Com a maior parte das grandes agências, produtoras e anunciantes sediada em São Paulo, não era de se estranhar que a cidade fosse um polo de produção criativa – de publicidade e entretenimento. Ainda há um longo caminho a ser feito para alcançar outros grandes centros, como Estados Unidos e Europa, mas a cena paulistana vem sendo responsável por conteúdos que apontam para um diálogo mais próximo com o consumidor. “O foco e grande desafio hoje é como capturar a atenção e o tempo da audiência. A audiência consome um conteúdo porque lhe interessou. Não porque pertence a uma marca”, destaca Patrícia Weiss, Chairman e fundadora do Branded Content Marketing Association (BCMA) South America.

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Apesar dos desafios, a cidade tem na pluralidade um terreno fértil para produzir conteúdo. “Encontramos (em São Paulo) um ambiente muito favorável com as agências, as produtoras de vídeo, de áudio e todo mundo pensando criativamente em conteúdo. Acredito que São Paulo acaba tendo uma certa vantagem frente a outros centros do país por conta do seu dinamismo e da sua criatividade, obviamente. Além disso, acaba reunindo pessoas de diferentes lugares do Brasil e do mundo, se assemelhando a outros grandes centros cosmopolitas como Nova York, Tóquio e Londres. São Paulo reúne cinco continentes em uma mesma calçada”, reforça Jair Oliveira, sócio da S de Samba.

Para Patrícia, a cidade de fato já percorre um caminho evolutivo, mas é necessária atenção especial para o branded content e para a intersecção entre entretenimento e marketing. “A maior parte do conteúdo produzido pelas marcas aqui, com destaque para São Paulo, onde está a maior concentração de clientes e volume de investimento, ainda é um long form video ad (propaganda de longa duração distribuída na internet), ou um conteúdo criado com o mindset tradicional de propaganda, onde a marca fala dela mesma e se vende como marca ou produto. Conteúdo e entretenimento não são formas de venda e persuasão, mas estão sendo vistos desta maneira, como uma oportunidade. São territórios não comerciais onde a audiência se encontra desarmada. Por isso, é crucial que as marcas atuem com o máximo de respeito, ética e consciência quando a intersecção do marketing com o entretenimento acontece”.

Como exemplo, a especialista destaca algumas narrativas de marcas que foram produzidas a partir de São Paulo e ganharam não apenas outras cidades do país, mas também do mundo, entre elas o case Speaking Exchange, da FCB Brasil e Hungry Man para o CNA; o curta-metragem Pai, criado e produzido pelo coletivo ASAS.br.com para o Itaú; Contos da Rua, da Leo Burnett Taylor Made para a Fiat; Despedida da Kombi, da Almap/BBDO e Inkuba para a Volkswagen; e a série de curtas Marias – Elas Não Vão Com as Outras”, criados pela Ogilvy, VML e Edelman, com produção da Paranoid, para a marca de absorventes Intimus, com exibição nos canais da rede Telecine. “Iniciativas originais, autênticas e relevantes, que criaram valor materializando o encontro do propósito da marca com o insight humano”, ressalta Patrícia.

Na opinião de Nelson Enohata, diretor de criação e arte e atendimento estratégico da produtora Oficina TV, o cenário da comunicação como um todo teve avanço nos últimos anos em São Paulo, mas anunciantes ainda precisam se adaptar ao novo cenário. “Vejo que ainda há muito o que avançar, principalmente do lado das marcas. Entendo que elas tenham um conjunto de polices e guides a serem seguidos, mas, na cadeia do audiovisual, identifico que as produtoras, com seus autores, roteiristas, criativos e diretores, querem sempre ousar. E as marcas ainda seguram isso”, explica.

Enohata também ressalta o valor estratégico do branded conent e aponta a disciplina como tendência a ser explorada na cidade. “Ainda acho que falta acertarmos na equação ‘qualidade x audiência’, o que os argentinos fazem com mais domínio, o branded content bem feito – aquele em que a marca está elegantemente inserida no contexto. Essa é uma discussão que envolve o marketing da empresa, a agência, a produtora, o veículo e tem ganhado força nos últimos meses – até o Senac São Paulo abriu um curso de pós com esse tema”, relembra. “Para mim, o próximo passo é o branded explorar a ficção pelo drama”, aposta.

Multicultural

Na visão de Pedro Bueno, produtor-executivo da Shinjitsu Filmes, uma das características de São Paulo que torna a cidade referência em produção de conteúdo, em diferentes formatos, é “a capacidade de absorção de profissionais de outras localidades, tanto do Brasil como de fora do país”, o que incrementa aspectos culturais e regionais. “Esse potencial receptivo é uma característica inerente às grandes metrópoles, acredito que parte de São Paulo ser o que é seja fruto dessa multiplicidade cultural, o que traduz e influencia diretamente no jeito das nossas produções, consequentemente nos nossos filmes”, diz.

“Esse cenário acaba sendo propício para o surgimento de tendências e novidades, e o resultado é uma produção de conteúdo mais ousado e fora dos padrões da publicidade”, concorda Felipe Vassão, maestro e sócio da Loud.

No campo das produções culturais, a Academia de Filmes é autora do projeto transmídia #INQUIETAÇÕES_SP, que, por meio de concurso na internet, selecionou e reuniu histórias sobre a cidade, que serão transformadas em curtas e, quando unidas, resultarão em um longa. “No concurso, pedimos uma ideia e não um argumento. E muito menos um roteiro. É uma sinopse de um conto. Agora vamos contratar profissionais para que a gente possa seguir com o projeto”, explica Paulo Roberto Schmidt, fundador da Academia de Filmes.

Como desdobramento do #INQUIETAÇÕES_SP, para celebrar os 462 anos de São Paulo foram produzidos dois curtas documentais com depoimentos de pessoas vivendo na cidade. Os personagens do projeto foram abordados no fim do ano passado, aleatoriamente, na Avenida Paulista e no Centro, para responder à pergunta “Quem é você por São Paulo?”. A coleta de depoimentos resultou em dois curtas documentais para serem exibidos em espaço paulistanos durante as comemorações pelo aniversário.