o tempo. Já Kayros, filho mais jovem de Zeus, não seguia o tempo de Chronos. Vivia nu, com asas nos ombros e tornozelos. Só podia ser agarrado pelos cabelos e possuía cabelos apenas em uma mecha sobre a testa. Tal representação significa que a oportunidade de agarrá-lo é única, e, uma vez tendo passado, é impossível alcançá-lo. Assim como as oportunidades da vida”, ele finaliza.