Park Sung Geun, diretor do Centro de Educação Coreana em São Paulo, é o entrevistado da semana

A educação é um tema que está diretamente relacionado à Coreia do Sul. O país que foi reconstruído no pós-guerra tendo a educação como sua base é hoje um exemplo para o mundo. E essa referência tem tido papel relevante na aproximação das culturas brasileira e sul-coreana.

Quem visitou a última Feira Study in Korea no Brasil 2025 pode ver de perto o interesse dos jovens em viver a vida acadêmica no país asiático. Um movimento que abre oportunidades acadêmicas e de negócios para ambos os países, como conta o diretor do Centro de Educação Coreana, Park Sung Geun.

A Feira Study in Korea acaba de realizar mais uma edição. Qual o balanço do interesse de brasileiros em estudar na Coreia do Sul?
Como pudemos constatar na Feira Study in Korea no Brasil 2025, o interesse dos jovens brasileiros em estudar na Coreia vem crescendo de forma constante. Com a influência da K-culture, somada ao reconhecimento da qualidade do sistema educacional e dos programas de bolsas de estudo, o número de atendimentos e de participantes aumenta a cada ano. Neste ano, em São Paulo, quatro universidades coreanas participaram diretamente da feira, e mais de 900 estudantes brasileiros receberam atendimento individual durante os dois dias do evento. Esse número representa um crescimento de cerca de 30% em relação aos 700 atendimentos do ano passado, evidenciando a expansão do interesse. O perfil do estudante também mudou: se antes as perguntas eram mais gerais, hoje vemos questões específicas sobre critérios de admissão, bolsas de estudo e oportunidades de trabalho após a formatura. Isso demonstra que estudar na Coreia já é uma opção concreta para muitos jovens brasileiros.

O Centro de Educação Coreana agora está presente também na capital do Amazonas, Manaus. O que motivou essa escolha e qual o papel da região no fortalecimento das relações educacionais e culturais com a Coreia do Sul?
Já oferecemos aulas de língua coreana em São Paulo e no Rio de Janeiro há alguns anos. Mas também havia uma demanda crescente em outras regiões do Brasil. Manaus é o centro econômico da Amazônia e uma cidade multicultural, além de abrigar fábricas de empresas coreanas como Samsung e LG. Por isso, iniciar cursos de coreano em Manaus foi uma decisão para equilibrar a oferta regional e expandir o intercâmbio cultural e educacional entre Brasil e Coreia. Nosso objetivo é que os jovens da região aprendam o idioma e possam até mesmo trilhar carreiras em empresas coreanas, conectando educação e oportunidades de trabalho.

É possível dizer quantos estudantes brasileiros estão na Coreia hoje e em quais graduações?
Em 2024, havia um total de 296 estudantes brasileiros em instituições de ensino superior na Coreia. Destes, cerca de 106 estavam em cursos de língua, 83 em graduação, 57 em programas de mestrado e doutorado, e 50 em outros tipos de programas de formação. Entre os cursos de graduação, as áreas mais procuradas foram: ciências humanas e sociais (69 estudantes), engenharia (9), ciências naturais (3) e artes (2). Embora o número ainda não seja muito grande devido à distância geográfica, a presença de brasileiros na Coreia está em crescimento contínuo.

E no caminho inverso: quantos estudantes coreanos escolheram o Brasil como destino acadêmico?
O número de estudantes coreanos no Brasil é pequeno. Após a pandemia, houve uma redução significativa, e atualmente o total gira em torno de 20 estudantes, em sua maioria em programas de intercâmbio ou cursos de português. Alunos de áreas como línguas, economia e relações internacionais são a maior parte. O Centro busca apoiar o intercâmbio entre universidades dos dois países para que cada vez mais brasileiros possam estudar na Coreia e mais coreanos venham ao Brasil. Aproveito para convidar universidades brasileiras interessadas em parcerias a entrarem em contato conosco.

