A natureza dessa crise sem precedentes coloca nossas forças e resiliências sob escrutínio. Sem dúvida, é o momento da verdade para a cultura de muitas organizações, com a virtualização forçada do trabalho e a vinculação do cotidiano dos colaboradores ao planejamento empresarial. Não considero possível qualquer conquista que não seja produto de uma cultura sólida e humana, na qual construção coletiva e lideranças empáticas são as protagonistas. Além dos rótulos, temos autonomia e influência sobre o meio em que vivemos.

Portanto, não há como dissociar cultura organizacional, diversidade e inclusão. Como as empresas podem desenvolver produtos ou serviços que atendam às necessidades e anseios dos clientes sem entender as especificidades de gêneros, idades, classes sociais, raças, etnias, deficiências ou culturas? A melhor maneira é ter essas diferenças representadas nas próprias equipes. Segundo o Guia ABA para Abordagem de um Profissional de Marketing para a Diversidade e Inclusão, a diversidade e a inclusão reforçam a necessidade de um novo posicionamento das marcas enquanto agentes comunicadores, o que vai além da busca pelo retorno financeiro e se expande para seu impacto positivo e sustentável na sociedade. O mundo está mais consciente e os consumidores muito mais exigentes, de forma que ainda temos um caminho longo a percorrer para inserir diversidade e inclusão na cultura organizacional das empresas de forma perene.

Em A Evolução Improvável, o psicólogo William von Hippel mostra como a nossa capacidade evoluiu para permitir que as pessoas começassem a confiar umas nas outras. Outro acadêmico, o historiador Yuval Harari aponta que é a crença em valores abstratos que une as pessoas em torno de objetivos. A pesquisa Cultura Organizacional no Novo Normal, realizada em 2020 pela Grant Thornton Brasil e pela Culture for Performance, revela como a pandemia inverteu a prioridade das marcas: o valor da adaptabilidade triplicou (63%) e novos aspectos como conectividade digital (29%), atitude positiva (25%), bem-estar (23%), cautela (20%), compartilhar informações (19%) e comunicação aberta (19%) passaram a ser reconhecidos.

Vale ressaltar que muitas empresas precisaram alterar protocolos de comunicação durante o isolamento social e a transformação digital também fez com que as dinâmicas de gerenciamento fossem repensadas, como foi o caso do Banco Itaú, associado ABA, que migrou mais de 50 mil colaboradores para o home office e estuda incorporar um modelo de trabalho mais flexível, com mais tecnologia. Nesse contexto, um dos desafios enfrentados pela ABA (Associação Brasileira de Anunciantes) durante a pandemia foi o de equilibrar o apoio aos negócios e à sociedade, bem como aos nossos associados e parceiros estratégicos, com a motivação de nossos funcionários que, até então, têm trabalhado remotamente. Desde o início da quarentena, a partir do propósito da entidade de mobilizar o marketing para transformar os negócios e a sociedade, estamos todos atentos às transformações que queremos provocar no mercado publicitário e no papel das marcas junto aos seus consumidores.

A cultura pode ser entendida como a personalidade de uma organização e deve refletir os valores de suas marcas. Não é algo que possa ser criado e consolidado com rapidez. Pelo contrário, leva tempo. Uma cultura é construída quando os valores de uma empresa são estabelecidos, testados e aplicados em diversas situações. Esse processo precisa ser reconhecido e adotado pelos colaboradores e, nesse cenário, a mudança de prioridades, bem como a ressignificação do contato humano, deve ser encarada como facilitadora para que as empresas passem a praticar, a testar sua cultura organizacional e, assim, fortaleçam sua reputação junto aos “novos consumidores”.

Nelcina Tropardi é presidente da ABA e vice-presidente e cofundadora da Arca+ (nelcina@arcamais.org).