Sucesso é bom, mas mata, também. 

Depois de chegar lá, não há mais para onde ir. Para cima, claro. Para baixo as oportunidades e possibilidades são infinitas. E assim, os que chegam lá, comemoram. E, no dia seguinte, sofrem, angustiam-se e muitos mergulham em depressão. Alguns se matam. O dia a dia de um chefe de cozinha é carregado de preocupações, dúvidas e necessidade de tomar decisões. Trabalha antes, no intervalo e no depois. E na hora do show, almoços e jantares, precisa estar elegante, sorridente, acolhedor, por, no mínimo, três horas.

Suicidar-se é uma circunstância na vida das pessoas. Na dos chefes de cozinha não chega a ser recorrência, mas uma possibilidade que jamais pode ser ignorada. Nos últimos dez anos dez chefes de cozinha famosos optaram pelo suicídio. E outra centena não tão famosa, também.

Marcus Peter Volke – Austrália,
Tony Robijns – Bélgica,
Tu Yuangao – China,
Richard Brown – Estados Unidos,
Grant Gordon – Estados Unidos,
Anthony Sedlak – Canadá,
Homaro Cantu – Estados Unidos,
Josh Marks – Estados Unidos,
Joseph Cerniglia – Estados Unidos,
Benoît Violier – França.

E neste ano de 2018, o 11º suicídio que sensibilizou milhões de pessoas em todo o mundo. O do chef e celebridade Anthony Bourdain.

Entre todos os suicídios, sobre o qual escrevi um artigo, o de Bernard Loiseau, no dia 24 de fevereiro de 2003, que, diante da perspectiva de perder uma de suas três estrelas do Guia Gault & Millau, preferiu matar-se antes.

E, dias depois, ao sair o guia, o Le Côte Dór permanecia com as mesmas três estrelas. Não resistiu aos boatos e matou-se antes da não confirmação. Talvez o primeiro de muitos suicídios decorrentes de “fake news”.

No dia seguinte ao suicídio de Loiseau, o “pai e mentor profissional de todos eles”, que por sinal morreu no início deste ano de morte natural, Paul Bocuse, disparou: “Parabéns, Gault Millau, vocês ganharam. A sua apreciação custou a vida de um homem. Não podemos mais deixar nos manipular assim. Eu te dou uma estrela, eu te tomo uma estrela, eu te dou um ponto, eu te tiro um ponto. Os críticos são como os eunucos. Eles sabem, mas não podem”.

A novidade agora é chefes de cozinha consagrados devolvendo as condecorações e pedindo para serem excluídos de qualquer avaliação. No início deste 2018, Sébastien Bras convocou a imprensa para informar a todos que tinha, não obstante suas três estrelas do Michelin, jogado a toalha. Disse, em ótimo francês: “Tô fora! Chega, não quero mais!” Se a onda pegar, o que farão os guias e os críticos?

Na carta em que explica sua decisão, Bras diz: “Talvez, a partir de agora, eu perca notoriedade. Mas, vou me sentir livre, sem ficar me perguntando se minhas criações agradam ou não os inspetores do Michelin… Somos inspecionados de duas a três vezes por ano. Não sabemos quando. Cada prato que sai pode ser inspecionado. A cada dia servimos 500 pratos. Se errarmos num único e aquele for o do inspetor…”.

Difícil esquecer Bernard Loiseau, nem mesmo Fernando Adriá, o melhor do mundo, que decidiu fechar seu restaurante por não suportar mais a pressão. E vale para tudo na vida. Empresários e profissionais. O que estamos fazendo na terra? Viemos aqui, para quê?

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