Egisto Betti: qualidade técnica também é ruimO conteúdo das campanhas políticas nestas eleições – para presidente, governadores, senadores e deputados – está sendo apontado como o principal motivo para o desinteresse e evasão do público do horário eleitoral gratuito na mídia. Os ataques pessoais entre os principais postulantes à Presidência da República e o vazio nos discursos dos candidatos em geral jogam para baixo o nível dos debates eleitorais – sem falar na presença de candidatos caricatos como o palhaço Tiririca (que, aliás, lidera as intenções de voto em São Paulo para o cargo de deputado federal).

“A qualidade das campanhas é muito parecida com a dos últimos 20 anos, quando surgiu o termo pejorativo de marqueteiro. É um padrão que vem se repetindo eleição após eleição, com muito desgaste. O resultado é uma campanha quase sempre muito abaixo do que a TV e o rádio poderiam mostrar. Nós estamos já com quase um mês de horário político e quando as pesquisas perguntam se o eleitor já viu algum programa, metade diz que ainda não viu. Uma campanha publicitária normal atinge a audiência em três dias. Também podemos dizer que acontece o fenômeno de comunicação chamado clutter, que é um problema, porque a pessoa vê o programa, mas não retém o conteúdo. Muito provavelmente os programas eleitorais já atingiram 100% dos eleitores, mas eles não se recordam”, diz Emmanuel Publio Dias, professor e vice-presidente licenciado da ESPM, especialista em marketing político.

Para Egisto Betti, sócio e produtor executivo da Paranoid, as campanhas também são muito ruins do ponto de vista técnico. “A qualidade audiovisual é péssima. Ao mesmo tempo acho muito ruim o conteúdo. É muito raso. Acaba virando aquela baixaria de ataque e contra-ataque. As campanhas são pouco propositivas e muito mal feitas. De qualquer maneira, o que acho mais irritante é a campanha ficar mais centrada na guerra pessoal, do que nas propostas concretas”, avalia Betti.

Já para Fernando Figueiredo, CEO e sócio do Grupo Talkability, falta emoção nos debates eleitorais desta campanha. “Sou de uma família de marqueteiros políticos e vivo de perto o quão complexa é uma campanha. Um produto vivo que pode mudar a todo instante. Mas com todas as limitações impostas atualmente nas campanhas políticas, não temos mais a emoção dos debates e das campanhas na época. Às vezes, polêmicas e discussões aquecidas regadas de provas e indícios ajudam a desmascarar candidatos e trazer à tona verdades. No calor da discussão, o político revela o seu verdadeiro ‘eu’”, destaca Figueiredo.

A falta de posicionamento dos candidatos também é outro grande problema, analisa Gal Barradas, partner e coCEO da BETC São Paulo. “Um conteúdo ruim numa mídia boa é apenas um conteúdo ruim amplificado mil vezes. Existem muitos canais disponíveis para os candidatos a todos os cargos, mas o que falta é posicionamento de marca: como cada um se posiciona, que partido toma, de que maneira mostra ser fiel aos seus compromissos e, principalmente, que ações específicas promete implementar e com que resultados esperados. Sonho ver o dia em que a população passe a exigir esse tipo de manifestação na comunicação dos políticos”, ressalta Gal.

Gal Barradas: falta posicionamento de marcaNo entanto, há quem acredite que o conteúdo melhorou porque a população está mais atenta. Esse é o caso de Augusto Cruz Neto, sócio e presidente da Mood. “As campanhas estão bem menos apelativas e mais com intuito de tentar passar ideias de gestão, programas de governo e reestruturação. A população está mais atenta ao conteúdo”, enfatiza o publicitário.

