Maiores de 18 anos precisam votar para restaurar o senso de democracia
O caso Dobbs versus Jackson anulou o direito constitucional ao aborto nos Estados Unidos em 2022. A Jackson Women's Health Organization, clínica de aborto do Mississippi, levou Thomas E. Dobbs, oficial de saúde estadual do Departamento de Saúde do Estado do Mississippi, aos tribunais em 2018. O processo tratava da constitucionalidade de uma lei estadual que proibia o procedimento após as primeiras 15 semanas de gravidez.
A sentença proferida pelo Supremo Tribunal norte-americano neutralizou uma decisão anunciada 52 anos antes, no julgamento de Roe versus Wade que, ao contrário, permitiu que mulheres se submetessem ao procedimento sob a lei dos Estados Unidos à época. Após a vitória de Dobbs, a regulamentação do aborto ficou sob a responsabilidade dos estados. Muitos passaram a proibir ou limitar o aborto. O Texas, palco do SXSW, é um deles.
Não à toa, a controvérsia foi o centro de debate de ‘Reproductive freedom: Good for workers, good for business’, com a médica Chelsea Clinton (Clinton Foundation), Elizabeth Monteleone (Bumble Inc.), Nancy Northup (Center for Reproductive Rights), Rachel Scott (ABC News) e Jamila K. Taylor (Institute for Women’s Policy Research). O painel ocorreu na manhã do domingo (9), durante a 39ª edição do South by Southwest (SXSW), festival de inovação realizado entre os dias 7 e 15 de março, em Austin, no Texas (EUA).
“Mulheres estão viajando para outros estados para terem o seu direito ao aberto garantido. O local escolhido para viver, hoje, precisa considerar as condições de saúde oferecidas”, adverte Nancy Northup. A pena é severa. Se condenada, a mulher pode pegar de 10 a 99 anos de prisão. “Queremos direitos que nos protejam. Esse momento precisa ser entendido e a conversa, muitas vezes considerada um tabu, precisa ocorrer”, alerta.

A decisão incide em uma crise de saúde pública, que desampara mulheres e coloca também os profissionais de saúde sob escrutínio. “Cerca de 50% das grávidas enfrentam infecção generalizada. Há trabalhos investigativos de jornalistas empenhados em denunciar as consequências e perigos para a saúde”, conta Nancy. A taxa de mortalidade entre mulheres residentes em estados com restrições ao aborto é de 62%.
A morte materna escancara a gravidade da situação e tem consequências também no mundo corporativo. “Estamos conversando com lideranças de empresas para entender o cenário e orientar sobre o planejamento familiar”, diz Jamila K. Taylor. Segundo ela, as pessoas estão valorizando cada vez mais as companhias que resguardam o direito reprodutivo.
Os custos são elevados. Nos Estados Unidos, podem alcançar US$ 60 bilhões. No Texas, atinge US$ 16 bilhões. “É preciso refletir sobre o impacto na economia e na rotina de colaboradores”, frisa Rachel Scott.
Nancy deixa o exemplo de plataformas de saúde, que podem ser utilizadas por empresas para dar suporte às mulheres. “É importante saber os benefícios cobertos pelos planos corporativos. Nenhum estado com restrições ao aborto é seguro e deixar a mulher desprotegida, com esse caos na saúde, não é um bom negócio. Empresas devem dar apoio porque serão afetadas na sua força de trabalho. Algumas evitam a política, mas a reivindicação vem de suas próprias trabalhadoras”, avisa.
Atitudes são urgentes. De acordo com Elizabeth Monteleone, uma em cada cinco mulheres pretende ter filhos nos próximos anos.
Os homens também têm papel fundamental. Devem se informar mais sobre a gravidez, métodos contraceptivos, o aborto e seus riscos, e ser aliados para enfrentar desafios que se espalham por todo o mundo. “Gravidez não é uma doença, mas pode ser perigosa. Precisamos salvar a vida das mulheres que, infelizmente, ainda estão morrendo devido às restrições”, lembra Chelsea Clinton.
Nancy lembra que nos últimos 30 anos 60 países legalizaram o aborto. Apenas Estados Unidos, Polônia, Nicarágua e El Salvador retrocederam. “Maiores de 18 anos precisam votar para restaurar o senso de democracia”, convoca Elizabeth.