Há nove décadas os brasileiros ouviram o pronunciamento do então presidente da república Epitácio Pessoa

 

No último dia 7 de setembro não foram comemorados apenas os 190 anos da Independência do Brasil. A data também marcou os 90 anos da primeira transmissão de rádio brasileira. Para celebrar o primeiro centenário da Independência, os americanos da Westinghouse Electric instalaram uma estação de 500 W e uma antena no pico do morro do Corcovado (onde atualmente é o Cristo Redentor), no Rio de Janeiro. O público ouviu o pronunciamento do então presidente da república Epitácio Pessoa e a ópera “O Guarani”, de Carlos Gomes. A transmissão também foi ouvida, por meio de aparelhos receptores, em Niterói e Petrópolis, cidades fluminenses, e em São Paulo.

Foi após a transmissão que Roquette-Pinto, considerado o pai da radiodifusão no país, soltou sua famosa frase: “Eis uma máquina importante para educar nosso povo”.  Foi ele que, em abril de 1923, fundou a primeira rádio brasileira — a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, que existe até hoje, sob o nome de Rádio MEC, vinculada ao governo brasileiro por meio do Ministério da Educação. Porém, um dos grandes marcos da história da rádio no país ocorreu quase 10 anos após sua inauguração. Foi quando, no dia 1º de março de 1932, o presidente Getúlio Vargas promulgou o Decreto Lei nº 21.111, que autorizou e regulamentou a publicidade pelo rádio.

No início, as manifestações comerciais não iam além do anúncio dos nomes dos patrocinadores, sem qualquer produção diferenciada que as destacassem do contexto do programa. O primeiro representante dos profissionais de propaganda em rádio foi Ademar Casé, que tinha seu próprio programa. Foi ele o grande incentivador dos cantores populares e dos humoristas de rádio, que trouxeram uma produção publicitária voltada especialmente para o meio. O que fez com que os anos 40 e 50 ficassem conhecidos como a “era de ouro do rádio”, tendo inclusive a cota permitida de publicidade no veículo passando de 10% da programação para 20%. E, logo depois, para 25%, índice que perdura até hoje.

Foi a partir daí que muitas marcas começaram a criar seus jingles — alguns famosos mesmo após muitas décadas de sua concepção, caso dos Cobertores Parayba, Casas Pernambucanas e Varig, dos anos 50 e 60, passando pelo Banco Nacional, nos anos 70, até chegar a spots que se não tinham trilha, também deixaram sua marca no meio, como o “Louco por Lee”, na década de 80.

Estagnação

Porém, há anos que a publicidade no rádio está estagnada. Segundo dados do Ibope Monitor, o meio concentrou no ano passado 4% do bolo publicitário brasileiro, mesmo número de 2010 — índice que representa R$ 3,6 bilhões de faturamento, valor irrisório se comparado com os R$ 46,4 bilhões que a TV aberta recebeu no mesmo período. “O engraçado é que a publicidade no rádio inspirou a da televisão. No início, os comerciais que eram feitos para a telinha tinham por trás redatores especializados em rádio”, afirma Mario D’Andrea, sócio e cco da Fischer & Friends e um dos grandes incentivadores da publicidade do rádio no Brasil. “Não podemos esquecer que o rádio foi para o nosso mercado o primeiro grande veículo nacional. Seu desenvolvimento está historicamente associado com o desenvolvimento de nossa propaganda”, completa.

Para D’Andrea. O rádio tem outro grande feito: o de também construir e preservar as características regionais brasileira. “Está diretamente ligado à nossa cultura, à nossa linguagem”, diz. “Algumas marcas, principalmente as multinacionais que aqui chegaram no século passado, foram construídas em nosso mercado por meio do rádio. Mas hoje, infelizmente, parece que existe uma preguiça em produzir trabalhos de qualidade especialmente para o meio. Porque não é fácil fazer comercial para o rádio. É uma linguagem diferente, exige técnica”, ressalta, citando um fato irônico: “Ninguém quer criar para rádio, mas vai trabalhar de carro, ouvindo rádio. É contraditório”.

Porém, o criativo não acredita que seja uma “culpa” dos publicitários. “O próprio rádio perde a chance de não divulgar mais seus cases de sucesso. O que não falta são trabalhos que alavancaram marcas e produtos, mas as pessoas não sabem. O próprio HSBC, com quem eu trabalhei durante muitos anos, ganhou destaque em praças onde não conseguia entrar graças ao meio”.

Criativo responsável pelo jingle comemorativo dos 50 anos da Abert (Associação Brasileiras de Emissoras de Rádio e Televisão), em junho passado, e que também serviu de incentivo para o meio, Sergio Valente, presidente da DM9DDB, diz que o rádio precisa entender o seu novo papel na sociedade. “Não viver do passado, mas desfrutar de um novo futuro, prestando serviço, cada vez mais, para a audiência. Houve um momento em que o rádio concentrava todos os paradigmas do entretenimento. Hoje é diferente. Mas não significa ser menor ou pior. Como eu disse, é apenas diferente”, diz.

Para Valente, a importância do rádio para a indústria da comunicação é crucial. “No princípio, havia só o rádio. Com ele a indústria da comunicação se desenvolveu e, consequentemente, o mercado publicitário. Todo mundo ouve rádio. E por meio dele você consegue envolver o consumidor com um poder que só uma verba enorme conseguiria fazer na TV, pois o rádio é pura imaginação. No rádio, você consegue construir conteúdo”.