Mais um Dia Internacional da Mulher se passou, com algumas novidades e as ladainhas de sempre: mulheres reclamando que não precisam de homenagens, outras achando bacana ter um dia para chamar de seu, um sem-número de pesquisas apontando as mesmas tendências e preferências do público feminino, a vida seguindo na corrida rotina de sempre. Entre as marcas, o que se viu foram investimentos mais estruturados de grandes empresas anunciantes, no lugar do predomínio de mensagens de ONGs ou associações. De certa forma, muitas parecem ter percebido que “agora é pra valer”. O que me intriga é se a abordagem mais séria do tema se limitará ao brilhantismo das ações de comunicação ou se, de fato, faz parte de uma agenda de transformação real – que passa, por exemplo, pelo ambiente de trabalho, pelas ações no mundo real como reflexo de uma (nova) visão de mundo.

Chamou a atenção, mundialmente, uma menina de bronze posicionada, desafiadoramente, de frente para o emblemático Charging Bull, o touro de Wall Street. A ação Fearless Girl foi criada pela McCann de Nova York para a empresa de investimentos State Street Global Advisors, convocando as mais de 3.500 empresas que ela assessora a ampliarem o número de mulheres em seus boards corporativos. Uma belíssima ideia, de fortíssima repercussão, inspirada no tema central escolhido pela ONU para o Dia Internacional da Mulher: o papel da mulher no novo mundo do trabalho.

A desigualdade de gênero no mundo dos negócios é apenas uma das abordagens da temática feminina e passa por muitos aspectos, desde a preferência pela contratação de homens ao assédio de colegas, os salários mais baixos, o preconceito velado. Entre as 23 executivas entrevistadas na edição especial do PROPMARK dedicada à mulher, apenas seis afirmaram nunca terem sofrido algum problema significativo no trabalho por serem mulheres. Sendo que essas poucas me pareceram ter escolhido deixar de lado aqueles assédios de menor monta, mais corriqueiros, aquelas pequenas agressões que todas nós, de uma forma ou de outra, sofremos ao longo da vida.

No Brasil, a marca Skol (leia-se F/Nazca S&S) se dispôs a romper oficialmente com seu passado afirmando, diante de antigos pôsteres da marca que exibiam mulheres gostosas: “O mundo evoluiu e isso não nos representa mais”. Desconstruir estereótipos simbolicamente ao convidar artistas para recriar os pôsteres foi uma boa ideia num dos segmentos de anunciantes que mais desrespeitaram as mulheres ao longo da sua história.

Grandes marcas possuem o poder de levantar bandeiras, discussões e influenciar o mundo. Podem e devem usá-lo.

Torço para que a escultura de Kristen Visbal, inspirada nas filhas de amigas, se torne um novo ícone na cidade de Nova York, representando o meu desejo particular de que, ao contrário de mim, a minha filha possa crescer sem (tanto) medo. Porque por mais que as novas ou velhas feministas ou as machistas de plantão discutam, argumentem, a verdade inconveniente é que as mulheres passam pela vida administrando medos demais, e só nós sabemos o quanto diversos deles nos congelaram e nos impediram (ou ainda impedem) de fazer o que realmente queremos. É injusto e é real. Não é brincadeira, não é jogo de palavras. Por isso a desigualdade de gênero precisa sair definitivamente do território do discurso vazio e do oportunismo para o da transformação e da ação.