Park Sung Geun, diretor do Centro de Educação Coreana em São Paulo (Divulgação)

Quais os cursos mais procurados por brasileiros nas universidades coreanas?
Ainda predominam as áreas de ciências humanas e sociais. Mas observamos, tanto nas feiras quanto nas inscrições recentes, um crescimento expressivo em cursos aplicados, como engenharia, TI, administração e relações internacionais. Além disso, pela influência do K-culture, há uma procura cada vez maior por artes, design e mídia. Muitos jovens chegam motivados pelo K-pop ou pelos K-dramas e acabam escolhendo cursos que combinam conteúdo e tecnologia.

Devido a esse reconhecimento da Coreia por suas produções de entretenimento, como K-pop, K-dramas, cinema, há procura de brasileiros por cursos de comunicação, roteiro, propaganda, marketing e similares?
Sim, esse interesse vem aumentando rapidamente. O sucesso mundial do K-pop e dos K-dramas despertou o desejo de estudar comunicação, cinema, publicidade, marketing digital e produção cultural. Em uma pesquisa feita na feira deste ano, cerca de 51,8% dos estudantes disseram ter interesse em K-pop, e esse entusiasmo frequentemente se transforma em busca por cursos acadêmicos nessas áreas. Ou seja, a primeira motivação é cultural, mas se amplia para oportunidades acadêmicas.

A que fatores se deve o interesse dos jovens brasileiros pela vida acadêmica na Coreia?
O interesse dos estudantes brasileiros tem várias razões. O impacto do K-pop, dos dramas e do cinema desperta curiosidade pela língua e cultura coreanas, mas isso vai além do entretenimento: torna-se motivação real para estudar. Outro fator é a qualidade do ensino reconhecida mundialmente, principalmente em áreas ligadas a carreiras globais como TI, engenharia, administração e relações internacionais. Além disso, os programas de bolsas reduzem o peso financeiro para os alunos. Um ponto muito valorizado por quem já está na Coreia é a segurança e a infraestrutura moderna. Muitas alunas, inclusive, destacam a sensação de segurança como a maior vantagem. Assim, como já mencionei, o interesse começa pela cultura, mas se consolida pela combinação de excelência acadêmica e qualidade de vida.

Em termos de ranking global, em que posição o Brasil se encontra entre os países que mais enviam estudantes para a Coreia?
Em 2024, havia aproximadamente 208 mil estudantes estrangeiros na Coreia, dos quais 296 eram brasileiros. Isso coloca o Brasil na 36ª posição entre os países que mais enviam estudantes. Embora o número ainda seja pequeno comparado a países como China, Vietnã, Mongólia, Uzbequistão e Nepal, o Brasil é o país da América do Sul com o maior contingente de estudantes na Coreia, o que lhe dá uma importância estratégica na cooperação educacional.

Quais as principais facilidades e os principais desafios para quem vai estudar em uma cidade coreana?
As facilidades incluem a alta qualidade do ensino, a segurança, os programas de bolsas e a atratividade cultural. Os desafios são, sobretudo, a barreira do idioma e as diferenças culturais. No entanto, os brasileiros costumam se adaptar rapidamente graças à sua sociabilidade e facilidade de fazer amigos.

Do ponto de vista burocrático, quais os principais cuidados que um estudante brasileiro precisa ter ao planejar seus estudos na Coreia?
É essencial preparar os documentos com antecedência: solicitação de visto, carta de aceitação da universidade, comprovação financeira. Também recomendamos planejar aspectos como moradia, seguro de saúde e cursos preparatórios de língua coreana. Na Coreia, existe a expressão ‘ppalli-ppalli’ (rápido-rápido). Minha dica é que, pelo menos no que se refere à documentação, o estudante seja ‘ppalli-ppalli’ e se antecipe em tudo. Também recomendo que os estudantes conheçam previamente os costumes coreanos, para evitar situações constrangedoras, e se preparem para a vida prática: como aprender a usar transporte público, localizar restaurantes, identificar lugares a visitar ou evitar, além de adotar hábitos básicos de segurança. Por fim, construir uma rede de apoio local assim que chegar, seja com colegas locais, amigos brasileiros ou funcionários da universidade. Isso é fundamental para ter uma adaptação tranquila, garante mais segurança e ajuda muito nos primeiros meses.