Publicidade

Também é sabido que o pleito exerce forte impacto no cenário da publicidade brasileira, por roubar espaço na mídia. “A eleição impacta, sim, no cenário em que atuamos porque tem muito anunciante que simplesmente foge da mídia”, diz. “Eles fogem porque ela fica poluída com as campanhas eleitorais, com excesso de embate político sempre de péssima qualidade. A tela da televisão e o rádio ficam muito feias nesta época”, declarou Orlando Marques, presidente da Abap (Associação Brasileira de Agências de Publicidade) e presidente da Publicis Brasil, em recente reunião da entidade.

Hugo Rodrigues, COO e CCO das agências Publicis Brasil, diz que o momento é perigoso. “Não penso que sejam apenas as eleições, mas um conjunto de acontecimentos que mostram uma economia e um futuro incertos. Resultado: mercado cauteloso, números fracos e consumidor cada vez mais desconfiado. Só que, com esse quadro, o futuro incerto começa a se desenhar tenebroso. E vivemos o sentimento de espera para ver o que acontece nas eleições”, resume ele.

No entanto, o ano vem se mostrando bom para o mercado publicitário no país. “Eleição afeta a bolsa e os ânimos, mas no final do dia, as marcas precisam vender, e para o nosso mercado, ainda não podemos reclamar. Confesso que eu era o ‘pessimista’ com relação a 2014. Por conta de uma mudança artificial do nosso calendário: Copa, Eleições etc. Mas até agora, o ano vem se mostrado muito bom. Tivemos um primeiro semestre extremamente aquecido, e estamos com um segundo semestre bem promissor por conta de alguns eventos importantes, como o Salão do Automóvel e a pressão de resultado da indústria, o que movimenta o varejo”, contextualiza Figueiredo.

O ano atípico, por causa da Copa e das eleições, também mudou o cenário. “A claudicância da economia e a Copa do Mundo acabaram segurando muita coisa até julho. Mas o mercado não pode parar. Isso fez com que as empresas se soltassem um pouco neste segundo semestre, mesmo com as incertezas e com eleições importantes à vista”, complementa Gal.

Hugo Rodrigues: mercado cauteloso

“Este ano é muito atípico, porque além das eleições tivemos Copa no primeiro semestre. Tivemos um primeiro semestre muito bom, mas julho e agosto foram fracos. A partir da segunda quinzena de agosto, deu uma retomada. Hoje a gente está, talvez dentro da média ou com uma média muito parecida com o ano passado. As eleições acabam impactando por roubar um pouco o espaço de mídia”, reforça Betti.

Expectativas

As expectativas sobre o novo governo são altas. “O novo governo, independentemente de quem for, terá um enorme desafio. Vai encontrar um país ingerenciável, indústrias sucateadas e um monte de lixo de baixo do tapete. O novo governo terá que tomar atitudes duras e talvez impopulares para levar o Brasil de volta aos trilhos. Somos um navio cargueiro que demora muito para corrigir sua rota. Portanto, o próximo governo terá que tomar medidas que provavelmente sofreremos num primeiro momento e só sentiremos os resultados no próximo mandato. Por isso, o novo presidente, ao meu ver, se sacrificará para corrigir o Brasil”, diz Figueiredo.

“Espero o que todos nós esperamos há muitos anos: 1) simplificação dos tributos, 2) fazer a transição de um modelo de crescimento baseado na expansão do crédito e do consumo interno para outro calcado no investimento como redução da burocracia para abrir e fechar uma empresa ou para a importação de insumos (é tão óbvio e simples que mostra o quanto estamos atrasados)”, completa Rodrigues.

Uma reestruturação de todos os poderes é a maior expectativa de Augusto Cruz Neto. “O Brasil está obsoleto, está no limite de estourar. A burocracia é a pior possível, as leis trabalhistas, impostos, juros, enfim… Se isso não for resolvido acredito que estaremos colocando em grande risco o futuro desse país”.

Gal, por sua vez, toca na questão do empreendedorismo. “Espero um governo que respeite e incentive o empreendedorismo, que invista maciçamente na educação dos ensinos fundamental e médio, que crie programas de capacitação para a população em idade economicamente ativa e que faça investimentos no Brasil visando o longo prazo”.