"Nosso projeto é ser um hub de entretenimento", diz Antonio Guerreiro, do Grupo Record
O Grupo Record está se adaptando a novas formas de consumo de conteúdo, ao mesmo tempo em que mantém a força de sua TV aberta. A visão multiplataforma que integra uma atração vista por milhões de pessoas no horário nobre da televisão, às suas execuções na internet, redes sociais e, futuramente, até em smartwatches e geladeiras, está distribuída pela empresa, e passa pelo setor liderado por Antonio Guerreiro, superintendente de estratégia multiplataforma da empresa. Líder do portal R7 desde seu lançamento, Guerreiro assumiu em 2013 a diretoria de novas mídias, que posteriormente evoluiu para o atual formato. Nesta entrevista ao PROPMARK, ele conta alguns planos da Record, incluindo o novo formato do e-commerce Record Shopping, e reflete sobre o futuro do consumo do conteúdo do grupo.
Antonio Guerreiro: “Teremos conteúdos on demand, mas a ideia é ampliar, possibilitar downloads e abrir outras áreas de atuação”
Para entender melhor a estratégia multiplataforma do grupo, como está estruturada essa área sob sua liderança e quais as características?
O Grupo Record começou com o R7 há nove anos, que foi se juntando a grandes parceiros líderes em informação em seus segmentos. Criamos uma rede hoje acessada por 70 milhões de pessoas, um público jovem, já que somos líderes no segmento de até 24 anos. Também temos nossa rede de conteúdo, a ACLR (Acelera), que comercializa canais no YouTube, seja do nosso casting, seja de terceiros. A capacidade de trabalhar com parceiros, aliás, é o grande DNA de nossa estratégia, seja com plataforma ou conteúdo. A Acelera tem mais de 100 canais, de todos os tipos de propriedade. Um terceiro braço é o Shorty, em que a Record TV já foi laureada com social mídia e interatividade, e já foi premiada com ações para divulgar Breaking Bad, Programa do Porchat e Programa da Xuxa. A quarta área é a Record Hub, focada em licenciamento de conteúdos físicos e audiovisuais, seja em propriedades negociadas com players parceiros, até produtos físicos como o esmalte do Hoje em Dia e a bota de A Fazenda. Agora, a novidade é o PlayPlus, uma plataforma que nasceu como marketplace, incluindo conteúdo nosso e de terceiros.
Quais são os objetivos com o PlayPlus, serviço de streaming de vídeo recém-lançado com conteúdo da Record, mas também ESPN, SuperToons, PlayKids e FishTV?
Temos um desejo claro de ser um hub de entetenimento. Teremos conteúdos on demand, mas a ideia é ampliar, possibilitar downloads e abrir outras áreas de atuação. Mas o importante é que, mais que um serviço de streaming, somos um hub de entretenimento. Quando pedimos à PwC para estudar o mercado, identificamos que, no Brasil, há grandes players internacionais como Netflix, bem consolidada, e AmazonPrime, que está aqui e planeja mais investimentos em conteúdo. E um player nacional concorrente com cinco anos de operação, a Globo, e os chamados stand alones (canais com aplicativos que permitem às pessoas acesso direto a seu conteúdo). A nossa oportunidade de negócios é ser uma porta de entrada única, com preços acessíveis e conteúdo plural, sem matar os stand alones de outros grupos de comunicação. Na prática, é como se fôssemos um shopping center com muitas redes, que também mantém suas lojas nas ruas. A ESPN, por exemplo, não deixou de ter seu aplicativo, e essa lógica vale para qualquer parceiro. Esse modelo do PlayPlus foi desenvolvido durante quase dois anos e reforça a ideia do Grupo Record de sempre trabalhar com parcerias e marketplace.
Recentemente, a Turner decidiu encerrar os canais Esporte Interativo na TV e espalhar a programação no Space e TNT. O que acha desse tipo de estratégia?
No streaming, o conteúdo sempre será de nicho. O consumo de internet é muito ligado à calda longa, sem grade definida e possibilidades infinitas. A ideia é que você tenha acesso a conteúdos como música clássica com arranjo de heavy metal na Noruega, por exemplo. Para o broadcast, o modelo tem de ser outro, mais abrangente. Mas a questão é que um não anula o outro, e sim se complementam. No fundo, temos de assegurar que a experiência das pessoas seja a melhor possível. Nosso trabalho é levar conteúdo onde o usuário está e ampliar a relação das pessoas com nossas marcas e nossos parceiros.
A TV aberta continuará com sua força? Como se adaptará comercialmente a um novo cenário de mercado de consumo mais digital?
A visão do Grupo Record sempre foi muito forte nesse sentido. Acreditamos no poder da TV aberta, principalmente no Brasil, onde ela consegue grande capilaridade e sempre será uma opção. Nossa geração vive um momento de transformação e, claro, a TV aberta terá de redesenhar alguns processos quando se trata no digital. O relacionamento com a praça no broadcast já está bem claro, mas como funcionará no over the top (OTT)? Será que os breaks comerciais de 30 segundos na TV devem ocorrer no OTT também, ou haverá espaço para formatos de seis segundos, ou branded content? Todos estão testando os melhores modelos.
É difícil prever como serão os modelos de comunicação para o conteúdo, mas o que já está claro para você nesse momento?