O Centro mantém uma base de dados que ajuda a conectar as empresas sul-coreanas no Brasil a profissionais bilíngue em português e coreano. Como evoluiu essa demanda e quais setores mais procuram esse perfil?
Ainda estamos no início da coleta de informações sobre bilíngues em coreano e português, mas já percebemos claramente a demanda. As empresas coreanas instaladas no Brasil sempre destacam a necessidade de profissionais que dominem os dois idiomas. O Centro mantém uma lista de estudantes e profissionais com essa competência e a compartilha com empresas quando solicitado. Estou há apenas seis meses no Brasil, mas já fiquei impressionado pelo carinho e interesse dos jovens brasileiros pela Coreia e pela língua coreana. Isso me inspira a continuar trabalhando para criar mais oportunidades de estudo e emprego para esses jovens.

A Coreia do Sul é reconhecida como modelo mundial de investimento em educação. Como esse plano foi estruturado e de que forma continua sendo desenvolvido?
Após a Guerra da Coreia, o país estava em ruínas. Sem recursos naturais e tecnologia, a única saída foi investir em educação. A convicção de que “a educação é o futuro da nação” levou a investimentos massivos, resultando no atual status da Coreia como potência tecnológica e cultural. Um marco foi a criação, em 1972, da Lei de Repartição de Recursos Educacionais, que destinou uma porcentagem fixa da arrecadação de impostos nacionais ao financiamento da educação básica. Hoje, cerca de 20,79% dos impostos nacionais são automaticamente destinados ao ensino fundamental e médio. Embora também haja desafios, há consenso de que foi a educação que impulsionou o desenvolvimento do país. Além disso, o governo continua a criar políticas para apoiar estudantes internacionais, desde cursos de coreano até programas de integração ao mercado de trabalho.

O quanto o Brasil é estrategicamente importante para os projetos de educação da Coreia?
O Brasil é o maior país da América do Sul e tem grande influência cultural. Considerando sua população, economia e peso cultural, é inegável que o Brasil representa a América Latina em muitos aspectos. Portanto, fortalecer a cooperação educacional com o Brasil significa, simbolicamente, fortalecer também as relações com toda a América Latina. Além disso, diversas empresas coreanas já atuam em cidades brasileiras como Manaus, Campinas e Piracicaba. Brasil e Coreia têm economias complementares e grande potencial de desenvolvimento conjunto. Vejo o Brasil como um país onde é possível criar um ciclo virtuoso: estudantes aprendem coreano, fazem intercâmbio acadêmico, trabalham em empresas coreanas e alguns retornam ao Brasil para atuar em filiais coreanas, ampliando as conexões entre educação e emprego.

Qual é a perspectiva para o futuro dos intercâmbios educacionais entre Brasil e Coreia?
O fuso horário entre Seul e São Paulo é de 12 horas, simbolizando a grande distância geográfica entre os dois países. Isso sempre dificultou a intensidade do intercâmbio acadêmico e reduziu o número de estudantes em mobilidade bilateral. No entanto, o crescente interesse dos jovens brasileiros pela Coreia, aliado aos esforços das universidades coreanas em atrair estudantes brasileiros, indica que esse número aumentará no futuro. O Centro de Educação Coreana em São Paulo continuará trabalhando para aproximar ainda mais os dois países por meio da educação. Como mencionei, sentimos um enorme carinho dos brasileiros pela Coreia, e buscamos formas concretas de retribuir esse afeto. Um exemplo: durante a Feira de Estudos na Coreia 2025, discutimos com algumas universidades coreanas a criação de bolsas especiais recomendadas pelo Centro de Educação Coreana de São Paulo, justamente para reduzir as barreiras financeiras que ainda fazem alguns jovens hesitarem em estudar na Coreia. Esperamos que Brasil e Coreia se aproximem cada vez mais por meio da educação.