Amigo meu parou num sinal vermelho e foi abordado por um mendigo de uns 14 anos, forte e saudável.

Vocês já viram isso: a gente se comove com um, dá uma graninha para o outro, e acaba ficando puto, pois a fila de pedintes parece não ter fim. Daí uma hora acaba perdendo a paciência.

– Porra – disse meu amigo elegantemente – por que não vai trabalhar?

– O que eu tô fazendo aqui é o meu trabalho, ô bundão! Foi a mimosa resposta.

E o sinal abriu.

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Uma vez, em Nova York, Antonio Fadiga e eu fomos levar a Christina Carvalho Pinto ao aeroporto. Evidentemente, a Christina só conseguiu se aprontar quase na hora do avião sair e o motorista (mineiro) teve que fazer malabarismo no trânsito para chegar ao terminal da United a tempo.

Estávamos voltando para Downtown (expressão típica de veadinho viajado, não?), quando toca o celular do Fadiga.

Era a Christina, contando que a companhia aérea se recusava a transportar seu excesso de bagagem.

Fadiga tentou ajudar Christina a inventar mil razões para convencer a moça do balcão a quebrar o galho. Tudo foi tentado: desde a condição de presidente de uma multinacional, amiga de autoridades, até doença na família.

Nada comovia a americanazinha nazistóide. A bagagem não ia embarcar. E ponto.

Fadiga e eu, impotentes, engarrafados na ponte, pouco podíamos fazer. Até que Fadiga teve uma lembrança:

– Chora Christina, chora!

Deu certo. A elegantíssima, charmosíssima, profissionalíssima Christina Carvalho Pinto abriu o berreiro no aeroporto, comoveu meia United e embarcou com a tralha toda.

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Zé Guilherme Vereza apresentou um puta de um anúncio para um cliente muito educado, muito respeitador, que resolveu usar muita diplomacia para reprová-lo.

Cheio de outrossins e ora-por-quem-sois, o cliente enfileirou razões desde filosóficas a psicológicas, sem esquecer de mencionar problemas de verossimilhanças e percepções, e destruiu o anúncio.

O Zé já tinha apresentado todos os argumentos possíveis e, a cada um, o cliente encontrava uma resposta a altura. A peça já estava morta e no rabecão, a caminho do cemitério dos anúncios.

Em desespero, o Zé resolveu partir para a ignorância.

– Se o senhor não aprovar este anúncio eu vou ficar muito triste…

Para isso o cliente não tinha resposta. O anúncio foi publicado e, até hoje, está no portfólio do Zé.

Um puta de um anúncio.

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Tem uns leitores que acham que eu forço a barra um pouco na – digamos – livre linguagem.

Sabe como é, né?, reclamam de uns porras e de umas merdas espalhadas gratuitamente ao longo das histórias.

É claro que essa gratuidade é apenas no entender deles, já que muita gente acha que certas palavras são mimosas lantejoulas que, salpicadas com talento, dão luminosidade ao texto.

Minha avó, santa criatura, sempre achou que palavras fesceninas são o tempero do linguajar rico.

*lulavieira@grupomesa.com.br