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“Sim, é possível”. O slogan da campanha vitoriosa de Mauricio Macri, eleito presidente da Argentina em novembro, de certa forma, representa o pensamento do mercado publicitário em relação aos próximos anos. Reconhecida mundialmente como uma das mais criativas do mundo, a publicidade do país tem enfrentado dificuldades há mais de uma década por consequência da própria crise econômica que afeta a sociedade argentina desde o fim da década de 1990, quando a moeda local se desvalorizou abruptamente e gerou o cenário para a implementação do chamado corralito, plano econômico que iniciou um período de limitações financeiras principalmente em relação à compra de moedas estrangeiras.

Macri assumirá o comando do país no dia 10 de dezembro. No entanto, o seu mandato já gera expectativas por uma série de fatores. Empresário, ele vem do partido “Propuesta Republicana”, também conhecido pela sigla PRO, fundado em 2005, que se encaixa em uma ideologia de centro-direita que foge do peronismo e do radicalismo típico da maioria das agremiações políticas do país, mas que, ao mesmo tempo, busca um diálogo com ambas as correntes adversárias. Além disso, agrada ao mercado o fato de o novo presidente ter anunciado uma equipe de ministros técnicos e com poucos políticos.

Anos difíceis

De acordo com o presidente da Asociación Argentina de Publicidad (AAP), Ricardo Rutenberg, as políticas econômicas adotadas pelos últimos presidentes, principalmente Néstor e Cristina Kirchner, que governaram o país nos últimos 12 anos, impactaram negativamente no mercado publicitário. “Estes anos têm sido difíceis para a indústria publicitária argentina. Os controles de preços e a inflação prejudicaram a competitividade. Neste sentido, houve uma mudança de paradigma em que os meios de comunicação exercem uma pressão nas agências para que se reinventem”, diz.

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Para o presidente-emérito da Alap (Associação Latino-Americana de Publicidade) na Argentina, Pablo Braña, que também é dono da agência Publimen, a queda do orçamento dos clientes chegou até mesmo a afetar a qualidade da propaganda no país. “Quando as vendas e a rentabilidade diminuem ou desaparecem, uma das primeiras verbas a sofrer corte acaba sendo a da comunicação. Companhias que importam produtos, por exemplo, nos últimos quatro anos não puderam nem importar a quantidade suficiente para cobrir a demanda básica”, comenta. “Sem dúvida alguma, a qualidade da publicidade sofreu com a redução dos investimentos, mas acreditamos que isso mudará a partir da estratégia do novo governo”, acrescenta.

De acordo com Braña, Macri representa a esperança de que o país seja mais estável. “A grande expectativa é voltar a ser um país normal em que as empresas nacionais e multinacionais sejam rentáveis, os investimentos em comunicação estejam de acordo com as vendas e possamos elevar a qualidade de tudo o que criamos e produzimos. O espírito de mudança está bem alto no mercado publicitário e sabemos que a motivação é uma das chaves para a criatividade”, completa.

Desafio é recuperar qualidade da produção

É consenso entre os publicitários que conhecem o mercado argentino de que os anos de crise impactaram diretamente na qualidade de execução das campanhas. “A criatividade não depende do dinheiro, pelo contrário. Mas a qualidade da execução, a produção dessa criatividade, realmente foi afetada pela redução dos investimentos”, afirma Aníbal Perez Zarlenga, CEO da McCann Buenos Aires. “Nesta indústria, a ideia é o rei, porém a produção é a rainha. E este jogo é como o xadrez. Não se pode jogar sem o rei, mas sem a rainha é difícil ganhar”.

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O ponto de vista é compartilhado por Sebastian Hall, produtor-executivo da produtora Landia. “Quando se liga a TV na Argentina, nota-se uma queda na qualidade dos anúncios em geral. É consequência da situação econômica”, diz o profissional, que atualmente está trabalhando na operação brasileira da Landia. Segundo o argentino, a Landia conseguiu sobreviver com relativa tranquilidade durante todo este período porque tem o privilégio de ser uma das maiores produtoras do país, mas outras empresas do ramo não tiveram a mesma sorte. “Muitas produtoras desapareceram ou tiveram de começaram a fazer outros tipos de trabalho. Muitos diretores também saíram do país em busca de oportunidades melhores”, revela.

Tanto Zarlenga, da McCann, quanto Hall, da Landia, acreditam que o cenário deve mudar com Macri na Presidência. “O novo governo chega com um ar de mudança que vemos com bons olhos e otimismo porque nos permitirá reconectar com o mundo, algo que é fundamental para os argentinos. Se por um lado temos grande orgulho nacional, por outro não queremos nos fechar entre quatro paredes”, diz Zarlenga.

O ponto de vista é reforçado por Hall. “A expectativa de uma saída da crise vai ser bom para revitalizar o mercado”, opina.

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Para Jorge Carbonell, presidente do Grupo SC, dono da central de meio SCA Medios e da usina criativa E4, que virou empreendedor da comunicação justamente após ser afetado diretamente pela crise quando fazia carreira em grandes agências como a Ogilvy e a Grey Argentina, apesar de a publicidade argentina ainda figurar no ranking das cinco mais premiadas do mundo, é preciso promover uma retomada antes que perca a posição. “A indústria publicitária acusa um golpe tremendo com queda nos salários, empresas com baixa rentabilidade e a falta de uma regulamentação da atividade, como acontece no Brasil”.

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Segundo Carbonell, durante os governos Kirchner, ele foi um dos poucos que, como diretor da Asociación Argentina de Publicidad, criticou a atuação de representantes do setor. “Convivemos com sindicatos agrupados entre os que privilegiam a si mesmos em vez de defender os trabalhadores que deveriam proteger. Não se importam em prejudicar agências com medidas como interromper a circulação de jornais por conflitos, o que fazia as agências perderem seus anúncios”, comenta. “Mas, em conclusão, apesar do golpe sofrido, é hora de superar e renovar as esperanças para desenvolver todo o potencial que temos”.