Marcas que não enxergam os diversos vieses de um assunto colocam a sua reputação em risco

O controle da informação acabou. Antes restrito aos veículos de mídia, o buchicho em torno de assuntos que cercam uma empresa ganha dimensões inimagináveis nas redes sociais. Entrou a era da transparência. E a marca que não sabe respeitar os vieses de um determinado tema acaba sofrendo. O debate sobre mecanização de linhas produtivas é um exemplo.

A mudança beneficia investidores, mas certamente empregos serão ceifados, e queixas virão. “O que é bom para um grupo de stakeholders não é aceito por outro. São múltiplos pontos de vista, que precisam ser respeitados”, alerta Marcos Bedendo, professor de branding da ESPM.

Tentar fugir de crises também é inócuo. Os esforços devem estar centrados em uma gestão eficiente. “Empresas que passaram pela Covid-19 sentiram na pele que não há como evitar crises. O melhor a fazer é gerenciá-la de forma eficaz. O risco deixa um custo alto”, adverte Ana Almeida, professora da Fundação Dom Cabral (FDC).

Ana Almeida, da FDC: empresas estão mal preparadas (Divulgação)

Gargalo
Não se faz gestão de crise de forma amadora. As empresas precisam estar preparadas para equilibrar comunicação, operação e questões que necessitam de embasamento jurídico. Mas essa capacidade de gerenciamento ainda é um gargalo do mercado. “Organizações estão muito mal preparadas para fazer gestão de crise”, reclama Ana Almeida. Investimentos precisam ser revistos. Enfrentar uma situação adversa é cada vez mais inevitável. É só uma questão de quando acontecerá.

Transparência, mensagens claras e de entendimento dos públicos envolvidos se transformaram nas regras do manual moderno de reputação das marcas. Se essa postura está arraigada na essência, muitas vezes, nem é necessário criar comitês. Naturalmente, o problema vai se dissipando. “Escutas e respostas guiam decisões quase que por instinto”, observa Bedendo.

Mas não é fácil atingir esse nível. Comitês de crise ajudam, especialmente corporações de grande porte, a centralizar diretrizes para que respostas coerentes possam ser formuladas por lideranças e profissionais que lidam com o ambiente externo e interno. O correto dimensionamento da cadeia passa por combinar a sensibilidade de gestores do negócio com informações de quem está na ponta do processo. “Colaboradores também serão pressionados a falar e, nessa época de propósito, eles querem participar, pois se sentem pessoalmente impactados pelas notícias”, sustenta Bedendo.

Marcos Bedendo, da ESPM: impactos monitorados (Divulgação)

Natureza do problema
Há exceções. A queda de um avião, por exemplo, carrega um conjunto complexo de diretrizes e procedimentos, que envolvem perícia, questões jurídicas e o momento certo de fazer comunicados em respeito às famílias envolvidas. No mais, reina a exigência por respostas e abordagens conforme o grupo em questão e a dinâmica do problema. “Manuais são descartados na primeira vírgula que der errado, não é mais possível fazer previsões em um mundo caótico, de informações desencontradas”, reforça Bedendo.

O cenário atual desafia as marcas. A percepção é de que sempre haverá alguém reclamando. “Reputação é comportamento observado, por pessoas, colaboradores, acionistas, sociedade e jornalistas. A empresa tem de fazer o que fala”, defende Bedendo. A maneira como as diversas interfaces são conduzidas e o entendimento de sua influência na sociedade ajudam a neutralizar questionamentos, antes que eles tomem proporções incontroláveis.

“A empresa deve fazer esse gerenciamento a cada movimento passível de gerar impacto. Quem já tem postura transparente sabe que terá de responder”, frisa Bedendo. A falta de planejamento prévio pode custar caro, pois não são todas as companhias que conseguem reagir bem no momento em que um problema explode, abrindo espaço para que o imbróglio se alastre.

Utilizar as ferramentas disponíveis para monitorar e entender o perfil de pessoas que articulam ataques também é uma forma de evitar armadilhas. A transparência serve para os dois lados. “Ao estudar o comportamento digital de pessoas que tentam criar polêmica, a marca consegue descobrir se a reclamação é legítima, responsável por uma comunidade que foi afetada, ou se é apenas desculpa para criar confusão”, pondera Bedendo.

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