Leio surpreso que os executivos da Vale contam com um seguro reputação. É um seguro para proteger os bens dos executivos de atos e decisões no exercício das suas funções. E não é pequeno: US$ 150 milhões! E talvez eles precisarão mesmo lançar mão de tal seguro. Mas e a reputação da empresa? Esta não há seguro que dê jeito fácil.

Como justificar minimamente um novo desastre depois da comoção de Mariana? Este agora, de Brumadinho, é ainda mais impactante, por ter provocado um grande número de mortes, além do desastre ambiental. Como cuidar da imagem de uma empresa submetida a um impacto desses?

Ninguém nega a excelência da empresa no seu setor, uma das maiores do mundo, a terceira empresa brasileira. Mas o povo faz um linchamento moral. Totalmente justificável! Embora, de cabeça fria, seja difícil acreditar que houve enganação deliberada. Eles não seriam loucos de negligenciar. Não depois do desastre de Mariana.

Segundo informações de bastidores, o próprio presidente se autointitulava “Mariana nunca mais”. Mas aconteceu. A empresa não escapará de um prejuízo enorme, financeiro e moral. Leio também que um publicitário de peso foi contatado para trabalhar a imagem da Vale nessa crise. Conseguirá?

A empresa está fazendo tudo como deve ser. Expôs seu presidente, que deu sua cara para bater, bem no calor do desastre. Tem praticado ações paliativas cabíveis, ajudando financeiramente as famílias de vítimas e cedendo recursos de grande monta para a cidade de Brumadinho, até que se julguem sanções mais contundentes. E tem comunicado essas ações de forma correta.

Antes de continuar, quero deixar claro que não minimizo – nem um pouco – a culpa da empresa. O que estou tentando fazer aqui, neste texto, é uma análise fria de gestão de reputação perante fatos dessa magnitude.

Qualquer peça de comunicação dessa empresa será objeto de – no mínimo – um julgamento rigoroso de quem é submetido a ela. Como trabalhar nesse clima de crise? É coisa pra especialistas. Lembro-me bem do derramamento de óleo de um navio da Exxon (o texto a seguir foi baseado em matéria de O Globo). Num dos maiores acidentes ambientais da história, um vazamento de 36 mil toneladas de petróleo poluiu 1.800 km de praias, matando animais e provocando comoção mundial.

Bombardeada pelos ecologistas e pressionada pela opinião pública mundial – comovida com as imagens de pássaros, lontras e baleias mortos no meio do óleo – a Exxon mobilizou um exército de 11 mil homens para a inédita operação de limpeza.

Equipou-os com 1.400 barcos, 85 aviões e recursos como bombas de sucção e bactérias devoradoras de petróleo. Biólogos limpavam as penas de pássaro por pássaro, lontras eram alimentadas com lagostas frescas, cada pedra de cada praia era meticulosamente lavada e esfregada.

O trabalho levou seis meses e custou US$ 1 bilhão. Isso em 1989! 30 anos atrás! De lá para cá, a empresa se fundiu com a Mobil, criando o ExxonMobil, um dos maiores grupos do mundo, continuando sua operação lucrativa. No momento em que escrevo este artigo, vejo que as ações da Vale até subiram um pouco, depois de uma queda de mais de 20%. O prejuízo financeiro será enorme, mas a empresa tem porte e saúde financeira para suportar e sobreviver.

Mas o que nos resta analisar é com que reputação a empresa sairá desse evento terrível. A tal Geração Z é formada por pessoas muito mais críticas com a atitude das empresas. Esses jovens escolhem criteriosamente os produtos que vão consumir ou as empresas em que trabalharão, tendo como base a sua reputação e autenticidade.

Por muito menos, empresas são preteridas, no momento de escolha desse público. Daí a minha preocupação com o desenlace desse fato que será lembrado para sempre como uma das maiores tragédias brasileiras.

A nós, só nos resta cobrar uma mobilização exemplar para minimizar a dor dos que perderam seus entes e o impacto ambiental decorrente dessa tragédia. E, como profissionais de comunicação, acompanhar a estratégia de resgate de imagem da megaempresa.

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda) (alexis@fenapro.org.br)