Meu nome é Thompison. Walter Thompison. De grande agência só tenho o nome. Na verdade meu nome se escreve como se fala: Tompison. E meu Valter é com “V”. Meu pai tinha sido boy nessa tal de Thompison, uma agência grande que ficava no centro da cidade.

Eu poderia ter sido Jonatan. Ou Wallace. Fiquei Valter. Tompison. Uma homenagem.

E sou publicitário. Ou melhor, tenho um balcão de classificados numa galeria de Copacabana. E, na expansão, faço também banners. E design gráfico. E estou completando um curso de informática. Vou passar a produzir conteúdo para redes sociais.

Meus clientes são meus vizinhos: chaveiros, gasistas, fábricas de carimbos, cabeleireiros e modelos-manequins. Jovens, sedutoras, carinhosas e bonitas. Minto muito. Como elas. Não é que eu coma elas. Até como, mas não é isso que quero dizer. Minto como elas. É a nossa profissão.

Tompison, Valter. Sou eu. Publicitário.

Já me disseram que a agência em que meu pai trabalhava poderia me processar por usar o nome Thompison. Duvido. Tompison é o meu nome. Qualquer um deve poder usar o próprio nome na própria empresa. E eu me chamo Tompison.

E tenho um balcão de classificados. E produzo banners. Desenho logotipos e faço cardápios, cartões de visita, essas coisas.

Fico no fundo da galeria, depois da loja de comida árabe e o restaurante a quilo do casal de sapatões, o Big Foot’s.

Toda vez que dedetizam o restaurante as baratas deles mudam para minha sala. E as minhas baratas são ciumentas, o que causa enormes brigas.

Sou o único publicitário que tem uma rinha de briga de baratas. Como o Duda tinha de galos. Tenho um telefone. Só não tenho linha, pois cortaram por falta de pagamento.

Mas você pode ligar para o meu celular pré-pago. Ou deixar recado na manicure. Podóloga, melhor dizendo.
O nome dela é Creusa. Kátia, melhor dizendo. Eu a chamo de sweethand.

Sou assim: um publicitário. De cada cinco palavras, falo três em inglês. E entendo uma.

Outro dia me ligaram de um cliente com escritório no prédio ao lado. Era o diretor de recursos humanos (no meu tempo chefe do pessoal). Queria pôr um anúncio.

Troquei o palito que estava mascando há apenas uma semana, passei um pente no cabelo, lustrei o sapato e fui lá ver o que era. New business.

Sou assim. Um publicitário.

A recepcionista não era uma mulher. Era um outdoor. Com aplique. Uniforme azul de aeromoça. Loura. Sorriso de anjo.

Cruzou as pernas e eu fiquei fingindo que lia “O Balde Branco”, de junho de 1993. Não fiquei futucando o WhatsApp porque não tenho. Mas fingi indiferença. Na verdade, desejei que o diretor de recursos humanos demorasse uns cinco anos para me receber. Levou duas horas.

Depois, na sua sala atapetada, me deu um texto de um anúncio procurando uma recepcionista. Achei uma tremenda falta de ética. Ainda por cima pediu desconto na comissão de agência. Resolvi dar um golpe. Perderia aquele dinheiro, mas teria alguma chance com a loura.

Tirei meu cartão das mãos dele e disse que existem certos princípios dos quais eu não abdico. Não era pela comissão, mas pela traição com uma funcionária. Sou assim. Por uma mulher arrisco tudo. Ate anúncio.

Na saída falei para a deusa loura: “Baby, estão procurando outra, sabia?” Ela me disse: “Sei. Vou casar com o presidente”. Ainda bem que não tenho sócios para dar explicações.

Um romântico permanentemente na merda. Voltei para o escritório vazio. Felizmente as baratas tinham saído em busca de comida. Sentei na cadeira de plástico da Brahma do meu escritório e pensei seriamente em mudar de profissão.

Lula Vieira é sócio da Mesa Consultoria