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Tinha sete anos. Minha mãe me mandou dar um pulinho no Bar King, na cidade de Bauru, comprar leite. Perguntou: “está levando o litro vazio?”. Respondi que não. “Então leve. Caso contrário, terá de fazer duas viagens…”

Não acreditei. Na minha cabeça não fazia o menor sentido levar litro vazio e trocar, pagando pelo leite, por um novo e cheio. Tinha certeza que “seo” Manoel, que me conhecia e acreditava em mim, me entregaria o litro de leite em confiança que eu o levaria para casa, esvaziaria o leite no meu litro de leite e depois voltaria para devolver o litro de leite dele. Saindo do Bar King, perguntei se poderia ter levado o litro vazio e trocado pelo cheio ainda que não na minha embalagem e “seo” Manoel sorrindo, disse, “claro que sim, Chiquinho…”. Aprendi, naquele momento, que existem algumas ou muitas coisas retornáveis na vida. Ainda que não sejam exatamente as mesmas. Infelizmente, muitas outras, não retornam jamais.

Durante décadas compraram-se e venderam-se cervejas, refrigerantes, leite e outros produtos em embalagens retornáveis. Mas aos poucos, com o progresso, prevaleceram os descartáveis e o mundo chega, agora, ao limite da poluição, da degradação. Volta e meia alguém tenta retornar com as retornáveis, mas em pouco tempo a tentativa é descartada e a poluição segue o curso em direção ao fim do mundo.

Elon Musk, o maior dos “malucos” da atualidade, que dentre outros feitos hoje ocupa o trono que pertenceu a Steve Jobs como rei da criação (mais que Jobs mesmo, porque Jobs estava mais para inovação do que criação), tenta, de forma desesperada e lancinante, colocar em pé uma de suas muitas empresas, a SpaceX, e liderar o novo negócio de viagens espaciais. Para tanto, condição essencial de viabilidade econômica, precisa conquistar a retornabilidade de seus foguetes.

Até este momento da história da conquista espacial, foguetes inserem-se no território dos descartáveis. Todos os investimentos são consumidos numa única viagem. Não são retornáveis. Musk, com poucos êxitos e muitos fracassos, vem tentando superar esse desafio. Até agora, o placar é francamente desfavorável. Em cada cinco tentativas de fazer o foguete retornar em perfeitas condições de reaproveitamento, apenas uma deu certo. Nas outras quatro, os foguetes espatifaram-se e o investimento foi para o saco. Se retornáveis, assim como os automóveis, a única despesa é a do reabastecimento. Não se precisa de um carro novo cada vez que saímos de casa…

De qualquer maneira, a corrida pela conquista comercial do espaço — negócios e turismo — é das mais estimulantes e inspiradoras. Além do “maluco” Musk, outros dois “malucos” estão na raia. Jeff Bezos, senhor Amazon, com a sua Blue Origin, e Richard Branson, senhor Virgin, com a sua Virgin Galactic.

A busca pela retornabilidade, claro, não é exclusiva de Musk. Seus dois “malucos” concorrentes correm freneticamente atrás dessa conquista. Há semanas, mais especificamente no dia 22 de janeiro, Bezos — e sua Blue Origin — conseguiu fazer com que um de seus foguetes decolasse e retornasse à base por duas vezes consecutivas. Comemorou!

Já Branson acredita em outro formato. Também há semanas, no Fórum Econômico Mundial, defendeu sua alternativa — um ônibus espacial que pousa como um avião. Na conferência, disse: “A nossa nave nos dá a possibilidade de fazer viagens espaciais ponto a ponto; a deles, não!”.

Assim caminhamos em direção ao Admirável Mundo Novo. Onde a componente retornável volta a ter singular importância. Não necessariamente para tudo, mas para algumas coisas e/ou determinadas empreitadas.

Mesmo porque, nesse Mundo Novo, uma de suas principais características será o compartilhamento. Em que não seremos nem donos, nem proprietários. Em 90% das situações, seremos exclusivamente usuários. E assim não teremos de retornar o que não saberemos quando e se vamos precisar de novo. Chegar, pagar, pegar, usar, largar. E ir embora lindo, leve e solto. Quase como chegamos ao mundo. E como um dia vamos partir.

Francisco A. Madia de Souza é consultor de marketing, sócio e presidente da MadiaMundoMarketing