Uma eterna dificuldade dos anunciantes e suas agências é a estruturação de estratégias de marketing e comunicação pertinentes, relevantes e duradouras para as marcas. Não é fácil encontrar e definir um bom posicionamento, capaz de diferenciar de forma positiva produtos e serviços, ser pertinente à categoria e à empresa produtora/prestadora e ser sustentável ao longo do tempo, acrescentando força à marca a cada mensagem e venda realizada.

Mesmo quando se consegue chegar a uma estratégia válida e de valor, não é garantido que as circunstâncias do mercado, da concorrência e da própria organização se mantenham sem mudanças importantes que, naturalmente, imponham correções de rota e até transformações mais drásticas.

Além disso, como comentado em colunas recentes, existe uma tendência recorrente e nefasta de se recorrer a mudanças no marketing mix das marcas e na sua linha e prática de comunicação, especialmente a publicitária. Nem sempre é o momento de mudar e nem sempre se altera de forma correta.

Desse modo, na crua realidade do dia a dia do mercado, a situação é a de que há poucas estratégias de marketing e comunicação efetivamente bem estruturadas e eficazes e, das que são colocadas em pé, parte significativa não resiste ao correr dos tempos.

Essa é a razão pela qual são raros os bons exemplos de estratégias duradouras adequadamente “declinadas” em táticas eficientes e contributivas para agregar valor e força ao longo de tempo.

Há uma possibilidade, porém, que às vezes ocorre por acaso. E outras, como uma alternativa possível para se construir uma estratégia de forma gradativa, “compondo” seus elementos na prática à medida que evolui a história de um produto/serviço e sua marca. Na verdade, se formos seguir rigorosamente a lógica, pode-se afirmar que as estratégias são proposições conceituais que só adquirem contornos de realidade quando se exprimem através de seus desdobramentos táticos.

Dessa forma, não há, de rigueur, nada estranho ou menor quando a história de uma marca é construída passo a passo, com a incorporação gradativa de aspectos físicos ou imagéticos que dão certo, alteração dos que não funcionam muito bem e ajustes sucessivos para otimizar o conjunto do que é e do que significam suas expressões.

Se na prática a estratégia depende, no mundo real, de como ela é exercida em suas táticas, nada há de errado se a estratégia inicialmente inexistente for sendo construída na sequência das táticas realizadas. Com isso, os responsáveis pela marca e sua publicidade podem evitar longos e desgastantes debates com seus colegas, superiores e clientes buscando convencê-los do melhor posicionamento e caminho a seguir com base apenas em análises, conjecturas e previsões. Eles podem até guardar essa espinha dorsal da estratégia para si mesmos ou em petit comitê e lutarem pela aprovação gradativa das peças do mosaico que, ao final, terá um significado superior e passará, por aplicação empírica, a ser a estratégia enfim definida e adotada para orientar o futuro da marca e de suas expressões.

Assim, os profissionais de marketing e comunicação responsáveis pelas marcas não podem creditar apenas à falta de entendimento ou de empoderamento de seus chefes e clientes a responsabilidade de não lograrem êxito na formulação de estratégias adequadas. Aos bons profissionais sempre há a possibilidade de transformarem táticas em estratégias, pois isso depende mais deles mesmos do que dos outros. Parafraseando Sartre, se o inferno são os outros, o paraíso pode estar ao nosso alcance e sob nosso controle.

Rafael Sampaio é consultor em propaganda (rafael.sampaio@uol.com.br