Divulgação

Dizem os chegados à psicanálise que a maior angústia do homem é ficar broxa. Tenho, diante dessa afirmativa, uma permanente atitude de desdém. Evidentemente não é porque não temo ficar broxa. É que tenho outros medos também. Por exemplo: não ter assunto para escrever uma crônica. Ou não ocorrer uma ideia para criar uma campanha, um anúncio, um filme.

No caso da broxura, há desculpas: o stress, a Dilma, saudade da mãe, alguma coisa que comi. Mas nos angustiantes momentos que antecedem a hora de entregar um artigo, nos terríveis momentos que o prazo para apresentação de um trabalho de criação está se esgotando, não dá para simplesmente inventar uma desculpa ou afirmar com a maior segurança que jamais tinha acontecido algo assim anteriormente.

Broxar nessas horas, isto é, não encontrar um bom assunto ou não conseguir atinar com uma boa ideia, é como não conseguir uma ereção num palco de show pornográfico. É a broxada pública, inapelável, definitiva.

Lembro-me até hoje da noite que eu e o Zé Guilherme tínhamos de criar um comercial para a Veja e tinha um prazo curtíssimo, pois o Sabino (o cliente) iria viajar.

O briefing era mais ou menos simples: estávamos em plena crise do governo Collor e a Veja era a revista que melhor mostrava o que estava acontecendo no Brasil daqueles tempos.

Veja era a revista mais esperada, mais lida, mais necessária. Veja era indispensável (slogan que perdura até hoje).  Pois naquela noite, Zé Guilherme e eu, quase loucos de desespero, não conseguíamos chegar a conclusão alguma. 

Tudo que nos ocorria parecia muito simples, banal, esquemático, incapaz de emocionar. As horas iam passando e a porra da ideia não surgia. A gente passou por mais de 30 roteiros. Nada prestava ou parecia prestar. 

Nessa hora o humor se vai, aparece um suor esquisito, as mãos tremem. Juro. Dá vontade de chorar. Mais ainda: dá uma puta vontade de morrer. Faltavam minutos para o prazo acabar. Literalmente. Em cima da hora final tivemos o primeiro fio de ideia.

Aos gritos, fomos arrumando a estrutura do filme, dando-lhe as necessárias doses de informação, ritmo, essas coisas. Acabei contando o roteiro pelo telefone, de memória, pois não tinha havido tempo nem de começar a passá-lo para o papel.

Fomos salvos no último segundo, quase um milagre do santo padroeiro dos criadores em crise de impotência, um provável Santo Antônio do pau mole. O resto foi quase só orgasmo.

O Olivier Perroi e a Isabelle Tanuri melhoraram ainda mais a ideia, ganhamos um Colunistas, o Leão em Cannes, os Profissionais do Ano etecetera, etecetera e tal. Mas eu jamais vou esquecer aquelas horas de impotência inapelável.

A certeza de ter escolhido a profissão errada. Graças a Deus tudo desaparece quando vem a ideia salvadora. Tudo é paz no final, seja após o sexo, o comercial criado ou a crônica feita. Depois vem aquela sensação que os psicanalistas chamam de tédio pós-coito. A vida pode ser boa.

Lula Vieira é sócio da Mesa Consultoria