Por: Carlos Castelo

 

Devia ser mil novecentos e noventa e alguma coisa. Estávamos todos, como sempre, em silêncio bolando as campanhas do quinto andar da DPZ. Ao lado da sala do Petit permanecia, há vários dias, uma mesa de fórmica branca vazia. Talvez fosse uma nova secretária que iria sentar-se ali, pensávamos.

Só que pelo meio daquela tarde indolente, o Pichô, nosso homem de tecnologia, colocou sobre ela um computador, o primeiro que vi numa agência de propaganda na vida.

Não era nada estratosférico, confesso. Na real era um dos primeiros Apple Macintosh, o icônico Classic, aquele que se parecia com um caixotinho.

Enquanto ele instalava a máquina formou-se uma tímida multidão em volta do artefato. Todos queriam saber como aquilo contribuiria com um departamento de criação que até então trabalhava à base de olivettis, remingtons e ibm’s elétricas (no caso dos diretores de área).

Petit achegou-se à turba e conceituou:

– Estacomputadora (sic) não é nada mais do que um lápis. Sem o criativo, não presta pra nada!

Depois do “statement” do chefe ainda ficamos por ali mirando intrigados aquela “coisa” e logo houve a dispersão para os jobs de sempre.

Depois de alguns meses decidi comprar meu Classic próprio e o levei para a agência. 

Foi outro grande evento. Por algumas semanas passei a figurar como um dos redatores mais antenados da América Latina. Até o Petit promoveu um elogio público à minha pessoa na frente dos colegas:

– O mundo precisa de visionários, como Ferdinand Porsche, Picabia, Miró e você, menino!

Devo ter ficado com o Classic por um ano. Vendi o bichinho para o Renato Konrath. Ele o adotou por um período , mas a relíquia acabou sendo confiscada num posto da Polícia Federal em Vacaria, no Rio Grande do Sul. Parece que por falta de nota fiscal.

Já na Talent decidi que era o momento da propaganda ter um profissional com um laptop. O meu era um todo preto, com design arrojado para a época. Dessa vez foi Júlio Ribeiro quem se manifestou:

– Vai trabalhar com isto aqui na agência? – ele quis saber.

– Sim, pensei em usá-lo pra criar, tudo bem? – respondi meio temeroso de estar quebrando algum preceito da empresa.

– Acho ótimo – afirmou Ribeiro – só que vamos fazer um seguro pra ele, é valioso demais pra deixar assim em cima da mesa.

Desde aquela tarde modorrenta na DPZ tudo mudou. Aconteceu essa espécie de primavera árabe no fazer publicitário. Os diretores de arte da velha guarda tiveram que trabalhar com um assistente que soubesse manipular os Mac, outros mais ortodoxos foram defenestrados.

Mas a Ideia, essa continua sendo o traço que saia do lápis do Petit.