Roberts, ceo global da Saatchi & Saatchi

 

Ceo mundial da Saatchi & Saatchi, Kevin Roberts esteve no Brasil na semana passada para o encontro mundial de criativos da rede de agências em São Paulo e aproveitou para fazer uma palestra para um dos seus principais clientes no país, a Petrobras. Roberts, autor do famoso livro “Lovemarks – o futuro das marcas”, falou no auditório da sede da companhia, no Rio de Janeiro. Ele abordou seu conceito sobre marcas que apaixonam pelo viés da necessidade de a marca tornar-se uma love brand (marca amada) de alcance internacional. “Esse é o desafio dos próximos cinco anos para a Petrobras”, disse Roberts. Para ele, há muito ‘politicamente correto’ e a recessão tornou o mundo mais chato. “Dane-se a recessão, vamos superá-la, vamos ser mais otimistas e reconquistar a criatividade. É através dela que vamos vencer”, garante. Para ele, que chama o Brasil de lovemark, o futuro do país é o que há de mais excitante no momento, confessando-se cansado da China, da Índia e da Rússia, que juntos com o Brasil e a África do Sul formam o Brics.

A era digital mudou a relação das pessoas com as marcas?
Totalmente. As pessoas estão completamente no controle de suas próprias escolhas, porque têm conectividade, informação, acesso e a habilidade de se envolverem e com um poder que nunca possuíram na história. Isso inclui política, criatividade – e compras! Nós interagimos com marcas, ajudamos a construí-las e temos o poder de insistir em elevar o nível do design, da qualidade, da entrega, do serviço, do valor. Houve uma grande e massiva transferência de poder ao longo das últimas três décadas dos produtores para os varejistas e para os consumidores. Hoje as pessoas não estão simplesmente perguntando “qual é o melhor preço”, mas “Como isso vai melhorar a minha vida?”. Chamamos isso de valor inafiançável, e é uma das grandes transformações no marketing.

Qual é o maior desafio para as marcas nesse novo cenário das redes sociais, onde cada pequeno movimento é percebido e acompanhado?
O desafio para as marcas é ter uma ideia-chave baseada em engajamento emocional. Todos os fatores racionais foram aprimorados por terninhos lustrados com seus diplomas de MBA debaixo do braço, são meras apostas. O que as pessoas querem é honestidade, autenticidade e diversão, alegria. Esse é o território das pessoas criativas, e é o porquê de existirmos, da F/Nazca Saatchi & Saatchi existir. Como na famosa música do The Police de Sting, em que ele diz “Every move you make, every step you take, I’ll be watching you” (Cada movimento que você fizer, cada passo que você der, estarei observando você), as marcas precisam se guiar pelo que eu costumo chamar de “A era do agora” (The Age of Now). O novo já é tarde demais. O futuro parou quando chegamos ao ano 2000. As pessoas estão vivendo o momento, é quando as pessoas estão mais felizes. As marcas precisam ter ideias centrais muito fortes para se manterem atuais, frescas e relevantes nas mãos das pessoas. Os gerentes de marcas são donos de marcas, sem dúvida. Mas as verdadeiras lovemarks (marcas apaixonantes) pertencem às pessoas que as amam, e não aos gerentes. Os desafios para as marcas são parcialmente técnicos, mas na essência são emocionais – atingindo o tom ideal, criando empatia e sendo reativas, tornando-se contadoras de histórias (storytellers), provocando mistério, sensualidade e intimidade.

O que é exatamente uma lovebrand hoje em dia e como seu conceito mudou ao longo do tempo?
Chamo de lovebrand a “loyalty beyond reason”, ou seja, a marca que merece fidelidade que vai além do racional, da lógica. Supera o preço, a recessão, a chamada “peer pressure”, a pressão social e influência dos conhecidos, dos amigos. As lovemarks possuem altíssimos índices de preferência de compra e de repetição. Você se surpreenderia com o amor com que as pessoas se referem a escadas portáteis, molduras de janelas, motoserras. No site lovemarks.com há mais 20 mil histórias de consumidores sobre marcas amadas. O tema fica aberto não só para quem quer pesquisar o assunto como também contar sua própria história de amor por uma marca. Como o conceito se transformou ao longo do tempo? Acredito que o conceito lovemark e suas bases que introduzimos em 2000 mantiveram – se sólidos como pedra na teoria. Desde o início a Apple era uma lovemark leader – antes do iPod e do iPad, diga-se de passagem. O livro “Lovemarks” descreve completamente a jornada da Apple de se tornar a empresa mais valiosa do mundo. Portanto, tenho confiança na teoria e na prática. É uma ideia aberta, e suas aplicações têm sido inúmeras. “Lovemarks” foi acolhido em grandes ambientes corporativos como também por donos de pequenos negócios, cidades e regiões, até mesmo pequenas livrarias locais. Uma diferença tangencial é que ao invés de blogar a respeito de “Lovemarks”, as pessoas estão tweetando.

