Jo Jackson, primeira mulher a ocupar o cargo de CEO do D&AD, falou com exclusividade com o propmark
Primeira mulher a ocupar o cargo de CEO nos 61 anos de história do D&AD, Jo Jackson assumiu a organização há sete meses com o discurso de que todos na indústria criativa têm a responsabilidade de promover o progresso e as mudanças necessárias, como ter mais diversidade e inclusão no mercado. A edição de 2023 do D&AD Awards, realizada em Londres em maio, foi a primeira sob o seu comando - o Brasil conquistou 27 Pencils e ficou em sétimo lugar no ranking de países. Para além da premiação - considerada uma das mais rigorosas na publicidade -, Jo destaca que o D&AD tem uma função importantíssima de fomentar o mercado e apoiar as novas gerações. Entre as iniciativas, há o programa D&AD Shift, curso gratuito para criativos sem formação universitária, que será lançado em São Paulo também. “Se não ajudarmos os novos talentos, não haverá excelência criativa lá na frente”, diz ela.
Este foi o primeiro ano do D&AD Awards sob seu comando. Que mudanças vocês fez?
Eu assumi como CEO sete meses atrás. Nós já tínhamos um time estruturado organizando e produzindo o festival. Eu pude apoiar o evento em pequenas coisas, mas com um nível grande de importância, como, por exemplo, trazendo sustentabilidade para a produção. Essa é uma forma de o D&AD mostrar progresso para a indústria, agir e não apenas falar, como um produtor de evento responsável. Em relação ao line-up, procuramos trazer vozes novas para o palco para falar sobre representatividade na indústria e de como os novos criativos podem aprender a não estereotipar a propaganda, por exemplo. A Covid transformou todo mundo e a forma de trabalhar, os novos criativos tiveram de trabalhar de casa, todo mundo teve de se adaptar. É um criativo diferente e isso é fascinante. O approach da nova geração é totalmente diferente e gera um impacto na indústria.
Você é a primeira CEO mulher do D&AD. É uma nova era do festival? Que impacto você causou?
É meio louco pensar que eu sou a primeira CEO mulher do festival, pois o D&AD existe desde 1962. Mas olhando hoje para a nossa agenda em termos de diversidade, nós estamos muito orgulhosos como organização. Ter mais mulheres em cargos de liderança é um grande desafio para toda a indústria. Na verdade, não só mulheres, mas ter mais diversidade e inclusão em todo o board. Sabemos que isso não vai ser resolvido da noite para o dia, mas, definitivamente, assim como no meu caso e como em outros, acho que é um sinal de mudança, de progresso no mercado.
O que está por trás do tema adotado para esta edição, “Make. Change”?
Há três pontos que queremos destacar. Um é a positividade, lembrarmos de sorrir, ter momentos bons e celebrar as coisas boas, porque há muitas boas mudanças ocorrendo na indústria. O segundo é uma provocação, desafiar e cobrir as expectativas das pessoas em relação à diversidade no mercado para um grupo mais amplo. E o outro tem a ver com o progresso, questionar e desafiar as mudanças, lembrando que todos são responsáveis pela transformação de pequenas coisas como, por exemplo, pensar duas vezes antes de escolher o casting para as próximas campanhas. E, claro, queremos celebrar os prêmios, o craft e os realizadores.
Depois de três anos online, o festival voltou para o formato presencial. Quais foram as lições tiradas com a experiência?
No meu caso, eu achei muito difícil ficar isolada do meu time durante a pandemia. Eu adoro estar junto com a equipe, trocar ideias, fazer brainstorming, você cria um ambiente mais proativo. Não se tem isso via telas do Zoom. Os festivais online foram ótimos, mas você não tem a mesma energia do presencial, as pessoas se distraem. E eu acho que o networking é outra grande vantagem do presencial. Estamos pensando em ter um festival híbrido nos próximos anos, com digital pass para as pessoas ao redor do mundo poderem ter acesso ao conteúdo.
Onde você trabalhou antes de assumir como CEO do D&AD?
Recentemente, eu fui chief creative officer da Made.com (atendeu marcas como Diesel, Nike, Adidas, Burberry, Microsoft e Red Bull) e também trabalhei por um tempo no mercado hoteleiro. Hoje, tenho um pub para mulheres em Londres, o Flowerhouse. Eu abri esse pub com o objetivo de apoiar as mulheres na indústria hoteleira e ajudar a promover um equilíbrio em um mercado dominado por homens.
Qual é o DNA do festival hoje?
Desde que foi criado, o D&AD celebrou a excelência criativa e não há planos para mudar isso. Porém, com as mudanças da sociedade, esse conceito também mudou. Certamente o que era excelência criativa em propaganda em 1965 não é a mesma coisa que hoje. Pedimos aos jurados para que eles considerassem o que realmente é excelência criativa nos dias de hoje. Em uma premiação, a criatividade deve ser muito simples, o trabalho muito bonito, criativo, é isso que pesa na hora de ganhar prêmios. Mas o D&AD vai muito além da premiação. Para mim, o principal motivo de eu ter me juntado ao festival é o fato de o D&AD suportar as próximas gerações de criativos. Porque, se não ajudarmos os novos talentos, não haverá excelência criativa lá na frente. E não podemos confiar que os governos oferecem a melhor educação.
Temos, por exemplo, o programa D&AD Shift, que oferece cursos noturnos gratuitos para aspirantes a criativos que não têm diploma universitário, com o objetivo de empoderar, formar e conectá-los com o mercado para que encontrem oportunidades de trabalho. Vamos começar a trabalhar com o programa Shift em São Paulo, junto com o Clube de Criação. Devemos abrir as inscrições em breve. E realmente querermos encontrar mais parceiros para tocar junto esse programa no Brasil. São cinco meses de aulas gratuitas online e presenciais. É um projeto feito em conjunto com o Google e também com marcas parceiras. Dos alunos formados pelo Shift, a média é que 74% deles conseguiram empregos após o curso.
O D&AD bateu recorde de inscrições este ano. O que isso significa para o mercado?
Este ano tivemos o melhor número em termos de inscrições em toda a história do D&AD. Foram quase 13 mil inscrições (12.243) . Foi um número recorde não só em termos de inscrições totais, mas também em número de peças individuais inscritas, porque é claro que as agências inscrevem os mesmos trabalhos em diferentes categorias. Foi interessante notar também quais áreas cresceram e quais não. Esse é realmente um barômetro para mostrar a direção da indústria. As categorias mais populares foram Film, Branding e Craft Design.
O que você acha da criatividade brasileira?
Eu estive no Brasil faz muito tempo, no Rio de Janeiro. Acho que é uma indústria incrível e uma das maiores do mundo. Eu quero aprender mais sobre o Brasil, sinto que ainda não fizemos tudo o que podemos no país. Gostaria também de trabalhar com marcas locais. Nós somos uma organização internacional, fazemos muita coisa na Índia, África, Japão e Austrália, por exemplo.
Em sua opinião, quais são os principais desafios da indústria criativa hoje? Diversidade? Burnout? Inteligência artificial?
Eu acredito que, em relação à diversidade, há ainda muitos desafios a serem quebrados na indústria. É claro que cada mercado é diferente do outro, e cada um está em um nível diferente. Eu imagino que posso falar pela Inglaterra.
Eu acho que ainda existe um longo caminho para percorrer. Mas acredito
que as novas gerações criativas, com diferentes experiências, como os millennials, que estão ocupando cargos de liderança, pensam de uma forma mais diversa e já podemos notar mudanças. Porém, existe muito discurso e as empresas precisam agir de verdade para realmente transformar o ambiente de trabalho.