Não canso de me surpreender como as pessoas aderem facilmente a modismos, comprando novas verdades impetuosamente, com muito pouco espírito crítico e questionamento. A quantidade de ondas que surgiu como sendo verdadeira revolução e simplesmente se quebrou na praia, transformando-se em espuma, é impressionante.

Aliás, a imagem é essa mesma: de repente surge uma onda que vai ganhando massa, altura e velocidade, todos os que estão dentro da água ficam completamente enlouquecidos pela necessidade de surfar nessa onda, até que ela perde sua força e todos voltam a boiar esperando que apróxima apareça no horizonte.

 

Parte desse comportamento se explica pela necessidade que temos de nos conectar ao novo, pela necessidade de alimentar nosso sentimento de modernidade. No entanto, na maior parte das vezes, as pessoas simplesmente se deixam levar pela opinião de seus pares em um efeito manada – afinal, se todo mundo está pegando a onda, não dá para ficar de fora.

 

Esse fenômeno quase sempre se inicia com alguém que é considerado o “cara da hora”, que lança um novo conceito. Em seguida, temos os oportunistas, aqueles que identificam que podem ganhar disseminando o conceito. Por fim, há os que adotam o novo conceito como se fosse uma revelação divina. Vejam, a tríade é composta pelo guru, pelo aproveitador e pelo incauto.

 

Uma das ondas mais recentes surgidas no nosso horizonte é a de startups como agentes de revitalização de segmentos de negócios e empresas. As startups funcionariam como um anticorpo às obsolescências que, uma vez implantado no organismo das empresas, teria o poder de rejuvenescê-las. Essa mágica tem hipnotizado profissionais e empresas de praticamente todos os segmentos de negócios, que acreditam que gerar inovação e se manter atual só é viável trazendo de fora uma startup para oxigenar estruturas consolidadas.

 

Na minha avaliação, essa é mais uma daquelas novas verdades que as pessoas assimilam sem uma ponderação mais profunda, sem uma reflexão sólida. Nos últimos meses, tenho sido bombardeado por artigos, resenhas de livros e convites para seminários e organização de workshops a respeito de startups como caminho para a inovação, uma ponte para continuar existindo no futuro.

 

Mais uma vez, identifico aí a tríade: gurus, gente querendo tirar algum tipo de vantagem e uma legião de incautos ávidos por surfar nessa onda. Como seria bom se as coisas ocorressem de maneira tão simplista: bastaria fazer um enxerto na empresa para ela se transformar em um vulcão de inovações emodernidade.

 

Quem tem de tocar um negócio e já está nessa vida há tempos sabe muito bem que é preciso estar sempre aberto a novos conceitos, mas que também não deve se encantar facilmente pelo modismo do ano. Quando penso na definição de startup, me recuso a aceitar que são aquelas empresas recém-nascidas rompendo paradigmas e negando os modelos de negócios vigentes, uma espécie de subversivos do establishment.

 

Na minha definição, startup é toda empresa que, seja pela sua personalidade ou pelas circunstâncias, precisa nascer novamente todos os dias. Na empresa na qual tenho o prazer e orgulho de trabalhar, começamos o dia de um jeito e vamos pra casa de outro. Costumo dizer que inauguramos uma nova agência todos os dias.

 

O ambiente, em constante mudança, obriga você a se manter igualmente em permanente estado de mudança. Clientes compram outras empresas, se fundem, mudam seus presidentes, trocam seus CMOs, entram em novos mercados. Pessoas que trabalham na agência deixam o time, outras pessoas chegam, a mistura fica diferente. A legislação muda; o que podia antes já não pode mais agora. Surgem outras tecnologias, novas mídias. A sociedade se movimenta continuamente, gerando uma nova cultura, novos comportamentos.

 

É nessa ecologia volátil, instável, que todos os dias eu preciso renovar meu prazo de validade, isso já por mais de 37 anos. Se não fosse dessa maneira, não só já não teria nenhum dos meus clientes, muitos com mais de 20 anos de relacionamento, como não teria conquistado nenhum dos muitos novos no último ano. Eu e minha agência somos startup cotidiana.

 

Millôr Fernandes, que viveu toda uma vida em modo startup, tem uma frase que considero genial: “O homem é um animal que adora tanto as novidades que, se o rádio fosse inventado depois da televisão, haveria uma correria a esse maravilhoso aparelho completamente sem imagem”. Millôr não se deixava levar pelas ondas.