De todos os meios de comunicação que atravessam profundas transformações na chamada era digital, o meio revista talvez seja o que mais sofre perdas mundialmente, sempre aparecendo em queda nas estatísticas de investimento publicitário. No Brasil não é muito diferente, mas muitos equívocos e informações desencontradas muitas vezes traçam um cenário inconsistente. Por isso a Aner (Associação Nacional dos Editores de Revistas) distribuiu um factbook atualizado e compilado pelos institutos Ipsos e Ibope, com dados que mostram, por exemplo, que hoje há 4 mil títulos no país e 67 milhões de pessoas que leem revistas – sendo que 39,5 milhões são mulheres.
A principal vantagem do meio, segundo o factbook, é que seus leitores têm renda média 45% acima da população. Outro fato apresentado no estudo: a maioria dos leitores de revistas são os que decidem as compras e tendem a consumir acima da média da população em vários segmentos, como moda, beleza, automóveis, decoração, tecnologia.
Segundo o estudo, hoje a penetração do meio revista no Brasil é da ordem de 39% e maior nas classes A e B que os demais meios pagos. O estudo afirma que, na classe C, o meio revista supera a TV paga e tem a mesma penetração do meio jornal.
Segundo o levantamento, a leitura entre os jovens segue relevante. Revistas como Superinteressante, por exemplo, contabilizam mais de 600 mil leitores.
O factbook apontou que 82% dos leitores de revistas ainda as consomem em papel, 11% consomem offline e online e 7% leem revistas somente na plataforma digital. O Target Group Index apontou que 60% do consumo digital de revistas se dá via notebook/laptops e 20% via smartphones. Apenas 8% dos leitores usam tablets. O volume atual de assinaturas de revistas online é de 49%.
Um dos argumentos favoráveis ao meio sobre o perfil do leitor de revistas é, por exemplo, de que ele se programa para ler as publicações. Os leitores de revista pausam o que fazem e dão atenção exclusiva a esse momento. Revistas são encontros, não esbarrões. Hoje os setores com maior participação de investimento no meio revista são vestuário e têxtil (49,27%), produtos de uso pessoal (45,09%) e casa e decoração (22,80%). O Boticário, JBS, Natura e Mitsubishi são algumas das marcas que mais investiram no meio no ano passado e destinam bons nacos de sua verba para a mídia.
Opinião do mercado
Mundialmente, o meio impresso sofre com a perda de relevância, sobretudo os títulos semanais, que competem com o imediatismo das notícias na plataforma digital. Mas Paulo Sant’Anna, diretor-geral de mídia da DPZ&T, acredita que valorizar o conteúdo é o único caminho dos veículos impressos nesse momento, independente da plataforma. Ele faz coro com outros profissionais de mídia que diariamente se vêem às voltas com as muitas escolhas de mídia para seus clientes. Para os publicitários, o principal desafio do meio revista é levar para o digital a credibilidade e a relevância que construiu no papel.
“O meio revista é extremamente importante, possui credibilidade (excelência de jornalismo), atinge formadores de opinião, é um bastião da liberdade de imprensa trazendo à luz fatos e notícias de extrema importância para a sociedade, possibilita segmentação por temas, tem qualidade editorial e uma série de outras virtudes. O grande desafio é reverter a perda de consideração do meio impresso e transferir esse ativo para a plataforma digital, espelho dos mesmos títulos impressos, mantendo a relevância do passado recente, tanto para os leitores quanto para o mercado anunciante. Não é uma equação fácil, porque altera, além de tudo, a maneira tradicional de receita das editoras. É uma reengenharia profunda”, diz.
Miriam Shirley, vice-presidente de mídia da Publicis, diz que um dos maiores desafios do meio revista para garantir a sua viabilidade editorial, financeira e operacional é desenvolver estratégias de serviços e eventos que fortaleçam os vínculos de interatividades com seus leitores e estabeleçam com eles relações duradouras de confiabilidade, credibilidade e fidelidade. “A pertinência do meio revista vai aumentar na medida do crescimento do engajamento dos seus leitores na internet e redes sociais, que tornam o produto mais atrativo para o investimento publicitário, seja na plataforma digital e mesmo impressa, que embora esteja encolhendo, deverá seguir relevante.”
Segundo Shirley, o futuro do meio revista passa pela capacidade e habilidade de migrar para o meio digital sem perder credibilidade, pertinência e relevância dos leitores, e também pela atualização tecnológica para ofertar opções de veiculação alinhadas às atuais demandas do mercado.
Gerar conhecimento adicional ao que se encontra hoje na web é o caminho que deve ser perseguido pelo meio revista, na opinião de Flavio De Pauw, diretor de serviços a cliente da AlmapBBDO. “Vejo que os principais títulos têm força similar à de grandes marcas de consumo. Leitores assíduos se comportam como fãs e atuam como embaixadores de suas publicações preferidas, mas essa relação deve ser fortalecida constantemente, pois novas fontes de conhecimento estão surgindo todos os dias”, observa.
Camila Bertoli, diretora de mídia da J. Walter Thompson, concorda que, para o meio se manter relevante, é preciso reforçar a percepção de valor para seus leitores, uma vez que, na era digital, “conteúdo é conteúdo”, independente da plataforma. “O consumidor já não distingue mais onde deve buscar o conteúdo. Se falamos que o futuro será construído por meio de um diálogo cada vez maior com os consumidores, o meio também precisa repensar como promover essa troca e buscar maior capilaridade de pontos de contato. A adequação da linguagem e do conteúdo de acordo com a característica de consumo de cada device também será essencial”, diz a diretora.
Camila diz acreditar que o meio perdeu a relevância para o mercado anunciante porque não soube reagir na velocidade necessária. “Tecnologia muda processos. E muda, portanto, consumo de mídia também. As editoras devem focar naquilo que elas sabem produzir melhor, que é conteúdo de qualidade. E se elas sabem produzir conteúdo que interesse ao seu público leitor, também precisam buscar novos modelos de comercialização desse conteúdo junto ao mercado. Um bom exemplo disso é a prática recente da editora Globo na comercialização de projetos multiplataformas. Hoje você pode produzir um conteúdo com eles customizado para o seu cliente e amplificá-lo por meio do ambiente digital e também no cabo junto com os canais da Globosat, aumentando significativamente o potencial de cobertura e o engajamento com os consumidores”, destaca a diretora, que reconhece que, apesar das quedas significativas de investimento, o meio ainda tem números expressivos de leitores.
“A queda em circulação não se equipara à redução de investimentos. Mas é um momento de avaliação e de busca por novas fontes de negócios. É saber usar o conteúdo que eles produzem com tanta qualidade e monetizá-lo por meio de novas iniciativas. A Vogue fora do Brasil conseguiu pensar em novos modelos de consultoria e a criação da universidade Vogue – The Condé Nast College –, que fazem bastante sentido e trazem novas fontes de renda para o negócio. A Wired também seguiu esse caminho. É claro que ainda em pequena escala, mas já é um bom começo. Também acredito que teremos um grande número de publishers entregando seu conteúdo por meio de plataformas que eles não projetaram ou sequer controlam. Isso já acontece hoje e deverá ter uma escala gigantesca no futuro, falta buscar agora novos modelos de monetização do negócio.”, conclui.