Entre 146 nações analisadas, estamos atrás de vizinhos como Argentina (33º), Guiana (35º)e Peru (37º)

Melissa Vogel é uma das dez mulheres homenageadas pelo PROPMARK no Especial Lideranças Femininas, projeto elaborado por conta do Dia da Mulher, comemorado nesta quarta-feira (8). Ela é CEO da Kantar Ibope Media e atual presidente do Interactive Advertising Bureau (IAB). Tem mais de 20 anos de experiência.

Começou a carreira como estagiária em uma associação chamada Escritório do Rádio. “Entrei na Kantar Ibope Media como assistente de operações – na época, ainda era Ibope Media – e, posteriormente, tive a oportunidade de passar pelas mais diversas áreas da empresa”, conta.

Melissa afirma que assumiu o primeiro cargo de gerência aos 25 anos. Aos 32, foi convidada para a direção-geral da operação da Kantar Ibope Media no Panamá. “Esse passo foi muito desafiador e tomei a decisão de ir justamente para ter uma vivência mais ampla sobre o que é ser o principal gestor de uma empresa, e não mais apenas uma head de área”, comenta.

Quando voltou, seguiu com a carreira, que, segundo ela, pode chamar como não linear, que permitiu exercer papéis de liderança nas mais diferentes áreas e disciplinas, da operação ao marketing, passando por produto nas esferas local, regional Latam e Global. Quando o assunto é preconceito, ela afirma que sempre trata o machismo em uma esfera mais ampla. Não gosta de focar em casos explícitos de preconceito, assédio, falta de respeito ou tratamento desigual.

“O contexto não é individual, é, sim, sistêmico e estrutural. Desta forma acho difícil uma mulher que não tenha passado por situações decorrentes deste machismo estrutural. Como a maioria das mulheres, já passei por algumas delas, que não podem ser minimizadas ou normalizadas no dia a dia.

Melissa Vogel: elas são as que melhor se adaptam aos diferentes formatos de trabalho (Alê Oliveira)

Exemplifico estas situações através do mansplaining ou bropriating, quando mulheres são interrompidas em sua fala por homens, que fazem questão de explicar de maneira didática ou repetir o que foi dito anteriormente por elas, se apropriando do conteúdo. Estes são exemplos de comportamentos estruturais que precisam ser superados se desejamos a igualdade de gênero”, argumenta.

Ela diz citar “aqui” esses exemplos, pois são situações corriqueiras, porém, o preconceito contra a mulher vai muito além, numa sociedade machista. “Acredito que a consciência e a autocrítica sobre esses e outros comportamentos tornam-se fundamentais para que, diariamente, nos lembremos que a pauta não pode sair da agenda, para assim atuarmos para influenciá-la com questionamentos, rompendo paradigmas, trazendo exemplos e temas para discussão”.

A executiva lembra que o Brasil de hoje ocupa a posição 94º no ranking de desigualdade de gênero do Fórum Econômico Mundial. “Entre 146 nações analisadas, estamos atrás de vizinhos como Argentina (33º), Guiana (35º) e Peru (37º)”. Ela comenta que dados sobre a mulher no mercado de trabalho brasileiro evidenciam a desigualdade.

“Num conceito amplo de trabalho, com diferentes formatos de contratação, remuneração, setores de atuação e jornadas, segundo dados do Target Group Index, 54% das mulheres entre 18 e 65 anos trabalham de forma remunerada. As mulheres são 53% da população brasileira, porém, nesta faixa economicamente ativa, representam 47% da força de trabalho. Em comparação com dados de 20 anos, as mulheres eram 43% do universo de trabalhadores no país. Um aumento de 4% em duas décadas”, diz.

Para ela, até seria válido comemorar o aumento do número de mulheres no mercado de trabalho, porém o equilíbrio com o universo masculino ainda é distante. “As mulheres são as que mais se adaptaram aos diferentes formatos de trabalho, sendo que 47% se definem como  autônomas. Os homens correspondem a 38%. Enquanto este modelo pode trazer independência por se adaptar à jornada das mulheres, também é fator limitante para benefícios de folha de pagamento e questões de direitos trabalhistas”, avalia.

“O surgimento de modelos híbridos de trabalho, que permitem às mulheres conciliarem múltiplas jornadas, criando possibilidades e alternativas, também é mais aceito entre mulheres 30%, em comparação com homens 22%”, acrescenta.
Segundo Melissa, todos os elementos combinados levam mulheres a terem jornadas remuneradas mais curtas que os homens. Enquanto 81% dos homens trabalham de forma remunerada mais de 30 horas por semana, apenas 66% das mulheres recebem pelo mesmo período.

“Infelizmente, ainda vivemos num sistema social no qual o valor do trabalho é primariamente medido pelo tempo na atividade. Não podemos esquecer que a jornada de trabalho das mulheres segue por infinitas horas antes de sair e ao chegar em casa”, lembra. Ela reflete ainda que o fator que mais distancia homens e mulheres no ambiente de trabalho é o poder de renda individual.