Primeiro, já está clara e provada a importância do focar em conteúdo. Outro ponto-chave é que devemos respeitar a especifidade de cada meio. Durante um período, tentou-se colocar um modelo tradicional de consumo de conteúdo em outras mídias. Mas se pensarmos em todas as possibilidades que temos hoje, o conteúdo em smartwatches, por exemplo, deve ser incrível e direcionado a essa plataforma. Uma preocupação do Grupo Record, hoje, é que desde a pré-produção de uma atração, e de sua ideia original, devemos pensar o consumo do conteúdo para cada plataforma, ferramenta ou device, sob um tripé de conteúdo, experiência e especificidade de cada meio. Não há na grade da Record hoje qualquer produto que não tenha uma expansão multiplataforma, pensados para Facebook, YouTube, teatro, como o musical de Dez Mandamentos.
Como estão as conversas com anunciantes? Eles demandam muito os projetos multiplataformas?
A TV aberta continua fortíssima, com grandes índices de alcance e audiência. Com o digital, acrescentou-se novas formas de consumir o conteúdo dentro desse eletrodoméstico chamado televisão. Com a TV conectada e as possibilidades de interação, temos uma estratégia transmídia e um índice interno que se soma à audiência e nos dá uma qualidade de dados incrível. Hoje, posso dizer ao anunciante não apenas que dou X pontos de audiência, mas o que está dentro desses pontos. Somos muito provocados nesse sentido pelo mercado de publicidade brasileiro, que é pujante e rico, motivo de orgulho. Nesse sentido, aprendemos muito com o Walter Zagari (vice-presidente comercial da Record), que está muito atuante com a área de multiplataformas. Ele está sempre à frente, e eu o chamo de mestre, sem hipocrisia.
Como você enxerga o consumo de conteúdo da Record daqui a alguns anos?
Vejo três áreas que, inclusive, já estamos desenvolvendo dentro do grupo. Uma delas é wereables, que reduz muito os passos que separam as pessoas do consumo de conteúdo. Também estamos olhando para gamificação e IOT (internet das coisas). Nesse último caso, passamos por coisas como realidade virtual e experiências de consumo de entretenimento. Tudo que produzimos, seja informação ou diversão, especialmente para essa nova geração, deve ter foco em entretenimento de consumo de vídeo. A audiência no sentido clássico, passivo, não combina mais com essa geração. Dessas três áreas, vejo IOT como a grande possibilidade de explosão na distribuição, com conteúdo da Record indo para geladeiras, despertadores, campainhas etc.
Pensando na casa do futuro, hiperconectada, qual será o papel de um player como o Grupo Record?
Não só conseguimos pensar, como já estamos desenvolvendo em laboratórios na Record. Pensando em entregar conteúdo em assistentes virtuais como Alexa, só em áudio, ou na Amazon Echo, que tem vídeo em monitor, ou mesmo no Google Home.
O e-commerce pode se tornar uma frente mais relevante de negócios?
Vamos lançar na mesma data da nova edição de A Fazenda (em 18 de setembro) o Shopping Record, que vai vender toda a linha de produtos próprios e licenciados. Mas que funcionará também como marketplace e oferecer produtos de parceiros. Já tivemos essa plataforma no passado, mas, desta vez, é um modelo muito mais robusto. Até livraria teremos, bem como produtos de todas as atrações. A coincidência de lançar junto com A Fazenda é para aproveitar a data e grande parte dos produtos do cenário estará à venda. Mas o e-commerce terá produtos e outras coisas sem qualquer relação com eles.
Como funciona a área que cuida do engajamento da Record com as redes sociais?
O grupo tem uma unidade de negócios especializada nisso. O R7 é líder no Facebook e a Record tem 80 horas semanais de programação com interatividade na tela. O social listening é constante e temos uma linha bem-humorada para falar com as redes sociais. A gestão artística do Marcelo Silva (vice-presidente artístico e de programação) é estusiasta das redes sociais e a Record sempre teve essa característica. No comercial, também há essa percepção, com produtos que já nascem integrados. Quando Douglas Tavolaro (vice-presidente de jornalismo) cria algo, já tem a cabeça multiplataforma. Temos ainda uma área de data science com auxílio da IBM e 43 pontos de entrada de dados, seja do Kantar ao Google Analytics, que criam uma base de dados que nos permite uma comunicação mais assertiva para os parceiros da publicidade. Sabemos que o programa entrega tantos pontos de audiência, mas também enxergamos quem são essas pessoas.
Como analisa o momento da TV paga?
É um momento de transformação da indústria, que tem um desafio de modelo de negócios, chacoalhado pela Netflix. Mas acredito na força desse setor e em sua vocação de ser um marketplace. Vejo claras condições de o setor seguir com força, com uma visão de entregar conteúdo de diversas marcas com capacidade multitela.
O R7, em grande parte, é composto por texto, e essa parte da indústria enfrenta situações como as da Editora Abril, que encerrou diversas publicações. Enxerga um modelo viável para essas empresas?
A curadoria e o cuidado jornalístico, e temos grande preocupação nisso com o Douglas Tavolaro, terá sempre espaço. Há uma transformação do setor, acostumado a vendas em bancas ou assinaturas, mas é preciso fazer essa transição. Mesmo os portais aqui sempre foram pensados com a usabilidade do impresso, com os menus no lado esquerdo. Isso tem de ser reinventado. O R7 nasceu em 2009 e já pegou muito dos erros e acertos, evoluindo para ser um portal agregador de conteúdo social. A proposta é levar conteúdo de qualidade às pessoas, inclusive eleitores, e interferir positivamente no rumo do país. Tem de representar um termômetro do que está sendo realizado nesse momento no mundo, seja o que está bombando no Twitter, na busca do Google ou no Facebook. E isso feito por profissionais com histórico no jornalismo, e redação que investe em conteúdo e repertório.
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