Vocês não podem imaginar a quantidade de e-mails que recebi a respeito de minha coluna da semana passada. A grande maioria me acusando (gentilmente, porque meus leitores são gente fina) de esquecimentos no rol dos melhores redatores. Acabei compondo uma resposta padrão que lembrava que eu relacionei os redatores que trabalharam comigo, e, ainda assim, citei apenas alguns. O impressionante foi a quantidade de pessoas que escreveram sobre a minha injustiça de não ter citado Neil Ferreira, inclusive o próprio Pedro Galvão, este sim citado, que lá na minha casa reclamou dessa ausência. Volto a dizer, não era uma lista dos melhores redatores da propaganda brasileira, mas apenas alguns que eu me lembrava e tinham sido meus colegas de trabalho.

Por falar no ofício, meu primeiro emprego como redator de propaganda foi numa agência paulista chamada Silvestre Publicidade, do Grécio e do Oston Silvestre, na Major Sertório. A agência era especialista em anúncios classificados e eu devo ter sido o primeiro datilógrafo com “redação própria” da história da empresa. Meus colegas, de fone de ouvido e diante de velhas Olivettis, recebiam por telefone os ditados dos clientes para as centenas de anúncios classificados que chegavam o dia inteiro para que a agência enviasse ao Estadão, à Folha ou ao Diário Popular. Uma verdadeira máquina de fazer dinheiro.

Eram 20% de comissão a cada telefonema, sem desconto, sem leiaute, sem pesquisa e sem discussão. Daria minha vida para ser dono de uma empresa daquela. Sem contar que o preço do classificado era proporcionalmente caríssimo. O líder nos classificados era o Estadão, que nos domingos chegava a ter 500 páginas. E o Estadão tinha o maior orgulho em tratar os anunciantes a ferro e fogo. Digo mais: os anunciantes tinham o maior orgulho de serem tratados olimpicamente pelo jornal. Tenho guardado até hoje uma entrevista com o diretor-comercial do Estadão, José Maria Homem de Montes, publicada na Revista Propaganda, em que ele dizia que o jornal não possuía representantes comerciais (“contatos” no jargão da época), simplesmente porque “nada havia para se discutir entre o departamento comercial e as agências e anunciantes que já não estivesse impresso nas tabelas de preço”. Cada vez que eu leio me arrepio de emoção.

Havia um ponto curioso na tal tabela. Era um preço diferenciado para anúncios em língua estrangeira. Eu nunca entendi por que ficava mais caro imprimir e distribuir algo em outra língua que não fosse a portuguesa. Contaram-me que era porque anúncio em língua estrangeira tinha de ser enviado a tradutores especializados. Tudo para que não se repetisse o caso de um anúncio que ficou famoso. Foi assim.

Um empregado de uma multinacional foi despedido e sua última tarefa foi escrever um anúncio procurando alguém para ser seu sucessor. O cara então escreveu esta pérola: “Copywriter. Multinational is looking for a copywriter fluent in English. Ableto write letters, memos, ads. Excelent salary. 5 days week. Candidate will have to leal whith a bossthatis a mother fuckersonof a bitch. Ignorant, badmanners, vicious lierandis constantly farting. If you really need money write to this paper. Do it in Portuguese because the asshole doesn’t know a word of English. Letters to Shit Job care of this paper.”

A tradução mais ou menos livre: Título: “Redator”. Texto: “Multinacional procura um redator com inglês fluente. Capaz de redigir cartas, memorandos, anúncios. Excelente salário. Semana de 5 dias. O candidato terá de lidar com um chefe que é escroto e filho da puta, ignorante, mal-educado, mentiroso compulsivo e que peida constantemente. Se você realmente precisa de dinheiro, inscreva-se. Faça isto em português porque o babaca não conhece uma palavra em inglês. Cartas para Emprego de Merda, aos cuidados deste jornal.”

Em tempo: minha função, na altíssima categoria de possuidor de redação própria, era acudir os clientes que eventualmente não conseguissem escrever um classificado. Melhor começo impossível. Desde o primeiro dia aprendi que anúncio serve para dar resultado. Aliás, o tal classificado em inglês provocou uma verdadeira enxurrada de propostas. Assim é a vida.

Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira@grupomesa.com.br)