Você acredita que as marcas devem falar sobre sustentabilidade? Como?
Sim, com certeza. É um elemento-chave para responder à pergunta: “Como você vai melhorar a minha vida”. Se você tem péssimos índices de produção de carbono, será julgado à altura. Não é possível se esconder na “Era do Agora”. A internet trouxe à tona a transparência. As pessoas precisam se preocupar, estar atentas e ter uma série de práticas pessoais relativas à sustentabilidade. Chamo isso de DOT – Do One Thing (Faça uma coisa), e depois outra, e depois outra. Definimos sustentabilidade como algo que interage com elementos na economia, no meio ambiente, na cultura, no social. As marcas precisam estar ligadas a essas quatro vertentes/fronts, contribuindo para uma sociedade melhor. Eu acredito que o papel e a missão de qualquer negócio é fazer do mundo um lugar melhor, e se todas as empresas acreditarem nisso, então a sustentabilidade estará instalada, espalhada, ao contrário do que acontece hoje, em que a maioria de nós se utiliza de mais recursos naturais do que o mundo é capaz de fornecer. O consumismo exige um bocado de água na produção da comida e petróleo na produção de materiais. Encontrar o equilíbrio entre a necessidade por recursos da natureza e a evolução da sociedade como um todo, tendo a certeza de que não estamos nos utilizando dos recursos de maneira irresponsável e pouco eficiente, é uma equação na qual as marcas estão envolvidas até o pescoço neste momento.

Quais são os maiores erros cometidos pelas marcas para se conectar com consumidores?
Informação demais. Não escutar e perceber o clima, o astral, os humores. Não se colocar no lugar do consumidor, enxergar com seus olhos. Não dar mais do que recebem. Não gerar alegria.

E qual é o papel da propaganda nisso tudo?
Nosso papel não mudou. É nosso sonho aspiracional escrito há 15 anos, é revisado anualmente e as pessoas costumam dizer “Sim, ainda está correto”. É ser uma hothouse para ideias criativas capazes de modificar o mundo, que transformam nossos negócios, marcas e a reputação dos nossos clientes. Esse é nosso papel. No dia a dia, estamos trabalhando com todas as formas de comunicação imagináveis. Acabamos de reunir nossos 80 melhores cases de clientes em 2011 em toda a rede e ficamos mais surpresos do que esperávamos com a quantidade de material digital e de redes sociais. Facebook, Twitter, aplicativos, games e YouTube estão fortemente presentes em todas as campanhas. Algumas ideias giram unicamente ao redor dessas mídias. Amamos o grande filme publicitário que sempre teve um papel importantíssimo na TV, mas hoje o que se percebe é que as estratégias se baseiam em uma sequência contínua de pequenas ideias, que interagem com as pessoas. Fracasse rápido, aprenda rápido, conserte rápido, esse é o jeito de fazer as coisas hoje.

Qual é o papel ideal da agência de publicidade em relação aos seus clientes?
O de ser um parceiro respeitado e amado. O de conquistar excelentes resultados comerciais. Vencer pela criatividade.

Quão tecnológico é você? Qual é a sua relação com a internet e os devices de última geração?
Tenho m iPhone, um iPad, um iPod. Uso o fax pelo mundo, é high touch. Lancei um site em 1997, um blog em 2007, posto nele quatro vezes por semana e envio uma pequena newsletter a oito mil pessoas de mais de 60 países. Uso Skype e videoconferência. Eu não tuíto, há tantas coisas acontecendo e que devo administrar como ceo que tuítar é a última coisa que gostaria de incluir na minha rotina diária, mas tuítamos no Lovemarks.com e temos um Facebook do LovemarksCampus. Mas na maioria das vezes uso minha Mont Blanc para escrever comentários em centenas de documentos que chegam às minhas mãos. A Mont Blanc é uma das minhas lovemarks. Assim como o PDF.

Você concorda com Zygmund Bauman (sociólogo polonês) que chegamos a um limite do consumismo? Qual é o papel da propaganda neste cenário?
Sou um otimista radical e sempre acreditarei que existe uma maneira melhor de enxergar as coisas. Cientistas estão dizendo que o ser humano deve durar mais uns 200 anos até que a água acabe. Dez bilhões de pessoas são capazes de devastar os recursos naturais. Não acredito que chegamos a limites, no entanto é necessário que aconteça, diariamente, um enorme esforço educativo, de inovação e evolução no mundo. A propaganda precisa participar disso e promover produtos que tenham um papel do bem – voltando à questão crucial: “Como esta marca vai melhorar a minha vida?”.

A Saatchi é uma lovebrand?
Isso deve ser respondido pelas pessoas que fazem parte do nosso time e por nossos clientes. O amor não pode ser comandado. É preciso inspirá-lo, buscá-lo, oferecê-lo, perguntar por ele. Acabamos de completar 40 anos e somos competitivos, apaixonados, incansáveis. Encorajamos nossos colaboradores a serem como forças irresistíveis da natureza. Se essas qualidades nos trouxerem amor, então encontramos os parceiros ideais.